(Lucas Prates/Hoje em Dia/Arquivo)
Passados 30 dias da queda da alça Sul do viaduto Batalha dos Guararapes, que deixou dois mortos e 23 feridos na avenida Pedro I, em plena Copa do Mundo, sobram perguntas não respondidas sobre as causas e o desenrolar da tragédia. Enquanto isso, uma das principais vias da cidade permanece interditada, comerciantes do entorno contabilizam prejuízos e moradores desalojados não têm perspectiva de quando voltarão para casa.
Uma das dúvidas é o destino da alça Norte, que permanece de pé, mas sem um parecer definitivo sobre a integridade da estrutura. Enquanto um laudo da empresa responsável pela obra, a Cowan, aponta risco iminente de o restante do elevado ruir, a perícia oficial, ainda inconclusa, pede cautela, segundo o prefeito Marcio Lacerda.
Nessa sexta-feira (1º), ele deixou no ar a possibilidade de a edificação que permaneceu de pé ser recuperada. “Trabalhamos afinados com a polícia técnica para que o trânsito seja liberado e o viaduto, recuperado ou demolido após a liberação da perícia”, disse.
Há três dias, informou Lacerda, a Polícia Civil e o Ministério Público (MP) pediram o adiamento da destruição da alça Norte, para checar elementos que possam ajudar a compor o laudo da parte da estrutura que veio ao chão.
Outra questão não esclarecida se refere ao tempo necessário para concluir a perícia oficial. As escavações em volta do pilar central, iniciadas nessa sexta, indicarão o processo construtivo do viaduto. Só em 30 dias é que os trabalhos serão finalizados. A perspectiva mais animadora é a de que o resultado seja conhecido só no próximo mês, mas a Polícia Civil não confirma, alegando complexidade nas investigações.
Por causa disso, a corporação pedirá à Justiça, na segunda-feira, a dilatação do prazo para conclusão do inquérito. “Além de descobrirmos as causas do acidente, trabalhamos com a responsabilização criminal”, frisou o diretor do Instituto de Criminalística, Marco Antônio Paiva, ao se referir a dois homicídios e 23 lesões corporais.
Em meio à falta de respostas sobre o desabamento surgem divergências entre familiares das vítimas e responsáveis pela obra. Se por um lado os parentes de Charlys Frederico Moreira do Nascimento, de 25 anos – um dos mortos –, garantem não ter recebido assistência adequada, por outro a Cowan afirma prestar auxílio. “Da construtora, só recebemos R$ 600 para custeio do sepultamento dele”, contou Maurício Fernandes, tio do rapaz.
Já a família da motorista Hanna Cristina Santos, de 24 anos, outra vítima da tragédia, contratou advogados para tentar receber um novo ônibus dos responsáveis pela obra. O veículo que era o sustento da família ficou destruído. Enquanto a situação não é resolvida, parentes se reúnem neste sábado (2) para comemorar o aniversário da filha da jovem, que completará 6 anos na quinta-feira.
Queda no movimento leva comerciantes a demitir
A interdição de dez quarteirões da avenida Pedro I e os desvios no trânsito que impedem o acesso à via resultam em prejuízos para comerciantes da região. Alguns calculam redução de quase 100% no faturamento, e as demissões de funcionários começam a acontecer.
Gerente de uma loja de vidros para carros na Pedro I, Ronan de Oliveira Souza viu o movimento diminuir 95%. “Como consertamos para-brisas no pátio da empresa, os veículos não chegam por causa da interdição. Vamos tentar isenção em impostos para compensar as perdas”, disse. Se nada for feito em 30 dias, afirma ele, a solução é demitir funcionários.
Para pedir ressarcimento na Justiça, no entanto, o presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Bruno Burgarelli, afirma ser necessário comprovar os prejuízos.
Para quem já demitiu 17 dos 19 empregados desde o início das obras do viaduto Batalha dos Guararapes, parte deles após a queda do elevado, o jeito é buscar alternativas para conseguir se manter. É o caso de Matusalém Gonzaga, proprietário de um restaurante na avenida General Olímpio Mourão Filho, no Planalto. Toda quarta-feira, ele cozinha em um restaurante no Lourdes, zona Sul da capital, e tem a renda revertida para a manutenção do seu próprio negócio.
Como vice-presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Matusalém acredita ser viável criar eventos para atrair o público até os restaurantes e bares da região afetada pelo desabamento.
SOLUÇÕES
Na última semana, foi formada uma comissão de comerciantes, que tem a Secretaria Municipal de Desenvolvimento como interlocutora, para dialogar com o poder público em busca de soluções.
As reivindicações serão entregues ao secretário Marcelo de Souza e Silva, na próxima terça-feira. “Vamos entender o que eles precisam e articular com os órgãos competentes respostas rápidas”, afirma o gestor.
Famílias resistem a hospedagem em hotel
A agonia de não saber quando poderá voltar para casa e um pedido carinhoso feito pela filha de 9 anos levaram Luís Fabian Aguiar Patzi, de 34, a reavaliar a decisão de permanecer fora de casa, vivendo em um hotel. Eles fazem parte de uma das 20 famílias removidas, por precaução, dos condomínios vizinhos ao viaduto.
Após quatro dias hospedados em um hotel pago pela Cowan, o supervisor de logística, a mulher e as duas crianças retornaram para o imóvel na última quinta-feira. “Minha filha disse para voltarmos, que ela confiava em mim. Esse foi o ultimato. É complicado deixar um espaço de 63 metros quadrados e passar a morar em um quarto”, disse Luís. Novamente em casa, no entanto, a família não se sente segura.
MELHOR EM CASA
Vinte proprietários de apartamentos, com receio de que aconteça o pior, decidiram ir para o hotel. Porém, 14 famílias preferiram não sair de suas moradias. Apesar de a Defesa Civil confirmar que, do número removido, apenas um imóvel voltou a ficar ocupado, a advogada dos moradores, Ana Cristina Drumond, disse que outras pessoas pensam em retornar.
“Vou ficar no hotel até que a situação se resolva. A estadia está prevista para até o dia 27, mas pode ser que ela se estenda”, diz a moradora Glaucilene Moreira. Ela passa boa parte do dia no apartamento, no condomínio Antares, cuidando dos animais que tem. “Se fico sozinha, logo lembro dos gritos dos feridos no ônibus”, conta.