MP 927 caduca e deixa polêmica: expiração de regras trabalhistas alteradas cria insegurança jurídica

Evaldo Magalhães
efonseca@hojeemdia.com.br
21/07/2020 às 20:33.
Atualizado em 27/10/2021 às 04:05
 (Marcello Casal Jr/Agencia Brasil)

(Marcello Casal Jr/Agencia Brasil)

Primeira a entrar em vigor no país para tentar conter os impactos da pandemia da Covid-19 sobre a economia e os empregos, em 19 de março, a Medida Provisória 927 perdeu validade na segunda-feira. 

A relação de normas que flexibilizaram a legislação trabalhista caducou sem dar origem a uma lei, como ocorreu com a MP 936 (a das suspensões de contratos e reduções salariais). O motivo: o Congresso não chegou a um acordo sobre a matéria, considerada por parlamentares de oposição como uma “nova reforma trabalhista”. 

Fato é que a expiração da MP 927, que permitiu a empregadores negociar temas variados diretamente com os funcionários, sem mediação de sindicatos – do uso de bancos de horas à antecipação de férias e feriados –, trouxe polêmicas. 

Uma delas diz respeito ao teletrabalho, cujas condições, a serem firmadas a partir da última segunda-feira, voltaram a ter de ser definidas por meio de acordos entre patrões e empregados–- e não mais com a possibilidade de definição unilateral dos empregadores, como autorizou a MP.

“Durante a pandemia, com amparo na MP, foi dada ao empregador a possibilidade de determinar a realização do teletrabalho, independentemente de acordo escrito com os empregados”, disse o advogado trabalhista Vitor Oliveira. “Para evitar a insegurança jurídica após a MP caducar, eu aconselharia agora que patrões e empregados colocassem tudo no papel”, acrescentou.

Já para o também advogado trabalhista Clayton Alves não haveria tal necessidade, na medida em que todas ações estabelecidas sob a permissão e a vigência da MPs eriam consideradas “atos jurídicos perfeitos”, afastando a necessidade de modificações. “Pelo menos enquanto durar o estado de calamidade pública, conforme previsto na MP, o que foi definido com base nela continua valendo”, disse, lembrando que tal prazo de validade seria o final de dezembro deste ano.

Presidente do Instituto Doméstica Legal, o advogado Mario Avelino também entende que, assim como no caso do teletrabalho, todos os acordos realizados no período de vigência da MP seguem válidos. “Isso engloba, por exemplo, as antecipações de férias já concedidas, com a opção do empregador pagar 1/3 até 20 de dezembro deste ano; o adiamento do recolhimento do FGTS de março, abril e maio, que poderá ser feito de julho a dezembro, para quem optou; e as licenças acordadas para serem compensadas em futuros feriados”, ressaltou.

União teria deixado de pagar R$ 330 mi em salário família

O governo federal teria deixado de pagar R$ 330 milhões em “salário família” a cerca de 1,8 milhão de trabalhadores com filhos de até 14 anos. Eles tiveram contratos suspensos por dois meses por causa da pandemia, entre abril e junho, conforme permitido pela MP 936. 

A estimativa é do Instituto Doméstica Legal, para o qual, com a possibilidade de prorrogação das suspensões contratuais por mais 60 dias no país – autorizada por decreto –, o montante pode passar de R$ 730 milhões.

“Esperava-se que o governo, ao liberar o benefício emergencial aos trabalhadores com contratos suspensos temporariamente, pagaria junto as cotas do salário família, de R$ 48 reais por filho, mas isso não aconteceu”, afirma Mário Avelino, presidente do Instituto.

“Esse pagamento também não foi realizado pelas empresas ou pelos empregadores domésticos, e os trabalhadores estão aguardando até o momento algo que é um direito previdenciário”, completou.

Avelino defende que o governo corrija a falha nos próximos meses, com a prorrogação de mais 60 dias para as suspensões. “Para os valores não pagos de abril a junho, o ideal seria que se fizesse um pagamento complementar do benefício emergencial”, afirma.

 SAIBA MAIS

 Trabalhadores que foram para o home office na pandemia podem continuar atuando assim?
Teoricamente, sim, já que decisões sob a vigência da MP 927 são consideradas “atos jurídicos perfeitos” e valeriam até o fim do período de calamidade pública. 
Mas o tema não poderia gerar ações trabalhistas?
Para evitar insegurança jurídica, advogados recomendam que empregadores façam acordos com os empregados, com regras para o teletrabalho, válidos a partir de segunda-feira (20/7).
Que situações permitidas pela MP não podem ser adotadas de agora em diante?
O teletrabalho sem acordos e a atuação de aprendizes e estagiários no regime remoto.
Com a MP 927, acordos individuais teriam preponderância sobre os coletivos. Como fica essa situação?
Sim, o acordo coletivo volta a ter mais peso e passa a ser necessária intermediação de sindicatos para alterar regras da MP, fazendo com que voltem a seguir a CLT.
E as férias dos trabalhadores?
As individuais voltam a ter de ser avisadas 30 dias antes e as coletivas, 15 dias antes (não 48 horas). Não se pode mais antecipar férias para quem não completou 12 meses no serviço. Também proibe-se o adiamento do pagamento do adicional de 1/3 de férias e do abono pecuniário.

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