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Com cores chamativas e pelos que, aos desavisados, são quase um convite ao toque, as lagartas aparentam ser inofensivas. Não atacam, mas, em contato com a pele humana, liberam uma toxina que causa queimaduras e deixa marcas que podem perdurar por anos. Só nos primeiros quatro meses de 2018, 919 acidentes com o animal foram registrados em Minas – contra 905 em todo o ano passado. Belo Horizonte é a cidade com mais notificações: 45 até agora.
O aumento de casos, segundo especialistas, pode estar relacionado a alterações ambientais, como o desmatamento e a maior ocupação em áreas de matas e florestas, além da migração das lagartas para zonas urbanas. Redução de predadores como pássaros e insetos e mudanças climáticas, já que as lagartas se reproduzem em condições de calor e umidade, também não são descartadas.
“Esse crescimento é muito preocupante. O avanço do ser humano em regiões onde esses insetos vivem, com construção de casas e condomínios em áreas verdes, como acontece em Nova Lima (na Grande BH), pode ter contribuído”, diz o professor do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, Evanguedes Kalapothakis.
Representante da Gerência Técnica Estadual do Programa de Vigilância e Controle dos Acidentes por Animais Peçonhentos, Andréia Kelly Roberto Santos acredita que as notificações dessas ocorrências por profissionais da saúde tenham crescido. O registro é obrigatório em todo o país desde 2010. No Hospital de Pronto-Socorro (HPS) João XXIII, referência nesses atendimentos no Estado, foram registrados 211 casos até abril deste ano.
“Muitas vezes, os médicos só informavam se houvesse a necessidade de administrar soro para o paciente, que só é aplicado em situações moderadas e graves. Com o maior aparecimento de lagartas e, consequentemente, de mais queimaduras, acredito que eles tenham entendido a necessidade de reportar os acidentes. Outro ponto é que as pessoas podem estar procurando mais atendimento de saúde nesses casos”, afirma.
Marcas
Moradora de Nova Lima, a arquiteta e urbanista Maria Paula Rossi, de 54 anos, foi queimada por uma lagarta que estava em uma blusa de frio. O resultado: cinco marcas no pulso. "Como vivo em um condomínio fechado, aqui existem muitas árvores e plantas e é comum ver lagartas pretas na varanda”, explica. Maria Paula não viu o bicho na roupa e só percebeu a ardência ao tomar banho. As queimaduras, que antes eram manchas vermelhas, evoluíram para bolhas verdes.
Um acidente há 15 anos também deixou uma cicatriz na pele da auxiliar de serviços gerais Fabiana Lima, de 30 anos. “Estava passando em uma lavoura na roça, perto da casa da minha avó, no interior de Minas. Encostei em uma lagarta que estava em uma folha de couve e fui queimada. A marca existe até hoje e é bem feia”, lamenta.
Buscar atendimento médico é imprescindível para evitar complicações
Ardência na pele, dor intensa, vermelhidão e inchaço são alguns dos sintomas quando a pessoa entra em contato com uma lagarta. Conforme o veneno liberado pelo inseto, alguns pacientes ainda desenvolvem dor de cabeça, náusea, vômitos e até reações alérgicas, explica o coordenador da Unidade de Toxicologia do João XXIII, Adebal de Andrade Filho.
Uma das queimaduras mais perigosas é a provocada pela espécie lonomia. Ela tem a cor verde, linhas amarronzadas e pelos que lembram pinheiros de Natal.
Em contato com a pele, a toxina liberada pode provocar sangramentos graves. “O quadro é extremamente crítico e, se o indivíduo não for tratado, pode morrer”, alerta o médico, também responsável pelo Centro de Informação e Assistência Toxicológica de Minas Gerais.
Óbitos
Em 2018, uma pessoa morreu em decorrência de um acidente com uma lagarta no território mineiro. Segundo a Secretaria de Estado de Saúde (SES), a vítima residia em Araponga, na Zona da Mata. Por isso, ao ter uma queimadura na pele, a medida mais adequada é procurar, o quanto antes, assistência médica.
“É importante que o paciente não passe nenhuma substância no local nem tome remédios para evitar mascarar o quadro clínico. A situação precisa ser avaliada por um especialista”, observa Adebal de Andrade.
Espécie
Saber qual espécie foi a responsável pelo acidente é importante. Porém, em muitos relatos, diz o médico, o doente não vê ou não consegue identificar qual é o inseto. Nesses casos, ele recomenda à pessoa fotografar a lagarta ou capturá-la, colocando o animal em um local seguro para levar até o serviço de saúde.
“Isso agiliza a identificação e evita a evolução da toxina no corpo do paciente. Só após o diagnóstico, que deve ser dado o mais rapidamente possível, será possível dizer se deve ser administrado algum analgésico ou se serão necessários exames e até soro específico para a lonomia, nos casos mais graves”, acrescenta Andrade.