(Marcelo Barbosa/Agência Minas)
Resgatar o orgulho das origens. Esse é um dos principais objetivos alcançados com iniciativas implantadas nas 29 escolas quilombolas estaduais. Desde 2015, uma série de ações tem favorecido a inclusão de moradores das comunidades em Minas. Além de disciplinas voltadas para o tema, descendentes dos povos remanescentes estão sendo privilegiados em processos de contratação de funcionários nessas instituições.
Em 2016, resolução publicada pela Secretaria de Estado de Educação (SEE) instituiu a escolha de servidores preferencialmente das comunidades para os cargos de diretor e vice nas unidades de ensino. Outra medida, de janeiro deste ano, priorizou a seleção dessas pessoas para as vagas de professor, cantineiras, faxineiras, secretárias, dentre outras.
Com a iniciativa, houve aumento de 90% no quadro de profissionais de origem quilombola entre os auxiliares de serviço e de 50% entre os docentes.
Reflexos
O impacto positivo das medidas é observado na Escola Estadual Padre João de Santo Antônio, em Pinhões, área rural de Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Em 2011, a instituição foi reconhecida como quilombola pelo Ministério da Educação (MEC).
Cinco professores e todos os seis funcionários auxiliares são do grupo remanescente. Ensinamentos sobre as origens e a importância histórica já são aplicados a alunos de 6 anos, que passam a conhecer os pontos importantes da localidade e seus significados.
Mas foi somente após 2015 que o tema passou a receber um olhar diferenciado da gestão da escola. “Ele não era trabalhado (em sala de aula) porque não éramos orientados a isso. Os meninos não queriam. Para eles, ser descendentes de negros era questão de vergonha”, conta a diretora Paola Catharine Cordeiro Silva.
Pertencimento
Segundo ela, por meio de cursos específicos promovidos pela SEE, houve troca de experiências e a consciência de aplicar o tema o ano inteiro, não só no Dia da Consciência Negra. “Hoje, os alunos já têm esse sentimento de pertencimento”.
Que o diga Tamara Leandra Celestino, de 18 anos, que afirma ter descoberto ser quilombola na escola. “Isso nunca foi abordado em casa. E é bem legal porque, ao invés de nossos pais passarem isso para a gente, é a gente que está passando para eles”, diz a estudante.
Já para Núbhia Helen Martins da Conceição, também de 18, o ambiente educacional a tem ajudado a enfrentar o racismo. “Desde pequena ouvia piadinhas, chegava em casa e chorava. Eu tinha preconceito comigo mesma, e isso foi só agora que descobri. A gente tem mais quilombola aqui na escola, fala desse assunto, vai entendendo mais as coisas, sabendo a origem da gente”, diz.
Trabalho
As mudanças decorrentes da implantação de políticas voltadas para as escolas quilombolas possibilitou que os remanescentes fossem inseridos no mercado de trabalho. É o caso de Maria Valdete Costa, de 52 anos, da comunidade de Pinhões.
Como babá, ela acordava às 4h para chegar a tempo de iniciar o expediente. Por dia, era necessário pegar oito ônibus e deslocar cerca de cem quilômetros.
Há três meses, Maria Valdete foi contratada como cantineira da Escola Estadual Padre João de Santo Antônio, instalada em Pinhões. “Quando me falaram da vaga, que eu tinha direito, me inscrevi, mas nem fiquei tão esperançosa. Sempre tive vontade de trabalhar aqui, mas a gente sabia que era complicado. Agora eu atravesso a rua e chego ao trabalho”, comemora.
Qualificação
As medidas também aumentaram a busca por qualificação entre os membros dos grupos remanescentes.
Segundo a representante da Secretaria de Estado de Educação, Iara Pires Viana, levantamentos indicavam, há três anos, a baixa esco-larização nas comunidades. No entanto, ela afirma que há um número crescente de quilombolas procurando o ensino médio e ingressando nas universidades.