Especial - Belo Horizonte, 116 anos de histórias

12/12/2013 às 09:04.
Atualizado em 20/11/2021 às 14:45
 (Frederico Haikal/Hoje em Dia)

(Frederico Haikal/Hoje em Dia)

O Hoje em Dia preparou um caderno especial que revela diferentes olhares sobre Belo Horizonte, que completa 116 anos nesta quinta-feira (12). Veja abaixo uma das matérias. Para acessar a edição completa, http://hojeemdiardp2.digitalpages.com.br/html/login/93. A edição impressa, já nas bancas!

O amor

Por Rodrigo Rodrigues - Hoje em Dia

“Companheirismo”, “admiração”, “cumplicidade”, “cuidado”, “gostar muito de alguém”, “mãe”, “Deus”, “não sei”, “tesão”. Isso é o amor para quem se arrisca a defini-lo, embora a profusão de palavras indique se tratar de sentimento amplo, incapaz de se restringir a uma expressão. A lista é extensa, talvez interminável.

Do mesmo modo, a forma de demonstrá-lo não está descrita em manual algum, independentemente de idade, sexo, formação cultural, política, sobrenome ou parâmetro que lhe seja atribuído, proposto.

Em Belo Horizonte, após 116 anos, torna-se desnecessário invocar teorias para entender que a forma de amar na cidade emoldurada pelas montanhas se transforma dia a dia. A comprovação está em qualquer canto e esquina da capital, que nasceu marcada pela calmaria, estilo pacato e, por que não dizer, conservadora.

Nos 4,3 quilômetros que levam a avenida Afonso Pena do “centrão” à zona Sul, o footing do fim do século 19 ganhou cores novas, estilo diferente, ar libertário. Um breve sobe e desce pelo local evidencia que não há regras para se amar em BH. Idade, sexo, cor e raça se misturam, em nome do amor.

Em uma tarde chuvosa de sexta-feira, Augusto, de 18 anos, “ama” sem culpa ou preocupação com estereótipos. Pela Praça 7, vestido de saia e empunhando uma sombrinha para proteger a namorada, Winnie, de 19, ele transita à margem de qualquer amarra ou convenção social.

“Temos um amor livre. Não nos importamos se alguém está olhando quando estamos nos beijando. Estamos ligados pelo coração. Um respeita o limite do outro, cada um no seu quadrado”, filosofa, em discurso informal, o jovem militante do movimento punk.

Em outro ponto movimentado da cidade, na avenida Brasil, Gabriela, de 22 anos, e Bárbara, de 24, trocam beijos apaixonados. O ponto de ônibus bem movimentado se torna “invisível” diante das demonstrações explícitas de carinho e desejo. “Tem gente que nos olha com ar de reprovação; sei lá, meio assustada. Não nos preocupamos com isso porque nos amamos”, conta Gabriela, sob o olhar atento e admirado da companheira.

No bairro Mangabeiras, a vista privilegiada que se tem do mirante faz a mente viajar. Do local, pode-se enxergar quase toda a cidade. Por outro lado, o ambiente tranquilo e discreto também serve como convite ao amor, ainda mais se for “proibido”.

Ali, no início da noite, Erick, de 23 anos, e Brenda, de 18, chegam para curtir a vista e namorar. Casado, o rapaz diz não se importar com o risco de ser flagrado ou até mesmo fotografado. Faz pose para a câmera, de rostinho colado, beijando. “Amo essa menina demais”, derrete-se.

A moça, por sua vez, trata o sentimento com reservas, beirando o ceticismo. “Amor de verdade, só o de mãe”, define. Diferentemente do companheiro, ela parece se incomodar com a exposição que o registro pode provocar. “Melhor apagar a foto do beijo”, pede. Embora as convenções sociais estejam distante dali naquele momento, percebe-se que não custa nada tomar certos cuidados.

“Na saúde e na doença”

Lidiany tem 21 anos. Nasceu na Paraíba, mudou-se para São Paulo quando criança e, há dois anos, veio para Belo Horizonte. Em linha reta, quase 500 quilômetros separam as cidades. A distância, porém, tornou-se insignificante com um clique e uniu a moça a Glauber, de 31. O bate-papo na internet saiu do mundo virtual e foi parar no altar.

O sonho de uma vida feliz ao lado do amado está mais vivo do que nunca, e a moça dá provas disso diariamente. Desde julho, o professor de informática está “preso” a uma cadeira de rodas, após ter sofrido um AVC.

A recuperação é lenta. A vida se tornou mais difícil para ambos, mas a batalha tem sido encarada, em nome do amor. “Imagine se eu o abandonasse logo agora que ele está numa cadeira de rodas? Não seria correto. No altar, jurei que estaria junto dele, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. Para mim, isso é amor”, sentencia.

A mesma chama mantém acesa Nair, de 88 anos. Há oito, ela foi diagnosticada com Alzheimer, doença degenerativa incurável. O problema a tornou completamente dependente da irmã Violeta, de 69. Com o auxílio do marido, dos filhos e de uma enfermeira, cabe à aposentada os cuidados com a irmã mais velha. “O médico já me falou várias vezes que ela só está viva pelo amor que recebe diariamente da família”, revela Violeta.

Diante do quadro irreversível, há quatro meses a medicação foi suspensa pela geriatra que a acompanha. Contudo, a ausência dos remédios não complicou o quadro de saúde. “A médica disse que ela chegou em uma fase definida como a do prazer. Tudo que for bom, que façamos. Ela está vivendo de amor”, atesta.

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