Dois pesos, duas medidas: quando a lei muda em função do poder econômico

Renata Evangelista - Do Portal HD
24/08/2012 às 14:03.
Atualizado em 22/11/2021 às 00:43
 (Samuel Costa/Arquivo Hoje em Dia)

(Samuel Costa/Arquivo Hoje em Dia)

Alguns são detidos e esperam pelo julgamento atrás das grades, outros se limitam a prestar esclarecimentos e pagar fiança. No Brasil, a lei que pune motoristas infratores serve para todos, mas a realidade varia de acordo com o poder aquisitivo de cada um.

“O Judiciário deveria ter vergonha de soltar tantos assassinos de trânsito. É muita injustiça. O Brasil é terra de ninguém”. A indignação é do advogado Carlos Cated. Segundo ele, o Código de Trânsito Brasileiro oferece todas as condições para coibir os abusos de motoristas e caminhoneiros, mas brechas na lei fazem com que muitos infratores não sejam punidos como deveriam.

Isso ocorre principalmente com quem tem dinheiro. Em muitos casos, os crimes prescrevem e os condutores sequer são julgados. Enquanto isso, para quem tem poucas condições financeiras, a realidade é mais dura.

A diferença, de acordo com Cated, é que os advogados dos ricos conseguem procrastinar o andamento do processo. “Nesses casos, os irresponsáveis, os criminosos, que dirigem do jeito que querem, ficam impune. Quem já matou continua rodando e dirigindo. Isso é uma agressão a cidadania e ao povo. É uma falta de responsabilidade no que diz respeito à segurança de trânsito”.

Vídeo sobre principais infrações cometidas por caminhoneiros:
 


Recentemente, dois graves acidentes que resultaram em mortes tiveram finais distintos. O filho do bilionário Eike Batista, Thor Batista, atropelou e matou um ciclista na BR-040, na altura de Xerém, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, em março de 2012. A perícia constatou que a McLaren dirigida pelo empresário de 20 anos estava com velocidade acima do permitido para a rodovia.

O carro de Thor não foi periciado no dia do acidente. O filho do bilionário prestou depoimento, pagou fiança, teve sua carteira de habilitação cassada e foi liberado logo em seguida. Quatro meses depois, ele conseguiu recuperar sua CNH. Thor não chegou a ser preso.

Em junho deste ano, o caminhoneiro Jadson Santos Alves, de 26 anos, perdeu o controle de uma Scania, atingiu onze veículos e matou três pessoas que estavam na avenida Nossa Senhora do Carmo, Zona Sul de Belo Horizonte. O tráfego de caminhões no local onde ocorreu a tragédia é proibido por 24 horas, todos os dias da semana, desde janeiro de 2010. (Veja a arte com as restrições de veículos de cargas em BH no final da reportagem).

O caminhoneiro alegou que desrespeitou as placas de trânsito por desconhecer a cidade. Além dessa infração, o veículo estava com excesso de carga e, inclusive, já havia sido parado em um posto da Polícia Rodoviária Federal (PRF), mas os agentes permitiram que o caminhão prosseguisse com a viagem. Perícia realizada no tacógrafo apontou que o motorista da carreta estava com velocidade 50% superior ao permitido para a avenida.

Pelo acidente, Jadson ficou 45 dias preso. Depois que conseguiu arrecadar R$ 12 mil, o equivalente a 20 salários mínimos, valor estipulado pela Justiça, ele deixou a cadeia. Agora, ele aguarda o julgamento em liberdade. Quanto ao caso, Cated é enfático. “Belo Horizonte está jogada às traças. Como é que uma carreta daquele tamanho passou pela avenida e nenhum policial viu? Não existe absolutamente nada em relação a fiscalização na cidade”, declarou.

Para o advogado, os casos envolvendo Thor e Jadson, apesar das diferenças, revelam a tênue realidade de quem tem ou não dinheiro para pagar bons advogados. A situação, na opinião do Cated, é indignante, principalmente pela impunidade. “O governo precisa tomar uma atitude muito mais séria. Além da punição, é necessário oferecer condições para coibir os abusos nas vias e rodovias”, alerta.

 
 

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