(Cristiano Machado)
Motoristas, cobradores e passageiros de ônibus que trafegam em Belo Horizonte têm se tornado alvos frequentes da bandidagem. A cada dia, sete roubos são registrados, em média, no principal meio de transporte coletivo da capital. Só no primeiro semestre deste ano, em relação ao mesmo período de 2015, o salto nas estatísticas foi de 66%.
O aumento em BH é ainda mais expressivo se comparado aos assaltos registrados nas outras cidades da região metropolitana juntas: nos primeiros seis meses deste ano, ao todo, foram 915 ocorrências contra 618 de janeiro a junho de 2015 – um acréscimo de 48%.
Os assaltantes utilizam armas de fogo e agem rápido para levar celulares, bolsas e dinheiro. O perigo é maior à noite, mas há relatos de ocorrências em plena luz dia. Usuários reclamam da falta de segurança não só no interior dos veículos como nos pontos de embarque e desembarque.
Uma das linhas mais delicadas é a 62 do Move ( Savassi-Venda Nova). Um cobrador que pediu anonimato, de 42 anos, conta que o clima é de tensão, diariamente. Há quase um mês, o ônibus em que ele estava foi assaltado por três jovens, um armado, na avenida Cristiano Machado, na zona Norte de BH, por volta das 19h. O crime aconteceu na mesma semana que outros dois carros da linha foram atacados: às 6h05 e ao meio-dia.
“Os ladrões entram nos ônibus, os mais vazios, no mesmo ponto da rotatória do bairro Primeiro de Maio com a Via 240. Vários passageiros já comentaram o medo de pegar o 62, o 66 (Estação Vilarinho-Hospitais) e os ônibus do Move Metropolitano que passam por ali”, conta o cobrador.
A estudante Maria Clara Araújo, de 34 anos, é um deles. Há cerca de quinze dias, ela desceu um ponto depois de dois homens entrarem no 62 em que ela estava, também na rotatória. “Eles tinham atitudes suspeitas e sentaram no banco atrás do motorista. Tive medo”.
Uma semana depois, mais um susto. “Quatro homens deram sinal no mesmo lugar e o motorista passou direto. Dois dias depois, aconteceu a mesma coisa também na rotatória. Em ambos os casos, os condutores disseram que certamente era assalto”, relata a estudante. Para funcionários do transporte coletivo, os criminosos seriam inibidos se existissem bases da polícia perto da estação Primeiro de Maio e do bairro Floramar.
Vulnerabilidade também nos pontos de embarque e desembarque
Sem iluminação, o ponto de ônibus da avenida Cristiano Machado já é por si só um risco para passageiros. À noite, usuários dizem que o ideal é saber o horário exato do ônibus para não ficar muito tempo no local. Entretanto, conseguir pegar a linha esperada de forma rápida não é sinônimo de alívio.
“Sempre tem alguém comentando que foi assaltado ou que soube de alguém que foi. Há duas semanas um amigo presenciou um assalto na linha 66. Eram três ladrões armados. Um deles até teve um mal súbito e foi socorrido pelo motorista do ônibus”, contou o lavador Roger Taylor, de 20 anos.
De mochila nas costas e fone no ouvido, o rapaz enfrenta o risco todos os dias e disse contar com a proteção divina para que nada aconteça com ele. “Andar de ônibus é muito inseguro, mas não tenho alternativa. Pelo preço da passagem, deveria ter mais segurança. Meu medo é ser baleado em um desses assaltos constantes”, alegou o lavador que mora no bairro Juliana.
Cristiano MachadoNA RUA – Medo também ronda quem espera ônibus na avenida Nossa Senhora do Carmo
Medo compartilhado por passageiros em diversas regiões da capital. Do outro lado da cidade, em um ponto de ônibus na avenida Nossa Senhora do Carmo, na altura do bairro Sion, na zona Sul, um grupo de moças observa atentamente ao redor enquanto aguarda a chegada da linha 3050. Os assaltos a quem está esperando as linhas que passam no local, assim como as ações dos bandidos dentro dos ônibus, são recorrentes.
“Estava aqui há alguns dias quando chegaram dois homens e anunciaram o assalto. Para minha sorte o ônibus passou e consegui entrar antes que eles levassem alguma coisa”, relatou a moça de 27 anos que preferiu não se identificar.
Após o ocorrido, ela começou a calcular o horário exato que o coletivo vai passar e só fica no ponto na companhia de outras pessoas. “Tenho muito medo e a gente está sempre exposto aqui. No ônibus não é diferente, porque eles entram e levam as coisas de todo mundo. Não tem saída para quem depende desse transporte, como eu”, ressalta a passageira.
Registro posterior da ocorrência dificulta a prisão de criminoso
Nem mesmo as câmeras de monitoramento instaladas nos ônibus inibem a ação dos bandidos. Atualmente, cada veículo conta com quatro equipamentos. Diariamente, cerca de 3 mil coletivos circulam em BH, segundo o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra-BH). Na busca da redução das ocorrências, as empresas registram o boletim de ocorrência e entregam, quando solicitadas, as imagens à polícia.
Chefe da Sala de Imprensa da Polícia Militar (PM), capitão Flávio Santiago garante que a falta de uma unidade fixa na área da avenida Cristiano Machado não é problema. “Cada batalhão tem bases móveis que podem ser acionadas a qualquer momento. Se não tem uma na própria avenida, pode estar em alguma rua perto e atender ao chamado”.
O oficial cita a falta de registro imediato da ocorrência como um dificultador para deter o assaltante. “Geralmente, a vítima deixa para relatar posteriormente. O ideal é parar o ônibus e entrar em contato com o 190. Se os celulares de todos que estavam no ônibus foram roubados, peça alguém nas proximidades para acionar a polícia. Mas isso é extremamente necessário para pegarmos o suspeito ainda com os produtos levados, o que garante a prisão dele”, explica.
Números
Ciente do aumento de assaltos a ônibus na cidade, Flávio Santiago afirma que são feitas operações diárias para combater esse tipo de crime. Em julho, na avenida Nossa Senhora do Carmo, por exemplo, 1.182 ônibus foram abordados em ações da PM. Quatro homens foram presos em flagrante quando tentavam roubar uma linha na avenida.
A Polícia Civil informou que foi instaurado inquérito para apurar as ocorrências registradas na área da Cristiano Machado. Os investigadores mantêm contato frequente com as empresas de ônibus, em especial a Viação Progresso, que tem muitas linhas circulando por lá. Imagens de câmeras cedidas por elas podem contribuir nas apurações.
Já a PM garantiu que ações nesse ponto específico foram intensificadas.