Zonta da Mata

Justiça reconhece vínculo de emprego entre acolhidos e comunidade terapêutica em Minas

Seis homens eram explorados em obras de ampliação e outras atividades; clínica de Juiz de Fora deverá pagar R$ 10 mil de indenização por danos morais

Do HOJE EM DIA
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Publicado em 06/10/2025 às 11:32.
Justiça do Trabalho reconhece vínculo de emprego entre acolhidos e comunidade terapêutica em Juiz de Fora
Instituição ainda deverá pagar indenização individual aos trabalhadores e indenização por dano moral coletivo (Reprodução/TRT MG)

Justiça do Trabalho reconhece vínculo de emprego entre acolhidos e comunidade terapêutica em Juiz de Fora Instituição ainda deverá pagar indenização individual aos trabalhadores e indenização por dano moral coletivo (Reprodução/TRT MG)

Uma comunidade terapêutica de Juiz de Fora, na Zona da Mata, foi condenada pela Justiça do Trabalho a indenizar em R$ 10 mil, por danos morais, seis "acolhidos" resgatados em situação análoga à escravidão. O Tribunal Regional do Trabalho (TRT-MG) também reconheceu o vínculo empregatício entre a clínica de recuperação e os internos, que deverão receber todas as verbas trabalhistas devidas.

O local explorava a mão de obra dos homens, inclusive na obra de ampliação da sede.

A investigação do caso começou em 2023, após uma denúncia que levou auditores-fiscais do trabalho e a Polícia Rodoviária Federal (PRF) a uma inspeção. Os agentes encontraram os seis homens trabalhando em diversas funções: na horta, na cozinha, como supervisor e três deles na construção civil.

O responsável pela clínica alegou que os homens eram voluntários e recebiam um "valor" pelas atividades, mas os trabalhadores negaram ser acolhidos, dizendo apenas que faziam trabalho voluntário. Contudo, a equipe técnica identificou condições precárias nos alojamentos, no preparo de alimentos e no saneamento básico do local.

Trabalhadores eram dependentes químicos em tratamento
A Vigilância Sanitária concluiu que não havia elementos para demonstrar que a clínica funcionava como comunidade terapêutica, pois não foram encontrados prontuários, prescrições médicas ou plano terapêutico.

Em nova vistoria, o Ministério Público do Trabalho (MPT) confirmou que os seis homens moravam e trabalhavam no local sem registro, sem remuneração e sem equipamentos de proteção individual (EPIs). Além disso, constatou que eram dependentes químicos que deveriam estar recebendo tratamento, sendo submetidos à terapia ocupacional e não à exploração de trabalho.

"As atividades terapêuticas citadas teriam como objetivo a recuperação física, mental e social, não a exploração da força de trabalho para a expansão das edificações, em verdadeira relação de emprego, de modo informal", destacou o TRT-MG.

Um dos resgatados detalhou a exploração: "Eu construí o escritório, reboquei, entijolei, coloquei o piso, fiz a rampa, banheiro (...) fiz toda a canalização de esgoto. Durante o dia eu trabalhava de pedreiro e, durante a noite, cheguei a tomar conta de vinte e oito pessoas, como monitor". O mesmo trabalhador revelou que repassava parte de seus benefícios sociais, como o Auxílio Brasil, para o "pastor", responsável pelo local.

Condições degradantes e "servidão branca"

A fiscalização classificou as condições como trabalho análogo ao de escravo por degradação, devido à vulnerabilidade dos trabalhadores e às condições do alojamento, que era coberto com telhas de zinco e exposto a baixas temperaturas. Beliches estavam em péssimo estado, e alimentos como feijão e maionese foram encontrados com o prazo de validade vencido. A água não tinha comprovação de potabilidade.

A instituição se defendeu alegando ser uma entidade sem fins lucrativos e que os homens prestavam serviços voluntários com fins profissionalizantes e terapêuticos.

O juiz Luiz Olympio Brandão Vidal, da 4ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora, rechaçou a tese de trabalho voluntário. O magistrado explicou que a relação preenchia todos os requisitos de um vínculo de emprego (pessoalidade, habitualidade e subordinação). Ele ainda destacou que a ausência de contrato com dois dos trabalhadores é indicativa de "trabalho prestado sob servidão branca".

A decisão considerou que os trabalhadores agiam em troca de moradia e alimentação, recebendo apenas um "valor simbólico", o que descaracteriza o voluntariado e evidencia a fraude à legislação trabalhista.

A sentença também estabeleceu o pagamento de R$ 50 mil por danos morais coletivos, valor a ser revertido ao Fundo de Direitos Difusos (FDD).

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