A Justiça de Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, decretou o bloqueio de R$ 60 milhões e a suspensão parcial das atividades da empresa de engenharia alemã Tüv Süd, que atestou a estabilidade da barragem da mina Córrego do Feijão, da Vale, que se rompeu em janeiro deixando 240 pessoas mortas e outras 30 desaparecidas. A decisão, em caráter liminar, foi proferida na última quinta-feira (9), mas só foi divulgada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) nesta quarta-feira (15), após a juíza Perla Saliba Brito suspender o sigilo do processo.
Na liminar, a magistrada da 1ª Vara Cível, Criminal e da Infância e da Juventude de Brumadinho, determinou a suspensão das atividades da empresa referentes a análises, estudos, relatórios técnicos e "quaisquer outros serviços de natureza semelhante relacionados com segurança de estruturas de barragem".
Além disso, também foram suspensas as análises de gestão de risco geotécnico (GRG), revisão periódica de segurança de barragem (RPSB), cálculo de risco monetizado e inspeção de segurança regular (ISR). Ainda conforme o TJMG, a suspensão das atividades atinge também os trabalhos de auditoria, análise e certificação de sistemas de gestão ambiental da empresa, sob pena de multa diária em caso de descumprimento.
A juíza Perla Brito destacou em sua decisão que documentos indicam que a barragem que se rompeu teve sua estabilidade garantida em setembro de 2018 pelo engenheiro civil e geotécnico Nakoto Namba, da Tüv Süd. A declaração de condição de estabilidade assinada pelo profissional, que foi apresentada à Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), atestava que a barragem encontrava-se “em condições adequadas, tanto do ponto de vista de estabilidade física do maciço, quanto do ponto de vista do dimensionamento das estruturas hidráulicas”.
No processo, a magistrada ressaltou que a declaração vinha acompanhada de dois apêndices: um com a cópia da anotação de responsabilidade técnica (ART), referente ao laudo técnico de segurança da barragem feito em 2018 e outro com as recomendações da auditoria e o plano de ação elaborado pela Vale.
“Entretanto, muito embora a Tüv Süd tenha declarado a estabilidade das estruturas da Barragem I, os documentos acostados ao processo indicam que a situação da barragem era crítica quanto ao fator de segurança para liquefação”, disse a juíza, que acrescentou ainda que havia "indícios de que funcionários da Tüv Süd, em diversos níveis hierárquicos, cientes da criticidade do empreendimento, se articularam para encobrir a real situação da barragem que se rompeu, visando a manutenção de contratos firmados com a Vale, uma vez que, se não apresentassem a declaração de estabilidade junto ao poder público, as atividades da Mina Córrego do Feijão seriam paralisadas”.
O Hoje em Dia procurou a Tüv Süd e a Vale, porém, nenhuma das duas empresas se posicionou sobre a decisão da Justiça até o momento.
E-mails
Em sua decisão liminar, a juíza Perla Brito citou o teor de alguns e-mails que foram trocados entre funcionários da empresa alemã e funcionários da mineradora. Para ela, as provas apresentadas pela força-tarefa que investiga o rompimento eram "suficientes a demonstrar a existência de fundados indícios de responsabilidade das requeridas, pela prática de ato lesivo à administração pública consistente em dificultar a fiscalização de órgão público”.
O bloqueio visa garantir o resultado útil de eventual aplicação de multa e reparação integral do dano causado pela multinacional uma vez que, para a magistrada, a medida é necessária para não haver dissipação patrimonial da empresa e, assim, garantir a eficácia da decisão final.
Já sobre o pedido acatado de suspensão das atividades, a juíza disse ser necessária diante da gravidade dos fatos e da insegurança gerada pela manutenção de algumas atividades da empresa. "Aparentemente, as informações prestadas ao poder público acerca das condições da Barragem B1, do Córrego do Feijão, não se mostraram fidedignas, e foram realizadas sem a credibilidade e imparcialidade técnicas necessárias”.
A denúncia
Ainda conforme o TJMG, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) ajuizou a ação contra a empresa sustentando que o rompimento da estrutura em Brumadinho no dia 25 de janeiro não se deu de forma imediata e imprevisível. Segundo os promotores da força-tarefa, "a situação crítica de segurança e estabilidade da barragem era conhecida e debatida por consultores técnicos, representantes da empresa Vale e, especialmente, por representantes da empresa Tüv Süd há mais de um ano antes do rompimento".
No pedido feito à Justiça, a promotoria informou que, mesmo cientes das anomalias e do risco iminente de rompimento, os responsáveis pela estrutura preferiram manter as operações ativas, deixando de adotar as medidas de segurança necessárias para a estabilização da barragem e evitar as mortes.
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