Fiscalização ruim favorece taxistas ilegais em BH

Renata Galdino - Hoje em Dia
10/03/2015 às 08:37.
Atualizado em 18/11/2021 às 06:17
 (Lucas Prates/Hoje em Dia)

(Lucas Prates/Hoje em Dia)

A livre atuação em Belo Horizonte de taxistas de municípios da região metropolitana tem deixado a categoria com os ânimos exaltados. Permissionários da BHTrans denunciam que a fiscalização ineficiente tem contribuído para a ocorrência de confrontos entre condutores da capital e ilegais.

Em um dos casos, um taxista de BH e outro de Betim se agrediram após o segundo parar em um ponto na cidade para pegar passageiro. Um vídeo flagrou a briga e motivou um requerimento na Câmara Municipal para a realização de uma audiência pública.

Há relatos, inclusive, de permissionários da capital cercando carro de Confins e exigindo o desembarque do cliente. “A situação está fora de controle. Já estamos prevendo uma tragédia caso não seja feito nada”, alerta um taxista de Belo Horizonte, que pediu para não ser identificado.

De acordo com ele, a maioria dos ilegais que transportam passageiros dentro da cidade é formada por ex-taxistas que residem em BH, mas conseguiram, por meio de licitação, placas em municípios vizinhos. Porém, continuam circulando na maior praça da região metropolitana por causa da maior demanda e lucratividade.

Foi o caso de um condutor de Vespasiano, que levou uma equipe do Hoje em Dia, no último sábado, do Biocor, em Nova Lima, à Savassi, na zona Sul. À reportagem, o taxista, que mora na capital e trabalhava na cidade como auxiliar, contou ter adquirido a placa em Vespasiano há oito meses. “Desde então, rodo aqui (em BH), de segunda à sábado”, afirmou.

Mesmo sabendo da irregularidade, o motorista disse que compensa mais prestar o serviço na capital. “Em um dia, ganho de R$ 300 a R$ 400. Em Vespasiano, não passa de R$ 70”. Segundo ele, a situação ocorre porque há dificuldade em conseguir a outorga de táxi em Belo Horizonte. “Então, há outros motoristas que vão atrás de placas nas cidades do interior, mas voltam para trabalhar aqui”, revela.

Durante a corrida, o permissionário encontrou um colega taxista no trânsito, também com placa de Vespasiano, e gabou-se com ele de jamais ter sido importunado pela fiscalização, nem da PM, nem da Guarda Municipal. “Nunca, nem vou ser”.

REIVINDICAÇÕES

Os atritos envolvendo condutores de Belo Horizonte e da RMBH motivaram o Sindicato dos Taxistas de Belo Horizonte (Sincavir) a enviar, em outubro, ofício reivindicando providências por parte da BHTrans, Comando de Policiamento da Capital (CPC), Batalhão de Trânsito e Guarda Municipal.

“É necessário reciprocidade. Se hoje o permissionário de BH não pode atuar em Confins, por exemplo, pois está sujeito à fiscalização, da mesma forma deve ocorrer com quem vem de lá e embarca passageiros aqui”, enfatizou o presidente do Sincavir, Ricardo Faedda.

O assunto tomou tamanha proporção que será discutido nesta quarta-feira (11) em uma reunião entre permissionários e BHTrans. Assessor da presidência da empresa de transporte e trânsito da capital, Totó Teixeira alertou que a situação é preocupante. “Informações que chegam dão conta da iminência de uma briga entre os permissionários daqui e os que circulam ilegalmente. Alguma coisa tem que ser feita”, ressaltou.

No caso da BHTrans, de acordo com Totó, o órgão não tem poder de fiscalizar táxis de outros municípios. “Também pedimos à população que não pegue carro que não seja de BH”, reforçou.

O tema também será discutido em audiência pública na Câmara Municipal da capital, em data ainda a ser definida.

Aplicativos ajudam motorista ‘invasor’ a conseguir passageiro na capital

Para não serem flagrados pela fiscalização e também evitar confusão com taxistas regulamentados parados em pontos na capital, permissionários de cidades não conveniadas se valem da tecnologia para conseguir clientes em Belo Horizonte. “Os aplicativos como Way e Easy Taxi apitam o tempo todo, e tenho cadastro em todos esses programas”, contou um taxista regulamentado em Vespasiano, mas que trabalha na capital.

No entanto, os ilegais não ficam reféns a chamados de aplicativos. De acordo com um motorista de Confins, que pediu anonimato, os passageiros não diferenciam os permissionários de BH e os de outras cidades. “Dão sinal e, se percebem que o táxi não é da capital, não se importam. Eles acham que é tudo a mesma coisa”, afirma o condutor, que circula, principalmente, na zona Norte de Belo Horizonte.

A região é uma das mais frequentadas pelos taxistas irregulares, de acordo com o presidente do Sindicato dos Taxistas (Sincavir), Ricardo Faedda. “Eles preferem ficar longe do hipercentro. Também é fácil encontrá-los no Barreiro e no Belvedere, bem na divisa com Nova Lima, principalmente à noite. Porém, eles estão em todos os lugares”.

“Esses taxistas vão para BH porque em suas cidades não encontram demanda”, reforçou Totó Teixeira, assessor da presidência da BHTrans. Para se ter uma ideia, de acordo com a Prefeitura de Vespasiano, os 120 taxistas regulamentados atendem a uma média de oito passageiros ao dia.

PERDA DA LICENÇA

O condutor de Vespasiano ouvido pelo Hoje em Dia afirma nunca ter sido pego pela fiscalização, mas conta que colegas já foram flagrados em situação irregular. Porém, ele diz que, apesar das punições, não há risco de perder a licença. “A BHTrans não pode fazer nada. Só a Polícia Militar e o DER (Departamento de Estradas de Rodagem). Nesses casos, o carro é rebocado e é necessário pagar apenas a multa”.

As prefeituras afirmam que a punição é severa, prevista em regulamento. Por meio de nota, a administração municipal de Vespasiano informou que o permissionário pode perder a concessão se constatada a irregularidade, mas não informou como é feita a fiscalização e se já teve o desligamento de algum taxista por causa da ilegalidade.

Já a Prefeitura de Betim disse que, caso o permissionário seja flagrado circulando em outros municípios nessas condições, ele poderá ser multado ou ter o veículo apreendido.

Por meio de nota, a Guarda Municipal de Belo Horizonte informou que, dentro das atividades de fiscalização e orientação, o grupamento de trânsito do órgão é orientado a realizar autuação dos motoristas flagrados cometendo a infração.

A corporação garantiu que irá encaminhar a demanda para a próxima reunião semanal de organização e estratégia da Unidade Integrada de Trânsito – composta ainda pelo Batalhão de Polícia de Trânsito (BPTran) e BHTrans –, que gerencia as ações de trânsito em Belo Horizonte.

O BPTran também foi procurado pelo Hoje em Dia, mas não se manifestou sobre o assunto.

Fraude em concessões para comprar carro mais barato

O uso indevido da concessão de placas de táxi também ocorre sem freios no interior de Minas. Em janeiro, o Hoje em Dia mostrou que, sem qualquer tipo de licitação, as prefeituras distribuem permissões a particulares, que, na realidade, estariam interessados somente na facilidade para adquirir veículos novos, pagando preços bem mais camaradas.

Pela legislação, quem trabalha como taxista é prestador de serviço e tem isenções de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o que permite comprar um veículo zero quilômetro com até 28% de desconto. Além disso, o motorista de táxi não precisa desembolsar nem um centavo com o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).

Como os carros não são efetivamente utilizados na prestação do serviço público, Estado e União vêm registrando prejuízos financeiros incalculáveis ao longo dos anos com a fraude.

De acordo com a Polícia Civil, quase 31 mil táxis estão aptos a rodar nas 853 cidades do Estado, mas, graças ao critério político para a distribuição das placas, em Minas existem cidades com média de táxi superior à do Rio de Janeiro, destino turístico com alta demanda pelo serviço.

Destino

Sem regulamentação, carros que deveriam transportar passageiros foram parar nas mãos de familiares de políticos, servidores do Judiciário, comerciantes, funcionários de câmaras municipais e empresários. Um dos exemplos está em São Gonçalo do Rio Abaixo, na região Central de Minas. Com 10 mil habitantes, a cidade tem 67 táxis cadastrados, média de um veículo para cada grupo de 149 passageiros.

(*) Colaborou Raquel Ramos
 

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