(Carlos Henrique)
Quem projeta e cuida de parques deve saber que o acesso ao lazer e à prática esportiva precisa ser facilitado a todos. Porém, pessoas com dificuldades de locomoção lamentam os obstáculos enfrentados num simples passeio pelas áreas verdes da capital.
Faltam intervenções simples, como rampas de acesso, pisos táteis e corrimões. Acompanhada de cadeirantes, a reportagem percorreu parques de BH e constatou a falta de acessibilidade em diversas atrações.
As barreiras estão presentes inclusive nas Academias da Cidade, instaladas a céu aberto pela Secretaria Municipal de Saúde. No Parque Lagoa do Nado, na Pampulha, os equipamentos de ginástica ficam em local de risco para deficientes, que relatam dificuldades.
Walker Márcio de Jesus, de 45 anos, dribla paralelepípedos e derrapa na brita para chegar à área de exercícios, que tem 12 aparelhos, montados à beira de um barranco. Três deles ele não consegue usar.
Para Walker, o piso de cimento seria o ideal, “brita não ajuda, vira barro em dia de chuva”, afirma ele, que é ex-atleta maratonista e faz questão de se manter em forma.
Zona Sul
Para quem frequenta o Parque das Mangabeiras, a situação não é diferente, avalia a presidente do Conselho Estadual dos Direitos das Pessoas com Deficiência (Conped), Kátia Ferraz. “Vou até a portaria, mas não chego lá. Não tem trilha acessível”, afirma.
Vizinha da área verde, ela aponta que os parques cerceiam a presença do público com mobilidade reduzida.
É a sensação que fica para a bancária Lecir Martins Magalhães, integrante do Conselho Municipal de Pessoas com Deficiência. De cadeira comum, explica, é impossível subir as rampas de qualquer parque da cidade. “No Mangabeiras, só vi a Praça das Águas, mais nada”.
O funcionário público Eustáquio José de Oliveira, de 50 anos, concorda com Lecir. “Os espaços de circulação estão muito aquém do que determina a norma brasileira de acessibilidade”.
Resposta
Chefe do departamento Noroeste/Pampulha da Fundação de Parque Municipais (FPM), Hebert Pessoa reconhece que o critério da acessibilidade para deficientes físicos não foi observado na academia do Lagoa do Nado. Segundo ele, a mudança dos equipamentos de lugar deve acontecer em uma semana.
A Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) é responsável por obras de acessibilidade, inclusive nos parques. O órgão não se pronunciou sobre as falhas mencionadas na reportagem.
Conselho critica falta de planejamento de gestores
Membro do Conped e diretor da Federação das Associações de Deficientes do Estado de Minas Gerais (Fademg), Eustáquio Oliveira questiona a não aplicação da Lei da Acessibilidade nos parques pela prefeitura e sugere que seja incluído no orçamento da PBH percentual destinado exclusivamente a essas ações.
No Parque das Mangabeiras, segundo ele, o cadeirante tem acesso limitado às quadras de esporte. Das quatro portarias, apenas uma tem rampa. Só parte dos banheiros é acessível. Mesmo assim, o sanitário inclusivo fica fechado e é preciso solicitar um funcionário para abri-lo.
No Espaço Esperança, dentro do parque, Oliveira só consegue chegar ao térreo se enfrentar uma rampa bem inclinada; ao piso superior, só por escada. “A vizinha Praça do Papa foi reformada duas vezes, mas também não tem rampa para cadeirante”.
Barreiras
“O poder público apenas apaga incêndio. Falta vontade política e social. Se tivesse planejamento, dava para dizer que os parques estarão acessíveis em dez ou vinte anos. Não se faz uma cidade acessível da noite para o dia”, afirma Oliveira.
Presidente do Conped, Kátia Ferraz diz que gestores têm preguiça de pensar a acessibilidade para todos. “O problema está nas barreiras de atitude, na prepotência de alguns. Seria mais simples pensar na inclusão, e não o contrário. Não basta ter gente saindo da pobreza, é preciso tirar todo mundo da exclusão social, com a igualdade de oportunidades e o fim de todas as barreiras físicas e atitudes que roubam a dignidade das pessoas com deficiência”.
Pequenas intervenções garantem conforto a todos
Professora da Faculdade de Arquitetura da UFMG, Fernanda Borges Moraes explica que a acessibilidade deve ser pensada não só para pessoas com deficiência. “Pequenas intervenções nos parques produzem conforto para todos: crianças, idosos e para quem tem alguma limitação”.
Ela aponta que o Parque Municipal tem rampas com declividade elevada. “Quem nunca quebrou uma perna não tem ideia das dificuldades de circular pela cidade”, afirma Fernanda.
No Parque das Mangabeiras, com alguma dificuldade, o cadeirante chega à Praça das Águas, mas não tem acesso ao teatro de arena. Devido a declividade, a professora da UFMG sugere que o melhor é disponibilizar veículos próprios. “O mesmo vale para o Parque Ecológico da Pampulha”.
Projetos
Fernanda alerta que até em obras novas não há a preocupação de projetos com acessibilidade. “Permanece uma situação de anticidadania. A população está envelhecendo, isso significa restrições para a mobilidade”.
O primeiro passo é ter planejamento, segundo ela, “o que o poder público não faz”. Para a professora, a reforma é sempre uma gambiarra. Elevador e plataforma são obras onerosas, mas tornar o mundo acessível, sem barreiras, no futuro, vai significar ganhos, eficiência e qualidade de vida.
Ela destaca que há várias soluções para a acessibilidade, não é só fazer rampas e banheiros com barra. “A conjugação de soluções arquitetônicas e de design a cada situação garante níveis maiores de autonomia aos deficientes”.
OLHO: “A lei exige a criação de mecanismos de acessibilidade aos prédios públicos e parques” Fernanda Borges Moraes - Arquiteta e professora da UFMG
OLHO: “No Rio de Janeiro vou de cadeira de rodas ao Cristo Redentor e à Floresta da Tijuca” Eustáquio Oliveira - Membro do Conped