Marcas da tortura no Hospital Militar da Força Pública

Hoje em Dia
26/11/2013 às 07:11.
Atualizado em 20/11/2021 às 14:22

Recuperar o edifício construído há 100 anos no bairro Santa Efigênia, em Belo Horizonte, para sediar o Hospital Militar da Força Pública, talvez seja mais fácil do que explicar porque o prédio, tombado pelo Patrimônio Municipal em 1994, foi fechado no mesmo ano e deixado ao abandono, deteriorando-se.

Na época do tombamento, já se sabia que o ex-prefeito Eduardo Azeredo, do PSDB, apoiado no segundo turno pelo governador Hélio Garcia e pelo PT, havia sido eleito. Não havia, portanto, motivos políticos para o governo estadual, dono do edifício, tê-lo abandonado após o tombamento promovido pela prefeitura.

Construído em estilo neoclássico, o prédio tem uma história interessante. E não apenas porque o presidente Juscelino Kubitschek, quando cirurgião da Força Pública – atual Polícia Militar – trabalhou ali.

Minas era governada por Bueno Brandão, que autorizou sua construção e inaugurou o hospital em 1914. Ele tinha pinturas de Frederico Stechel, que já pintara o Hospital Central do Exército, no Rio.

O tempo e o mau uso consumiram essas pinturas, como tudo o mais: os 60 leitos, as salas de operações, assepsia e de raio X, a farmácia, o gabinete dentário e o primeiro espaço para radioterapia criado na capital mineira. O que se vê hoje, conforme o laudo técnico elaborado pela arquiteta Priscila Mesquita Musa, datado do último dia 4, são trincas, fissuras, manchas de umidade, formação de pátina biológica em toda a parte e crescimento vegetativo na fachada.

Em agosto do ano passado, depois de o Hoje em Dia publicar foto do prédio abandonado, mostrando um arbusto que florescia na fachada do antigo Hospital Militar, a Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig) prometeu que iria salvá-lo da destruição. Mas o assunto ficou esquecido até o dia 26 de outubro deste ano, quando a edificação histórica foi ocupada por um grupo de artistas e ativistas que o rebatizaram com o nome de Espaço Comum Luiz Estrela.

Depois de tanto tempo de apatia, essa invasão de um bem público significou um ato de cidadania notável. Obrigou o governo a buscar solução para o problema. Amanhã haverá nova reunião para isso.

Ninguém mais parece desejar esquecer o lado escuro do Hospital Militar, que virou Hospital Psiquiátrico Infantil e, como revelou o HD no domingo, um local onde, no passado, o tratamento não se diferenciava, muitas vezes, de um doloroso ato de tortura de crianças indefesas. Não deixar que um passado que assombra os que dele tomam conhecimento agora seja esquecido em pouco tempo, é uma forma de garantir que não se repitam no futuro tragédias como essa.

O prédio tombado, devidamente recuperado e utilizado, pode ser um testemunho sólido de que é possível mudar para melhor, quando há vontade política e desejo manifesto da população por essa mudança.
 

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