Em se tratando de filho, qualquer resfriado já tira os pais do prumo. Por isso é quase inevitável a identificação imediata de quem vive a experiência da paternidade com o relato íntimo do jornalista carioca Luiz Fernando Vianna em “Meu Menino Vadio – Histórias de um Garoto Autista e Seu Pai Estranho” (Intrínseca, 208 páginas, R$ 44,90), sobre ele e o filho Henrique, hoje adolescente.
Aos problemas financeiros e à falta de empatia ou de tato das pessoas encontradas pelo caminho, somaram-se a dificuldade de receber o diagnóstico (só chegou quando Henrique tinha 4 anos e dezenas de consultas médicas na bagagem), de estabelecer uma rotina possível, as esperanças quase sempre frustradas de encontrar tratamentos milagrosos e profissionais qualificados.
E no meio disso tudo, uma separação litigiosa, com a mãe levando o filho, então com 5 anos, para morar na Austrália. Reencontros anuais, dificuldades de aproximação seguidas de despedidas e novas adaptações, já seriam difíceis para qualquer criança “normal” por causa da diferença de língua e da necessidade de começar vínculos de confiança praticamente do zero. Imaginem para Henrique!
Com a chegada da adolescência e os hormônios aflorados, outra mudança significativa: Henrique passa a viver um ano no Brasil com o pai e outro ano com a mãe nos Estados Unidos, para onde ela se mudou com o marido e os filhos.
Sem dourar a pílula
O autor escreve com muita franqueza sobre as limitações do filho por causa do autismo, e dele próprio, como pai. Sua intenção, explica, é que o livro um dia ajude a filha, dez anos mais nova que Henrique, a compreender o pai e o irmão.
Quando escreve sobre ele próprio, Luiz Fernando é extremamente crítico. Sincero, diz que não teria tido filho se soubesse previamente o que teriam que enfrentar por toda a vida – mas ressalta que o ama “mais do que qualquer palavra pode traduzir”. Escreve sobre o pai alcoólatra, a dificuldade de se relacionar com outras pessoas, os pensamentos suicidas e o medo que teve de que a outra filha também fosse autista.
Mas, a despeito de tudo isso, o texto não é pesado. O autor usa de humor, ironia e delicadeza para contar situações das mais diversas vividas em família. E o relato íntimo é também informativo, trazendo um panorama geral do que se sabe sobre o autismo hoje, as lutas, os desafios e as conquistas.