(Wesley Rodrigues)
Recomendada pelo Conselho Nacional de Políticas Criminais e Penitenciárias, ligado ao Ministério da Justiça, a extinção das revistas íntimas nos presídios de todo o país não deve ser implementada a curto prazo em Minas Gerais. Considerada por especialistas em segurança pública uma medida primordial para a garantia de direitos previstos na Constituição, o fim da chamada “busca vexatória” esbarra, segundo o Estado, na questão da segurança das unidades. Dos 144 presídios mineiros, apenas cinco possuem o aparelho que escaneia todo o corpo, dispensando a revista.
O tema é polêmico, mas já há Estado adotando a medida, como São Paulo. Antes mesmo da publicação da norma do conselho no Diário Oficial da União, no início do mês, o governo paulista já havia sancionado uma lei proibindo a prática, considerada desumana e degradante.
Para Robson Sávio, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a alegação do Estado não pode ser usada como justificativa para continuar com a revista em Minas. “O governo tem que ter maneiras de garantir a segurança sem desrespeitar princípios constitucionais como a integridade e a dignidade humana. Um problema não pode legitimar o outro”, avalia.
Desde 1997, quando foi sancionada a Lei 12.492, que dispõe sobre o sistema de revista, o Estado já previa a aquisição de equipamentos eletrônicos para os presídios. Todas as penitenciárias mineiras são dotadas de detectores de metais e banquetas raio-x, mas, ainda assim, a maioria esmagadora ainda mantém a busca íntima.
“É uma questão de coerência. Se o Estado tem esses aparelhos, e faz questão de divulgar isso sempre, por que não excluir a revista? Ou o governo está mentindo ou existe uma incompetência para implementar a resolução que nada mais é do que um pedido para o cumprimento de uma garantia legal das pessoas”, afirma Sávio.
CORRUPÇÃO
A manutenção da prática que obriga o visitante a se despir, fazer agachamentos, dar saltos ou submeter-se a exames clínicos invasivos é vista mais como uma cortina de fumaça para esconder um outro problema. “É muito difícil acreditar que itens ilícitos entrem em larga escala nas penitenciárias via cavidade corporal de um cidadão. Me parece muito mais plausível pensar na relação de corrupção do sistema”, observa Guilherme Rocha de Freitas, defensor público com atuação em Ribeirão das Neves, na Grande BH, cidade mineira com maior concentração de detentos.
Seguindo essa linha de pensamento, a implantação de equipamentos que excluem a revista íntima seria, inclusive, benéfica para a segurança dos presídios. Isso porque, assim como os visitantes dos presos, os funcionários também precisariam ser submetidos ao mesmo tipo de procedimento. “É melhor culpar os agentes externos do que reformar o sistema. De qualquer forma, fica muito ruim para o Estado não cumprir a resolução, mesmo que ela não tenha poder impositivo”, argumenta Sávio.
Conforme definição do conselho, “a necessidade de prevenir crimes no sistema penitenciário não pode afastar o respeito ao Estado Democrático de Direito”.
Por meio de nota, a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) informou que “reconhece a legitimidade da proposta, mas também pondera o papel da revista íntima na manutenção da segurança nas unidades prisionais e o impedimento da entrada de materiais ilícitos”.
APREEENSÕES
Dados da Seds dão conta de que, entre janeiro e agosto deste ano, foram registradas 26 ocorrências de apreensão de celulares e 71 de drogas em presídios mineiros. Em todo o ano de 2013, foram 35 apreensões de celulares e 68 de drogas.
Parentes visitam presos após body scan
Quem já sentiu na pele as consequências de ser submetido a uma revista íntima, sabe muito bem os benefícios da exclusão dessa prática. Além de falta de respeito e de dignidade, principalmente com as mulheres, os visitantes reclamam do constrangimento do ato em si.
“É um vexame total. Além de sofrermos com a condição de nossos parentes, ainda temos que ficar peladas e expostas ao ridículo”, reclama Hengel Jenifer Rosa de Oliveira, de 19 anos.
A jovem, moradora de Três Corações, no Sul de Minas, visita o marido preso na Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem (Grande BH), duas vezes ao mês. “Com o body scan não passamos mais por este constrangimento. Até quem não vinha visitar os parentes passou a vir”, relata Hengel.
O body scan é uma espécie de cabine que permite enxergar dentro do corpo da pessoa. Em uma sala anexa, o operador da máquina visualiza a imagem gerada pelo equipamento como uma radiografia dos ossos, órgãos, objetos e contorno do corpo.
Para mulheres idosas, a mudança promovida pela adoção do uso do aparelho foi ainda mais significativa. “Eu tinha crise de choro quando vinha visitar o meu filho. Todos merecem ser tratados com dignidade”, afirma a faxineira Marlene Barboza, de 64 anos.
Com equipamento, busca vira exceção
O body scan apenas não será usado nas pessoas que estão em tratamento por radioterapia, grávidas ou portadores de marca-passo. Nesses casos, será realizada a revista tradicional, sendo que mulheres são acompanhadas por agentes do sexo feminino.
Em Minas, o aparelho está instalado em unidades da Grande BH: no Complexo Penitenciário Nelson Hungria (Contagem); nos presídios Antônio Dutra Ladeira e José Martinho Drumond (em Ribeirão das Neves) e nos presídios de Bicas I e II (em São Joaquim de Bicas).