Hospitais da rede particular se rendem ao parto normal

Raquel Ramos - Hoje em Dia
14/12/2014 às 08:06.
Atualizado em 18/11/2021 às 05:22
 (Kalu Brum/Divulgação)

(Kalu Brum/Divulgação)

Medidas adotadas por maternidades particulares da capital mineira estão mudando, pouco a pouco, a forma como os bebês belo-horizontinos chegam ao mundo. Desafiados por uma onda de campanhas em prol do parto normal, as instituições se viram obrigadas a tomar providências para reduzir a alta taxa de cesáreas desnecessárias. Só no ano passado, 76% dos nascimentos em hospitais pagos de BH aconteceram por meio de cirurgia, segundo a Secretaria Municipal de Saúde.   As alterações mais significativas ocorreram na Unimed, unidade Grajaú. Em abril, foi inaugurado um centro com quatro quartos PPP (pré-parto, parto e puerpério imediato).   Com mais privacidade, as pacientes podem ter a presença de familiares durante o processo de nascimento do filho e levar um pouco do ambiente domiciliar para o hospital, afirma Paulo Tarcísio Pinheiro da Silva, superintendente da maternidade. A estrutura está disponível para qualquer cliente, sem valor adicional.   “Doulas e enfermeiros obstetras também foram integrados ao corpo clínico e até reforçam os plantões”. O trabalho dos novos profissionais, segundo ele, ajuda a conter o abuso de intervenções, como a aplicação de hormônios que aceleram a chegada do bebê.   Discretamente, os resultados começam a aparecer em números. De 2012 para 2013, o índice de cesarianas realizadas na Unimed caiu de 66,2% para 63,6%.   Hospital que chegou a alcançar a marca de 90% dos nascimentos por meio de procedimentos cirúrgicos, o Mater Dei segue o mesmo caminho. A principal mudança foi a organização da equipe clínica dos plantões, incluindo obstetras que têm ampla experiência em partos normais.   Em seis anos, informou Carlos Henrique Mascarenhas, coordenador da equipe de ginecologia e obstetrícia da instituição, a porcentagem de mulheres que dão à luz por via vaginal na maternidade deu um salto de 10% para 47%.   De forma mais tímida, o Vila da Serra – referência em gravidez de alto risco e vice-campeão em número de cesáreas – também fez reformulações pró parto normal. Além de abordar o tema em simpósios realizados com médicos, recentemente foram construídas salas mais espaçosas, equipadas com escadas fisioterápicas, bolas e outros recursos não farmacológicos que aliviam as dores das parturientes.
 
Especialista avalia que medida reduz os riscos de infecção   As mudanças nas maternidades privadas ainda são insuficientes, na opinião de Sônia Lansky, pediatra e coordenadora da comissão peri natal da Secretaria Municipal de Saúde. “Mais hospitais têm que participar desse movimento, dando fim ao que chamo de “epidemia de cesarianas”.   Defensora do parto normal, ela ressalta que o processo garante recuperação mais rápida à mulher, traz menos risco de infecção e estimula a produção do leite materno.   E os benefícios também alcançam os recém-nascidos. “A passagem pelo canal vaginal reduz os problemas respiratórios da criança por ajudá-la a expelir líquidos do pulmão. E a interação da carga genética do bebê com a flora bacteriana da mãe dispara mecanismos de defesa no neném, que o protegem, até a vida adulta, de problemas como obesidade, hipertensão, diabetes e asma. Os estudos mais recentes demonstraram isso”.   Por outro lado, ainda há práticas obsoletas adotadas sem critérios por alguns médicos que transformam o parto normal em uma experiência de sofrimento. O corte no períneo, exemplifica Sônia, não deve ser prática rotineira, assim como manobra de kristeller (empurrar a barriga da mãe) ou excesso de anestesias.   Aplicação desmedida de hormônios artificiais para acelerar o parto também é prática condenada. “Esse procedimento traz muita dor à mulher. Aliado às outras condutas, fazem o processo de nascimento de uma criança, que deveria ser uma vivência prazerosa, em um momento doloroso”.   A presença de doulas durante o parto normal pode minimizar a necessidade de intervenções técnicas. “Elas ficam ao lado da mulher e carregam consigo o que chamamos de boas práticas obstétricas”, diz a pediatra.   Desde 2010, Kalu Brum está nessa profissão. O trabalho dela começa ainda na gestação, ajudando a família a refletir sobre as opções para o parto. “O que faço ainda é pouco compreendido, mas já foi comprovado que com as técnicas que utilizamos, podemos reduzir em até 50% as anestesias porque propomos medidas naturais para amenizar a dor”.   Mesmo que todas as medidas sejam tomadas para favorecer o parto normal, o ginecologista Carlos Henrique Mascarenhas lembra que, em muitas situações, é preciso recorrer a procedimentos cirúrgicos. “Graças a essa prática clínica foi possível reduzir significativamente o número de mulheres que morriam durante o parto”.     SUS quer índices menores Embora o número de cesáreas já seja baixo nos hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS), medidas têm sido adotadas para alcançar resultados ainda melhores. A afirmação é de Sônia Lansky, pediatra e coordenadora da comissão peri natal da Secretaria Municipal de Saúde. A meta do órgão é chegar ao índice de pelo menos 30% em toda rede pública.   Agora, tem sido priorizado melhorias no ambiente das instituições para oferecer mais conforto às parturientes, e reestruturação da equipe clínica, com inserção de doulas e enfermeiros obstetras em todas as maternidades.   Das sete unidades de saúde que atendem grávidas pelo SUS, apenas uma ainda não se adaptou. “A exceção é o Hospital das Clínicas, onde ainda faltam esses profissionais”, diz Sônia.      Humanização do parto Na última semana, a Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) deu parecer favorável, em 1º turno, ao Projeto de Lei (PL) 4.783/13, do deputado Adelmo Carneiro Leão (PT), que institui o Plano Estadual para a Humanização do Parto.   A medida dá ao Estado a responsabilidade de garantir uma assistência humanizada e segura às gestantes e recém-nascidos que forem atendidos por maternidades públicas. Para isso, as parturientes deverão ser tratadas de modo personalizado, o que pode resultar em uma diminuição de procedimentos induzidos, como a operação cesariana. Pelo texto, caberá às mulheres decidirem o tipo de parto que desejam ter, evitando, assim, práticas invasivas sem justificativa clínica.   A proposta é que as grávidas tenham todas as informações relativas ao parto, como o estado de saúde da criança, as diferentes possibilidades de intervenções médico-hospitalares e benefícios da amamentação. Se aprovado, o PL também garante que mães e filhos permaneçam em alojamento conjunto.Agora, o projeto foi encaminhado ao Plenário para ser votado em 1º turno.

© Copyright 2024Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por
Distribuido por