Sinal verde para o desperdício de água em Minas

Ricardo Rodrigues - Hoje em Dia
28/02/2015 às 09:01.
Atualizado em 18/11/2021 às 06:10
 (Flávio Tavares/Hoje em Dia)

(Flávio Tavares/Hoje em Dia)

Minas Gerais é o único Estado do Sudeste que não obriga empresas a instalar sistemas de tratamento e reutilização da água usada na lavagem de veículos, equipamentos e instalações. A Lei 9.847, de 1999, que rege o setor em todo o país, não possui uma regra específica para o tema, deixando para Estados e municípios a criação de normas específicas.    Além de propiciar economia de até 80% em lava a jato, postos de combustíveis, transportadoras, locadoras e empresas de ônibus, segundo especialistas, o equipamento possibilita que a água seja usada novamente por até seis vezes.    “Em Minas e em BH não existe regulamentação sobre isso, mas os clientes e a população estão pressionando as empresas a adotarem práticas mais sustentáveis, como aproveitar a água de chuva e adotar o reúso”, afirma o advogado Bernardo Souto, membro do departamento jurídico de meio ambiente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados do Petróleo (Minaspetro).    Conforme Souto, a alternativa para os estabelecimentos que ainda não instalaram o sistema é aderir ao Programa de Recebimento e Controle de Efluentes Para Usuários Não Domésticos (Precend), implantado pela Copasa em 2003.   Dessa forma, ela cobra das empresas o lançamento dos efluentes na rede pública coletora de esgotos, de acordo com os padrões estabelecidos internamente, e os encaminha junto com o esgoto doméstico às estações de tratamento. “Tem postos que usam água subterrânea e pagam só pelo esgoto”, assinala Souto.    Entretanto, o programa é alvo de críticas do gerente de meio ambiente da Federação da Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Wagner Soares. “A nova diretoria da Copasa tem de resolver a questão do Precend. O fator que é usado (para a água pré-tratada a ser lançada na rede pública) incentiva o consumo e não a economia de água nas empresas”, destaca.    Solicitada, a Copasa não informou quanto arrecada com esse serviço, qual é a economia de água feita ao longo de um ano pelo sistema e nem quanto custa ao empresário aderir ao programa. Dentre os setores que repassam à Copasa a responsabilidade pela destinação dos efluentes estão frigoríficos, indústria de pescado, abatedouros, cozinhas industriais, empresas de bebidas, de laticínios e de produtos farmacêuticas, consultórios odontológicos, tecelagem, manutenção de máquinas, empresas de transporte, shoppings, clubes e hospitais.   Atraso   A falta de legislação sobre o tema mostra atraso em comparação a cidades menores que promulgaram leis relativas ao assunto, como Mossoró (PB), Ribeirão Preto (SP) e Fortaleza (CE). Em Limeira, interior de São Paulo, os vereadores pautaram a questão em caráter de urgência.    Com o objetivo de reduzir o desperdício de água tratada e tendo por base portarias do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), o Espírito Santo promulgou a sua lei, no rastro das legislações do Rio de Janeiro e de São Paulo.   Custo alto de instalação e manutenção espanta empresários   “Ainda não sei se economicamente é tão vantajoso. Todo dia tem de fazer a retrolavagem. E o custo desse tratamento não é pequeno”, conta o proprietário do Posto Arnaldo, no Santa Efigênia (Leste de BH), João Vitor Renault. O empresário instalou o sistema de reúso nesta semana e afirma que foi por questão de consciência ambiental. “Minha clientela é esclarecida. A conta da Copasa é de R$ 2,5 mil/mês. Vamos ver, na prática, o que isso trará de economia”, diz.   O alto custo de infraestrutura e manutenção, segundo o Minaspetro, que representa 4.139 postos no Estado, é o principal motivo para os empresários ignorarem a reutilização do recurso. “Com o circuito fechado, onde a água que sai, retorna, o sistema custa mais de R$ 50 mil. O preço da máquina chega a R$ 40 mil, sem contar a mão de obra e manutenção. Tem ainda o cuidado com parâmetros urbanísticos. Não é obra simples”, destaca o advogado do sindicato, Bernardo Souto.   Leis   No fim de 2014, foram arquivados, na Assembleia Legislativa (ALMG), o PL 5631/2014, que institui o Programa Estadual de Incentivo ao Uso de Produtos Biodegradáveis para Lavagem e Higienização a Seco em Veículos em Minas, e o PL 719/2011, que dispõe sobre a obrigatoriedade de postos de combustíveis, lava a jato, transportadoras e empresas de ônibus urbanos, intermunicipais e interestaduais instalarem os sistemas de tratamento.    Indagado sobre a importância de se impor essa obrigatoriedade especificamente na capital mineira, o vereador Ronaldo Gontijo (PPS), presidente da Comissão de Legislação e Justiça, afirmou que está “trabalhando junto à diretoria do Legislativo da Câmara Municipal para a formulação de leis que contemplem as sugestões”.    Membro das comissões de Participação Popular e de Meio Ambiente e Política Urbana, o vereador Tarcísio Caixeta (PT) não respondeu aos questionamentos feitos pelo Hoje em Dia.   Especialistas afirmam que lei deve impor reúso e tratamento do recurso natural   Estados e municípios têm de editar leis para introduzir a obrigatoriedade de reutilização da água, defende o membro da comissão de direito ambiental da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), Walter Oliveira. Ele atribui a ausência dessa legislação ao fato de a região metropolitana não ter, anteriormente, enfrentado déficit de água.    “A obrigatoriedade de tratar os efluentes deve ser incluída como lei municipal, como exigência do processo de licenciamento ambiental. Não pode flexibilizar, cabe à prefeitura impor mais rigor”, afirma o especialista.    A professora Elizabeth Ibrahim, coordenadora do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária da Faculdade Izabela Hendrix, explica que as resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) servem de parâmetro para projetos de lei em estados e municípios que, segundo ela, não levam muito em consideração os cálculos científicos de disponibilidade hídrica, de qualidade e quantidade.    “As leis mais restritivas caberiam ao Estado e é preciso uma lei específica para o município, que não pode ser simples recorte, um ‘Control C, Control V’ da lei federal”, destaca a professora.    Controle   Sem lei que trate dessa obrigatoriedade, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) informa que “esses aspectos são definidos na fase dos processos de licenciamento em forma de condicionantes”.    “Hoje existe um controle rígido com relação a estoques e linhas de transmissão do combustível. Há uma legislação ferrada para evitar contaminação”, frisa o membro do departamento jurídico do Minaspetro, Bernardo Souto.    A Semad citou, em nota, as legislações estaduais e federais que definem o licenciamento e funcionamento dos postos de gasolina, lava a jato e outros estabelecimentos que, segundo o Conama,  configuram-se como empreendimentos poluidores e geradores de acidentes ambientais.    A Secretaria Municipal de Meio Ambiente não informou o número de fiscalizações feitas e de multas aplicadas aos estabelecimentos irregulares, e nem sequer se é a responsável pela fiscalização desses estabelecimentos em Belo Horizonte. 

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