Usuários de coletivo em Minas arcam com o ônus do vandalismo

Alessandra Mendes/Sara Lira/Letícia Alves - Hoje Em Dia
03/10/2014 às 08:17.
Atualizado em 18/11/2021 às 04:27
 (FLÁVIO TAVARES / ARQUIVO)

(FLÁVIO TAVARES / ARQUIVO)

As ações de vandalismo no transporte público em Minas têm causado rombos milionários. Os prejuízos com ônibus depredados, objetos furtados e pichações em estações do Move, além de abrigos para passageiros destruídos, muitas vezes acabam sendo pagos pelos próprios usuários.    Só para se ter uma ideia, mais de 40 ônibus são depredados todos os meses em Minas, sendo uma média de 18 apenas em Belo Horizonte. Os veículos são alvos de todo o tipo de vandalismo, como pichações, ataques com pedras e incêndios criminosos. Entre agosto de 2013 e agosto deste ano foram 569 ocorrências deste tipo em todo o Estado. Na capital, foram 232 casos no mesmo período, de acordo com a Secretaria de Estado da Defesa Social (Seds).   Um problema que gera prejuízos não apenas para as empresas, mas também para o usuário de transporte coletivo. “Muita gente não tem consciência, mas, na prática, é o passageiro que paga esta conta da depredação.    Esse valor está embutido nas altas tarifas cobradas. O empresário mantém o seu lucro e nós arcamos com os gastos”, afirmou a diretora da Associação dos Usuários de Transporte Coletivo de Belo Horizonte e Região Metropolitana (AUTC), Gislene Gonçalves dos Reis.   A própria BHTrans reconhece que o vandalismo provoca aumento nos custos das concessionárias, que podem repassar esse índice para o consumidor. Segundo a empresa, “os custos operacionais, assim como as receitas e os investimentos envolvidos na operação do sistema de transportes fazem parte do fluxo de caixa previstos nos contratos de concessão que resultam na taxa interna de retorno (TIR) estipulados nos referidos contratos”.   Embora a BHTrans confirme o contrário, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra-BH) alega que o gasto com a recuperação de veículos depredados não consta na planilha de composição de custo tarifário. Em nota, o sindicato informou que “os prejuízos são integralmente absorvidos pelas empresas, que, por exigências operacionais, mantêm veículos reservas para a imediata substituição de veículos sinistrados, avariados ou que demandem manutenção preventiva”.   Além da questão financeira, o passageiro ainda é penalizado com a diminuição no número de ônibus por causa do vandalismo. Dependendo da quantidade de ocorrências e da extensão do estrago, pode ocorrer a inviabilidade de substituição de veículos no prazo necessário para manter o nível de qualidade exigido para prestação do serviço aos usuários.    “A frota atual já é pequena para atender a demanda e a situação fica ainda mais crítica quando isso acontece. É a ação de alguns que prejudica a vida de todo mundo”, avalia Gislene. Um problema registrado com maior frequência após partidas de futebol. De acordo com a BHTrans, nesses casos, dependendo do grau de vandalismo, a paralisação do veículo para reparos pode exigir dias subsequentes aos jogos.   A queda na qualidade dos serviços prestados aos usuários pela utilização de veículos reservas para substituição daqueles depredados, também é reconhecida pelo Setra-BH. O sindicato não soube informar o valor estimado do prejuízo causado pelo problema na capital mineira.     Nas estações do Move, pichações e furtos de fechaduras e tampas de vasos sanitários    As estações do Move já sofrem com as depredações, que vão desde pichações, furto de fechaduras de portas e tampas de vasos quebradas ou retiradas. Em muitos casos também são levadas as papeleiras, saboneteiras, válvulas de descarga e até as louças do banheiro. A fiscalização insuficiente leva à impunidade dos vândalos.    Na plataforma Pampulha, as fechaduras das portas do banheiro não existem mais, bem como as tampas dos vasos sanitários, que foram quebradas. As válvulas das torneiras foram arrancadas. Segundo um funcionário do local, que não quis se identificar, o problema vem ocorrendo desde a inauguração do terminal, há cinco meses. “Não há quem fiscalize isso”.   A parede de uma das escadas está completamente pichada e com marcas de calçados. Os pisos táteis começaram a soltar e alguns pontos e os degraus das escadas foram quebrados.   Nessa quinta-feira (2), na estação São Gabriel, em operação desde abril, um dos banheiros femininos estava fechado devido ao furto da válvula da descarga. Para controlar a entrada nos banheiros das estações, a BHTrans começou a cobrar R$ 0,50. A verba será será usada na manutenção dos espaços.   O vandalismo tem causado revolta em quem depende do transporte coletivo.“Para que pagamos impostos? A obra é feita e as pessoas quebram, mas o dinheiro para reparar os danos também sai do nosso bolso”, desabafou o vendedor Victor Abreu,de 27 anos.    Nas estações da avenida Antônio Carlos, as portas automáticas, que só deveriam abrir quando o ônibus chega ao local, ficam abertas o tempo todo. Alguns pessoas chegam a colocar a cabeça para fora, aumentando o risco de acidente. “Outras aproveitam para ter acesso à estação sem pagar a tarifa”, afirmou a farmacêutica Priscila Oliveira, 27 anos.    De acordo com a BHTrans, a responsabilidade pela manutenção dos ônibus é do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte. A reportagem tentou entrar em contato com a assessoria de imprensa do órgão, mas as ligações não foram atendidas.   Em relação às pichações, furtos e depredações, a BHTrans informou que são casos de segurança pública e que aciona a Polícia Militar para atender às solicitações, mas não detalhou como é feita a vigilância para coibir esse tipo de crime.   Informou ainda que a cobrança pelo uso do banheiro “não está relacionada a depredações”.   Por ano, reparo em abrigo de ônibus custa R$ 3,6 mi   Reparos em abrigos de ônibus destruídos por atos de vandalismo, desgastes e batidas de veículos na capital mineira custam, por ano, cerca de R$ 3,6 milhões aos cofres públicos. A média é de 20 unidades danificadas por mês, gerando um custo de manutenção em torno de R$ 300 mil. Em toda a cidade estão instalados 2.300 abrigos – 480 deles na área central.   Atualmente, os reparos são pontuais, de acordo com a BHTrans. Com o fim do contrato com a empresa responsável pelo serviço, uma nova licitação foi aberta no primeiro semestre deste ano. No entanto, não há previsão de finalização do certame.   Na opinião de Gislene Gonçalves dos Reis, diretora de comunicação da Associação de Usuários do Transporte Coletivo da Grande Belo Horizonte, a depredação dos pontos de ônibus acontece porque as pessoas estão revoltadas com a ineficiência do serviço oferecido. “Atrasos e superlotação indignam os usuários. Porém, não se resolve um problema criando outro. Quem paga o prejuízo somos nós”.    O período da noite é o preferido pelos vândalos para agirem. “É quando o policiamento diminui. Eles picham, quebram tampos e as coberturas de acrílicos. Muitas vezes, quem estraga reclama depois na associação”, frisa Gislene.   A proteção dos espaços públicos, incluindo os abrigos de ônibus, é de responsabilidade da Guarda Municipal, que conta com 2.200 homens para as rondas. Em caso de ocorrência, o agente aciona a Polícia Militar.   Se o valor gasto com a manutenção hoje é considerado alto, antes o custo era bem maior: R$ 500 mil por mês. A redução foi possível porque houve troca no tipo de material usado na confecção dos abrigos. Muitas chapas metálicas, alvo dos vândalos para venda em ferro-velho, foram substituídas por material do tipo policarbonato.   Especialistas afirmam que a depredação do espaço público está ligada ao tipo de relação que as pessoas mantém com o Estado. “A motivação é a profunda insatisfação com os serviços públicos”, explica o sociólogo Rudá Ricci.

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