Linda, magra, curiosa, simpática e sem experiência profissional. Uma pesquisa rápida na internet expõe dezenas de anunciantes atrás de moças com essas características, as chamadas “fichas-rosas”. A função proposta a essas jovens, muitas delas modelos, é trabalhar em eventos de exposição de produtos, porém, devem estar dispostas a se prostituir após a programação oficial.
Elas recebem tal denominação para serem diferenciadas das “fichas-brancas”. Estas, maioria nos salões de exposição, limitam-se a fazer a recepção e não topam “esticar” após o evento.
Embora explorar a prostituição possa render até cinco anos de prisão, só no Facebook, uma busca por “ficha-rosa” exibe cerca de cem resultados. Há ainda sites que agenciam essas moças para trabalhar no mercado de luxo, com foco em executivos. Na pesquisa, também encontra-se seleção para rapazes, os “fichas-azuis”.
ABRANGÊNCIA
Em BH, um site recruta “fichas-rosas” para atuar na capital e em mais de 200 cidades pelo interior. A agência deixa claro que as meninas precisam ter mais de 18 anos e têm a possibilidade de “altos ganhos”, que variam de R$ 1 mil por semana a até R$ 5 mil por mês.
Para se candidatar, a pretendente responde a um amplo formulário, onde deve informar a idade, características físicas, se tem filhos, estuda ou trabalha, e outras particularidades, como se tem ou não silicone, se atende ambos os sexos e casais, além de ter que enviar fotografias.
Um dos anúncios destaca que as moças devem “preferencialmente” ter outra atividade, trabalhar ou estudar, para que sejam “acima de qualquer suspeita”.
Nossa reportagem entrou em contato com um agenciador, mostrando interesse em entrar nesse mercado. Do outro lado da linha, um rapaz explica que faz a indicação para atendimento em festas e eventos, que vão desde salões de automóveis a encontros particulares.
O cachê para ficar no estande é de, em média, R$ 200, mais transporte e alimentação. Se ela é “ficha-rosa”, recebe ainda entre R$ 500 e R$ 1.500 para participar de coquetéis após o evento oficial. Nesse valor estão incluídos os programas, sendo que 25% vão para o agenciador.
“É tudo muito discreto. Tenho uma seleção variada, desde meninas iniciantes à capa de revista Sexy. Tem gente que não gosta de menina muito bombada para não ficar na cara que é acompanhante”, explica o agenciador.
SUPORTE
Existem sites que prometem facilitar a vida de quem quer iniciar no ramo, oferecendo ensaios fotográficos e divulgação na internet. Por telefone, o responsável diz que a maior demanda de meninas “ficha-rosa” é para congressos e feiras, mas também há pedidos para eventos esportivos e festas particulares.
Ele explica que as moças são selecionadas para ficar nos estandes, com cachê entre R$ 400 e R$ 600, para atrair clientes. “Mas, caso algum cara se interessar por você no estande, o que você cobrar dele é seu”. Comodidade também para quem atua no ramo ‘tradicional’ Navegando pelos anúncios na rede social, além da demanda por meninas “ficha-rosa”, a reportagem também encontrou diversas moças vendendo diretamente seus serviços aos clientes. Vanessa, nome fictício de uma garota de programa, tem 19 anos e há um se prostitui. Ela é universitária, cursa administração, mas, em sala de aula, os colegas nem desconfiam do seu trabalho. A mãe, mesmo contrariada, sabe da atividade da filha. “No início, ela ficou meio preocupada, mas agora está normal, não é uma coisa que me prejudica”, garante. A decisão de se prostituir tem uma justificativa. “A gente estava passando fome, resolvi fazer programa porque estava ficando muito apertado arcar com tudo mais a faculdade”. Vanessa cobra R$ 250 por programa e diz que ganha entre R$ 3 mil e 4 mil por mês. Os clientes, segundo ela, são advogados, juízes, militares, jogadores de futebol, muitos homens casados. Ela também atende mulheres e casais e diz que nunca teve medo. “É tranquilo, tem segurança, motorista particular”, detalha. Ainda assim, não planeja ficar muito tempo nessa rotina. “É temporário, até eu me formar na faculdade”.
A estudante de psicologia Flávia (nome fictício), outra garota que aceitou conversar com a reportagem, tem 21 anos. Começou a se prostituir há seis meses. Ela é agenciada por uma mulher conhecida como Baiana, que fica com metade de tudo que ela ganha com os programas. O preço é R$ 250, em média. Ela garante que consegue ganhar até R$ 9 mil por mês. “Vítimas” têm interesse em perpetuar o crime O termo “ficha-rosa” é novidade para a delegada de Atendimento à Mulher, Cristiane Ferreira Lopes, responsável por investigações contra a dignidade sexual. Porém, o crime que a expressão encoberta é bem conhecido. Quem induz ou atrai alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual pode ser enquadrado no artigo 228 do Código Penal, que prevê pena de dois a cinco anos de prisão, mais multa. A atividade é permitida apenas sem a figura do agenciador e para pessoas maiores de 18 anos.
A delegada diz que os termos usados no agenciamento de garotos e garotas de programa sempre mudam, até mesmo para dificultar investigações. Outro empecilho para localizar os agentes é a conivência das “vítimas”. “É uma rede de prostituição onde elas têm interesse na continuidade do crime. Falo pela minha experiência. A moça se sente segura, porque tem um aparato antes de chegar ao cliente. Sabe que o cliente tem referência, procedência”, comenta. Cristiane afirma que mesmo aqueles que dizem que só divulgam os “serviços” das meninas estão incorrendo em crime. “Estão facilitando a prostituição ou a exploração sexual”.
SEM DENÚNCIA A assessoria de imprensa do Ministério Público de Minas Gerais informou nunca ter recebido representação sobre as agências virtuais de “ficha-rosa”, mas vai apurar as informações repassadas pela reportagem.