Vida nova

Jovem com câncer de mama em estágio avançado conclui quimioterapia e toca 'sino da vitória'

Pacientes oncológicos em diversos países tocam o sino para simbolizar o início de uma nova etapa de vida

Da Redação*
Publicado em 25/07/2023 às 15:28.
Na última sexta, Bárbara fez o "sino da vitória" badalar diversas vezes (Jean de Jesus/Divulgação)

Na última sexta, Bárbara fez o "sino da vitória" badalar diversas vezes (Jean de Jesus/Divulgação)

A advogada Bárbara Dias, 27 anos, realizou, na última sexta-feira (21), a última sessão de quimioterapia. Emocionada, caminhou em direção ao "sino da vitória", instalado em uma das paredes da sala de infusão de quimioterápicos do Hospital Alberto Cavalcanti (HAC), no bairro Padre Eustáquio, em Belo Horizonte, e o fez badalar diversas vezes.

O gesto acompanhado pela mãe, demais pacientes e profissionais da unidade de saúde também emocionou a todos devido ao forte simbolismo: o final de uma das etapas mais dolorosas do tratamento oncológico e, especialmente naquele dia, a retomada da cerimônia no hospital da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig).

Raro em mulheres jovens

Casos de câncer de mama em mulheres jovens não são comuns. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), esse tipo de neoplasia maligna é raro nas faixas etárias inferiores aos 40 anos, pois a maior parte dos casos ocorre a partir dos 50 anos. Quando diagnosticado em mulheres jovens como no caso de Bárbara Dias, o câncer de mama tende a ser mais agressivo.

Bárbara conta que observou algo estranho em sua mama esquerda ao retornar de uma viagem à praia no feriado de 15 de novembro do ano passado. Após uma consulta, a médica solicitou a realização de uma biópsia. O resultado do exame saiu em dezembro, dois dias antes do Natal, e revelou um câncer em estágio 3 – considerado localmente avançado.

Com o diagnóstico, ela iniciou as sessões de quimioterapia no HAC em janeiro deste ano. “Chorei muito ao ouvir que o resultado da biópsia era positivo. Pela minha idade, nunca imaginei passar por isso”, conta a jovem advogada.

Impacto e pausa

Sem histórico familiar de câncer de mama, a jovem diz que estava trabalhando e construindo uma carreira, além de ter iniciado uma segunda graduação, quando foi surpreendida pela doença. Ela teve que pausar não somente seu emprego como também os estudos.

“No início foi extremamente difícil; se não fosse minha mãe, seria ainda mais. Eu não queria sair de casa, estava um pouco deprimida. Quando fazia quimioterapia, sentia muito enjoo, cansaço e dores nas pernas. Com o tempo, fui saindo aos poucos com minha mãe, sempre respeitando os limites do meu corpo. Me deparar no hospital com médicos e, principalmente, enfermeiras positivas, alegres e à minha disposição para oferecer qualquer suporte, me deu muito ânimo para encarar as sessões”, conta.

Bárbara relata ainda que, depois do diagnóstico, passou a se divertir mais, a cuidar da saúde, a frequentar a academia e, principalmente, a ter mais fé. “O câncer aflorou minha religiosidade. Foram seis meses árduos, agora é a consagração da minha vitória. Tocar o sino é uma forma de comemorar com as enfermeiras, demais profissionais do hospital e com minha mãe, além de ser uma forma de motivar outras pacientes”.

Para Rosemary Dias, 55 anos, cuidadora de idosos e mãe de Bárbara, a cerimônia do sino significa superação e fé na medicina. “É um misto de emoções. Quando minha filha teve o diagnóstico, chorei muito, fiquei abatida por causa das ideias preconcebidas sobre a doença. Entre os idosos de que cuido, há pacientes oncológicos e estou acostumada a me deparar com um desfecho de morte”.

Esse cenário contribuiu para o impacto inicial que a notícia da doença de sua única filha lhe causou. Rosemary a acompanhou ao longo de todo o tratamento e conta que ficava acordada à noite, temerosa de que Bárbara se sentisse mal e ela não estivesse por perto para ajudá-la. Segundo a mãe, foram momentos difíceis que ficaram para trás com o fim das sessões de quimioterapia.

Pintura especial

A prática de tocar o sino no HAC – referência estadual em oncologia, teve início na antiga sala de infusão da unidade em setembro de 2020 e foi temporariamente interrompida, no ano passado, para que o setor ocupasse uma área maior e mais confortável para os pacientes. Com a mudança, a parede do sino ganhou uma pintura especial realizada pela artista plástica Thaís Aguiar e uma frase de incentivo: “nunca duvide da sua força”.

Idealizadora da pintura, Thaís Aguiar sublinha que todas as suas obras são carregadas de significados. “Essa é muito especial para mim por fazer parte de um momento ímpar na vida do paciente. Saber que, de alguma forma, contribui para a alegria desse momento, principalmente por meio da arte, me traz uma sensação enorme de gratidão e alegria”, ressalta.

Em 2021, 8.207 pessoas passaram pela quimioterapia do HAC. No ano passado, foram 7.716 e até junho deste ano, outras 3.932 realizaram sessões de quimioterapia. Somadas, elas representam quase 20 mil pacientes no período de dois anos e meio. Apenas no primeiro semestre deste ano, foram realizadas 770 primeiras consultas no ambulatório de oncologia.

Soro da esperança

A história de Bárbara Dias e da “cerimônia do sino da vitória” no HAC se conectam e reforçam o sentido atribuído à sala de infusão pelos profissionais que nela atuam. Como explica a enfermeira Gislene Silva, a sala de infusão é um ambiente de acolhimento. “A pessoa pode chegar derrotada e sem esperança. A primeira quimioterapia é o ponto crucial para despertar a esperança e o desejo de continuar. Na última sessão, quando toca o sino, ela abre um sorriso que justifica o nosso trabalho”, confessa.

Segundo Gislene, ao receber o diagnóstico de câncer, a maioria das pessoas o interpreta como uma sentença de morte por se tratar de uma doença estigmatizada e de difícil manejo. “Tenho uma frase que uso com nossos pacientes: na sala de infusão servimos o soro da esperança, se existe tratamento, existe chance de cura".

A enfermeira oncologista Giselle Vaz, que também atua no setor de Quimioterapia do HAC, reconhece que ela e os demais profissionais do hospital têm a responsabilidade de cuidar de seres humanos que vivenciam uma das piores fases de suas vidas. “Não podemos esquecer de que essas pessoas são muito mais do que um diagnóstico, elas têm uma história de vida e são o amor de alguém. Como diria Patch Adams – médico norte-americano e um dos pioneiros da humanização da assistência hospitalar, ‘ao cuidar de uma doença você pode ganhar ou perder. Ao cuidar de uma pessoa você sempre ganha’”, reitera.

Toque o sino

Foi esse sentimento de vitória que motivou uma ex-paciente do hospital a doar o sino que hoje simboliza a retomada das rédeas da própria vida para aqueles que o tocam. Depois de saber sobre a prática por meio de uma reportagem jornalística em 2020, essa ex-paciente, que tratava um câncer de mama, contou que desejava tocar o artefato de bronze para marcar o fim das suas sessões de quimioterapia. “E assim aconteceu, no último ciclo de quimioterapia, ela e o esposo doaram o sino para a sala de infusão e o tocaram pela primeira vez”, relembra Giselle Vaz.

Desde então instalado na sala de infusão do HAC, o sino que remete à campanha mundial “Ring the Bell” foi rebatizado como “Sino da Vitória”. Para a coordenadora da unidade ambulatorial oncológica e quimioterápica do HAC, a enfermeira Cíntia Esteves Soares, ele representa o ápice do trabalho dos profissionais do hospital. “O sino representa o fim de um ciclo de forma vitoriosa”.

O que viria a se tornar uma tradição internacional, teve origem em 1996, em um dos hospitais de referência em tratamento oncológico nos Estados Unidos – o M. D. Anderson Cancer Center, quando o almirante da Marinha Irve Le Moyne, em tratamento de um câncer de cabeça e pescoço, fez a doação de um sino para o setor de radioterapia como forma de celebrar a superação da doença. Assim nasceu o “Ring the Bell” (Toque o Sino).

* Texto adaptado da Agência Minas

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