(DIONE AFONSO/ HOJE EM DIA )
No campo, mananciais à beira de um colapso, com rios secando bem próximo às nascentes. Dentro de casa, torneiras vazias e até racionamento de água. Apontada como a pior das últimas quatro décadas, a seca extrema que deixou 170 municípios mineiros em situação de emergência não é um problema exclusivo das Gerais. Cidades do Sudeste e países como Estados Unidos, Índia e Rússia também sofreram com a falta de chuva. Os transtonos, alertam especialistas, não podem ser atribuídos apenas a ciclos naturais ou má gestão pública. A escassez hídrica é considerada um forte indício das mudanças climáticas. “Desertificação, temporais, enchentes e até tremores de terra serão cada vez mais severos devido à elevação da temperatura no planeta”, alerta o consultor internacional Milton Nogueira, especialista em desenvolvimento econômico, biodiversidade e mudanças climáticas. Nogueira participou, recentemente, da revisão do Painel Internacional de Mudança Climática (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU). O documento, lançado há uma semana, comprova a urgência no corte das emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE), responsável pelo aquecimento global, para evitar impactos ainda mais alarmantes nos próximos anos. “Tive calafrios quando estava lendo o material. A questão é planetária, não só regional. As alterações serão aceleradas e violentas”. Conforme o relatório de mais de 5 mil páginas, elaborado com a participação de mais de 800 cientistas de 80 países, a emissão do GEE aumenta significativamente, como consequência dos crescimentos econômico e da população. Para limitar os abalos, seria necessário reduzir a dispersão dos gases a quase zero até o fim deste século. Caso contrário, a temperatura e a salinização dos oceanos serão crescentes, assim como o aumento do nível do mar, provocado pelo derretimento de algumas geleiras. Nenhum lugar do mundo estaria intocável à mudança do clima. “Este novo relatório aponta, com clareza, modificações que serão impossíveis de serem controladas se nada for feito. Além disso, desta vez ficou evidente que as emissões provocadas pelo homem são as maiores da história”, reforça Nogueira. As soluções, aponta, passam pela diminuição do uso de combustíveis fósseis, principalmente o diesel, e ampliação da geração de energia por meio de fontes limpas e renováveis. “É o caso da eólica ou solar. Há alguns anos não se pensava nisso, mas temos avançado”. Segundo ele, mudanças na legislação também são importantes. O imposto sobre o uso de carbono é defendido para frear o aquecimento. “É preciso discutir bem o tema para saber qual sistema poderá ser adotado para definir o preço do imposto da poluição por dióxido de carbono. Mas essa é uma possível solução que não pode ser desconsiderada”. - Agropecuária responde por 39% das dispersões A última estimativa das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) em Minas aponta que 123 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) são dispersadas por ano na atmosfera. O Estado seria responsável por 10% do montante brasileiro. O cálculo aproximado foi fornecido pela Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam). Segundo a pasta, considerando o balanço anterior – de 2005, que resultou em uma emissão total de 124,2 milhões de toneladas – houve um decréscimo de 0,6%. O recuo perto de zero indica estabilização no Estado. O setor agropecuário mineiro contabiliza 39,3% das emissões. Em seguida, aparecem o ramo da energia, que contribui com 36%; a indústria com 15,8%; tratamento de resíduos com 6,4% e mudança de uso do solo e florestas com 2,5%. Apesar de os índices já serem considerados altos por ambientalistas e pelo próprio governo, a situação pode piorar. Será lançado no próximo dia 19 a nova estimativa de emissões do Brasil, por unidade da federação. O documento é publicado pelo Observatório do Clima, um coletivo de ONGs ligadas ao meio ambiente que estuda o tema há vários anos. Segundo o secretário executivo da entidade, Carlos Rittl, a previsão é a de que ocorra aumento das emissões em todo o país. “Não consolidamos todos os dados, mas o crescimento, infelizmente, será inevitável”, afirma Rittl, que é formado em administração pública pela Fundação Getulio Vargas e mestre e doutor em ecologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. Conforme o secretário, além de possíveis mudanças na legislação, a conscientização ainda é um dos principais obstáculos. “Tecnologias têm surgido e serão cada vez mais ampliadas. Ainda temos tempo para evitar o pior, mas a sociedade, os empresários de variados setores e os governos carecem de ações um pouco mais articuladas”, destaca. - Plano estadual será lançado em dezembro Previsto para ser lançado em dezembro, o Plano de Energia e Mudanças Climáticas de Minas Gerais é a principal aposta para reduzir as emissões de carbono e oferecer condições de adaptação a fatores extremos, como secas e inundações no Estado. O programa está sendo elaborado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). A pasta evita adiantar detalhes, mas garante que novas ações serão criadas e ampliadas as já existentes. “Há algumas vulnerabilidades que precisam ser combatidas, como no setor da agropecuária. Um dos nossos focos será conscientizar o produtor da necessidade de recuperação de áreas degradadas. É preciso que ele entenda que isso irá aumentar a produtividade dele”, frisou o gerente de energia e mudanças climáticas da Semad, Felipe Nunes.