Bilheteiros que passam madrugada nas estações dizem atuar como seguranças

Gabriela Sales - Hoje em Dia
29/05/2015 às 06:29.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:15
 (Cristiano Machado)

(Cristiano Machado)

Bilheteiros das estações de transferência do Move, estruturas instaladas ao longo dos corredores das avenidas Antônio Carlos, Pedro I, Cristiano Machado e Vilarinho, em BH, denunciam desvio de função. Aqueles escalados para trabalhar durante a madrugada dizem atuar como seguranças improvisados. Das 0h às 4h, as estações fecham, mas eles continuam no interior das estações.

Nesse período, afirmam, já foram alvo de tentativas de invasão e roubo, praticadas por bandidos de olho no dinheiro arrecado com passagens e recargas de cartões. Quantias mantidas no cofre podem chegar a R$ 10 mil, valor recolhido apenas de manhã.

“Sofremos constantes tentativas de arrombamento. Uma vez, fingiram ser passageiros na tentativa de que eu abrisse a porta”, lembra o controlador de acesso Sérgio Dias.

Além do risco de sofrerem violência, os trabalhadores ainda são submetidos a uma espécie de clausura. No período em que a estação de 132 metros quadrados permanece fechada, a orientação das empresas de transporte é a de que não saiam do local de forma alguma, segundo os bilheteiros, justamente para evitar roubos e depredação. “Nossa arma aqui é o celular. Somos orientados a ligar para a PM quando há tentativa de arrombamento”, afirma Dias.

As empresas negam a ocorrência de desvio de função e justificam a permanência dos funcionários em local fechado em função do horário de trabalho no turno da noite, das 19h às 7h.


INSEGURANÇA – Nem monitoramento por câmeras garante tranquilidade aos agentes de acesso que trabalham nas estações de transferência no turno da noite (Fotos: Cristiano Machado/Hoje em Dia)

Recorrência

Na avaliação de especialista, a manutenção dos bilheteiros em local fechado, sem nenhuma atividade, representa dois problemas. Um é o trabalhista. “Se as funções do empregado não estiverem especificadas em contrato, isso pode configurar, sim, desvio e acúmulo de função”, explica a psicóloga do trabalho Vanessa Andrade.

Outra questão em debate é a saúde desse trabalhador mantido isolado, em um local considerado de risco durante a madrugada. “É uma situação que considero degradante, que pode comprometer a saúde física e mental desse bilheteiro”, reforça a psicóloga.

Insegurança

Desde abril, o Hoje em Dia vem denunciando a falta de segurança nas estações de transferência do Move, especialmente para os passageiros. Muitos relataram ter sofrido assaltos e presenciado vandalismo.

O sistema de transporte foi desenvolvido especialmente para a Copa do Mundo e custou aos cofres públicos em torno de R$ 1 bilhão. Porém, foi inaugurado sem esquema de vigilância.

Após as reportagens do Hoje em Dia, a prefeitura anunciou licitação para contratar 192 agentes desarmados. Eles devem entrar em ação até 15 de junho, 24 horas por dia, em todas as 41 estações.


SÉRGIO DIAS – Controlador de bordo lamenta a falta de segurança e a ociosidade entre 0h e 4h

Simulação de pedido de socorro para tentar abrir a porta

“Quatro horas de terror”. O desabafo é de um controlador de acesso que pediu para não ter o nome divulgado. Ele conta que, em oito meses na função, vivenciou vários momentos de tensão na estação de transferência, durante a madrugada. Em um dos casos, relata, dois homens tentaram invadir o local. “Lembro que eles simularam um pedido de socorro para que eu abrisse a porta”, conta o funcionário.

Na tentativa de não chamar a atenção de criminosos, trabalhadores têm usado a estratégia de esconder os uniformes assim que o dia escurece. Permanecem nas estações como se fossem passageiros. “Como os bandidos ficam observando nossa movimentação, fazemos isso para dificultar a identificação”, diz o controlador de acesso Sérgio Dias.

“São horas de agonia. Não podemos sair das cabines e estamos expostos a vários riscos, já que não há nenhum tipo de segurança”, completa o controlador de acesso que pediu anonimato.

Lentidão

As câmeras instaladas do lado de fora poderiam garantir certa tranquilidade, mas as imagens do sistema são geradas com atraso na central de monitoramento, segundo os trabalhadores.

Em cabines pequenas e estreitas, eles passam as madrugadas. Numa das estações visitadas pela reportagem, a cadeira estava com o encosto quebrado, assim como o bebedouro. O banheiro apresentava vazamento de água.

O Sindicato das Empresas de Transporte de Trânsito de Passageiros de Belo Horizonte (Setra-BH) informou que a geração de imagens ocorre normalmente e que, quando há alerta de assalto, a Polícia Militar e a Guarda Municipal são acionadas.

Ainda de acordo com o sindicato, assim que os vigilantes começarem a atuar nas estações, os bilheteiros terão o quadro de horário alterado.

BHTrans ressalta atuação da PM e da Guarda, mas solução vem mesmo é da vigilância privada

Ninguém foi disponibilizado pela Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans) para falar sobre a insegurança no Move. Em nota, destacou a contratação da equipe de vigilância, que deve melhorar a situação tanto para passageiros quanto para funcionários.

Enquanto a vigilância particular não entra em ação, a empresa informou que a Guarda Municipal e a Polícia Militar realizam o monitoramento dos pontos de transferência.

O Comando de Policiamento da Capital (CPC) garante que o patrulhamento é constante ao longo das avenidas em que os terminais do Move estão instalados.

Segundo o assessor de imprensa do CPC, major Sérgio Dourado, o atendimento é realizado imediatamente quando a polícia é acionada, mas a responsabilidade de monitoramento dos locais é da Guarda Municipal.

Questão trabalhista

A BHTrans esclareceu, ainda, que a responsabilidade pela situação vivida pelos controladores de acesso durante a madrugada é das empresas consorciadas. Ainda de acordo com a autarquia de trânsito, existe a previsão de que as estações funcionem 24 horas após a implantação da vigilância particular.

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Galeria de fotos dos danos nas estações Além dos danos, roubos, assaltos, agressões e até tentativas de estupro são comuns nas estações. Em um intervalo de pouco mais de um ano, desde a inauguração, em março de 2013, pelo menos 327 ocorrências foram registradas pela Polícia Militar no corredor do Move apenas da avenida Antônio Carlos.    Um dos crimes que tiveram grande repercussão dentro das estações, foi a de um assalto de um jovem por uma dupla que foge logo em seguida. Os dois suspeitos chegam correndo e não conseguem embarcar no ônibus. Em seguida, eles abordam com violência o rapaz e levam os fones de ouvido da vítima. Aparentemente ferido, o rapaz é ajudado por testemunhas que presenciaram o crime.    Atualmente, as Estações de Transferência são monitoradas pela Guarda Municipal e pela Polícia Militar. A BHTrans também realiza a conscientização dos usuários sobre a preservação do patrimônio público.   Confira vídeos de vandalismo no Move:

Depredação dos monitores 
 

 

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