Nem mesmo os executivos da indústria automotiva defendem um repeteco do programa de desoneração da produção e de incentivo ao crédito que salvou o setor, e de resto toda a economia, de cair no buraco negro no auge da crise financeira internacional, em 2009.
Ontem, perguntei ao presidente para a América Latina da Fiat Chrysler Automobiles (FCA), Stefan Ketter, se ele era favorável a uma reedição do programa, ou de medidas de cunho semelhante. Ele fez uma longa defesa da importância da cadeia automotiva, de sua capilaridade por toda a economia, e de seu peso na geração de riqueza. “É o grande motor do crescimento”, afirmou. Mas não foi enfático na defesa da desoneração. Pelo contrário, disse que “se o sistema tributário fosse avançado, não iria requerer medidas (pontuais de desoneração)”.
Sinceramente, não entendo a lógica de não se reeditar políticas que já mostraram sua eficiência no passado recente. A não ser a opção ideológica da atual equipe econômica em sua iniciativa de controle das contas públicas por meio de políticas recessivas. O resultado, já comprovado desde o início do ano passado, é que a arrecadação cai em velocidade muito superior ao do corte de gastos, fazendo o déficit e a dívida pública explodir.
Investimentos
Em 2009, tivemos uma conjugação positiva de investimentos do governo em infraestrutura com políticas de desoneração tributária de cadeias estruturadoras da economia e incentivo ao crédito. A receita era lógica. Blindar a economia brasileira contra a crise mundial por meio do consumo interno e de grandes obras.
Hoje, o governo faz o contrário. Cortou todas isenções, elevou impostos e reduziu os investimentos ao mínimo possível. O programa Crescer, de concessões e privatizações, anunciado com pompa pelo presidente Temer no início da semana, é tímido e só apresentará os primeiros reflexos positivos para a economia (não digo para o caixa do governo, com o pagamento de outorgas por concessões) a partir de 2018.
Infraestrutura é importante, mas consumo interno também. E a ousadia de promovê-los deve ser equivalente ao tamanho do desafio. Se enfrentamos atualmente a maior recessão da história econômica recente do país, precisaríamos de radicalidade no corte dos juros (na taxa básica e nos juros do varejo, utilizando para tal o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal), na desvalorização cambial, nos investimentos diretos em infraestrutura e na desoneração de cadeias estruturantes e no incentivo ao crédito. Os setores da construção civil e pesada e automotivo respondem muito rapidamente e disseminam seus bons fluidos na economia quando devidamente incentivados.
Tributação
Concordo com Ketter que o país precisa de um novo modelo de tributação, mais avançado, e com regras mais estáveis. E é claro que medidas anticíclicas não podem e não devem se perpetuar indefinidamente. Mas elas existem como mecanismo para estancar a crise. Para forçar a inversão da curva de queda da economia.
O contrário é insistir no ajuste fiscal no pior momento da recessão. Isso significa contribuir para a desaceleração da economia e para o mergulho na crise. A Europa precisou de seis anos de recessão para descobrir esse erro fundamental. Será que também nós precisaremos de um sofrimento tão prolongado?