(Flávio Tavares)
Nada de pavilhões apertados, escuros e fechados. Os corredores são amplos, arejados e repletos de desenhos carinhosamente pregados na parede. No lugar das celas com piso e cama de cimento, além das grades em aço reforçado, alojamentos confortáveis com azulejo branco, janelas grandes, brinquedos e berçário.
Primeira unidade prisional do Brasil com condições dignas de receber detentas com filhos, o Centro de Referência à Gestante Privada de Liberdade, em Vespasiano, na Grande BH, atende a 54 mulheres e 30 bebês.
Conforme o Hoje em Dia vem mostrando nos últimos dias, um relatório elaborado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Sistema Carcerário apresentou 20 propostas para melhorar as condições do sistema no país. Dentre elas, a que amplia o prazo mínimo em que os filhos das presas podem permanecer nas penitenciárias, passando de seis para oito meses de idade.
Permanência
Referência nacional, a unidade mineira já ultrapassa, e muito, o novo prazo que pode começar a valer. Lá, a maioria das presas chega a partir do sétimo mês de gestação. Os bebês ficam no complexo até completarem um ano. Não raro, há casos em que o tempo de permanência é estendido, visando coincidir com a liberdade da mãe.
Andar pelos mais de 2.900 metros quadrados do centro de referência à gestante mineira mais parece um passeio por uma creche fincada em uma área rural do interior do Estado. O espaço tem dois pátios com muros pintados de rosa e fica distante do centro da cidade. A rua é estreita e o silêncio só é interrompido pelo choro das crianças.
Mas a presença constante de guardas, homens e mulheres armados por todos os cantos não deixa dúvidas de que ali existe um presídio. Local por onde convivem mulheres enquadradas em variados crimes. O tráfico de drogas aparece na ponta.
Ao lado do filho
Vera Felício Soares, de 31 anos, é uma das que cumprem pena pelo comércio ilegal de entorpecentes. Ela evita falar do passado e diz apenas que a culpa foi “de um antigo companheiro”. Prefere sorrir, toda prosa, diante do pequeno Samuel, de 7 meses.
Mãe de outro garotinho e mais duas meninas, Vera conta que, apesar da detenção, está feliz pelo momento vivido ao lado do caçula. “É a primeira vez que estou vivendo e curtindo integralmente os primeiros meses de vida de um filho. Antes, estava sempre trabalhando ou tentando arrumar um dinheiro”, diz a presa, que também trabalha na unidade fazendo móveis.
Quem aguarda, ansiosamente, por este momento é Ana Karoline. Aos 21 anos, a moça cumpre pena de 4 anos por assalto à mão armada. Grávida de nove meses, ela diz que será um menino e vai se chamar João Guilherme.
“Pelo tempo que estou aqui e o contato com as demais mulheres, fica claro que teremos todo o amparo necessário, mas é claro que eu gostaria de ter o meu filho fora da cadeia, ao lado dos meus familiares”, conta a jovem detenta, que morava em Uberaba, no Triângulo Mineiro.
Presença do filho é fundamental no processo de ressocialização
A atenção à saúde básica das presas e dos bebês é realizada na própria unidade. Há atendimento de pediatras, enfermeiros, dentistas e psicólogos. Assessoria jurídica também é oferecida. Após o período de um ano, a mãe volta ao presídio de origem para cumprir o restante da pena e a criança é encaminhada à família da detenta ou alguém indicado por ela, após aprovação de assistentes sociais.
Além da oportunidade de completar os estudos, elas trabalham na cozinha, na limpeza do espaço e numa espécie de marcenaria montada em um dos cômodos. Mãe de Davi, de 9 meses, a presa Tatiane Santos, de 24 anos, é a responsável por preparar as mamadeiras dos pequenos. Diz que não vê a hora de sair da unidade para mudar de vida. “Tenho consciência de que sempre serei uma ex-presidiária, mas não vou desistir de procurar um emprego”, afirma a mulher, que cumpre pena por tráfico.
Diretora-geral do centro, Eliane da Paixão diz que a presença dos filhos é fundamental no processo de ressocialização das internas. Segunda ela, reformas no espaço e aulas de computação estão entre as melhorias
“Temos todo o amparo, mas é claro que gostaria de ter o meu filho fora da cadeia, ao lado dos familiares” Ana Karoline, Presa por roubo
“Tenho consciência de que sempre serei uma ex-presidiária, mas não vou desistir de procurar um emprego” Tatiane Santos, Presa por tráfico
70% das detentas conseguem remissão de pena e saem do centro ao lado dos filhos