(Hoje em Dia)
Na infância, quando batia bola nos campos de terra de Ribeirão Preto (SP), o goleiro Diego Alves não imaginava que um dia se tornaria carrasco dos principais craques do futebol mundial. Hoje, aos 30 anos, o camisa 1 do Valência-ESP é um dos principais da posição na Europa e ostenta o posto de maior pegador de pênaltis do Campeonato Espanhol. Das 35 cobranças das quais participou, desde que chegou ao país em 2007, Diego conseguiu defender 16 delas; Messi e Cristiano Ronaldo, os dois melhores do mundo na atualidade, encabeçam a lista de ‘vítimas’ do brasileiro. Há quase seis meses longe dos gramados – devido a uma lesão no joelho direito –, Diego se recupera bem e espera estar 100% no início do ano que vem. Em entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, o pai de Luca, 4 anos, e Davi, 2, conta como tem sido a recuperação da cirurgia, relembra os tempos de Atlético, fala de Seleção Brasileira e revela os planos para o futuro.
É raro vermos um goleiro ficar tanto tempo sem poder jogar por conta de lesão. Como tem lidado psicologicamente com isso?
Foi minha primeira lesão séria. É uma das mais graves do futebol, que precisa de mais tempo para se recuperar. Nunca pensei ficar parado tanto tempo. É difícil nesta parte, mas encarei bem, como um outro desafio. Os dois primeiros meses foram os piores, porque eu não podia andar. Agora estou fazendo trabalhos na academia e isso dá motivação para voltar.
E a vida na Espanha? O que você e sua família costumam fazer nos momentos de lazer?
Estou há oito anos aqui e sou praticamente espanhol. Gosto da cultura espanhola. Conheço a cidade e a cultura , e estou bem adaptado. Valência faz muito calor, mesmo no inverno. Gosto de ficar em casa e quando estou de folga fico com meus filhos. Nós também passeamos pela cidade e viajamos quando dá.
Você ficou 679 minutos sem levar gols pelo Almería, em 2007/2008. Foi o que fez você ser reconhecido pelos grandes da Espanha?
Ajudou. Foi na minha primeira temporada. As coisas aconteceram rapidamente para mim. Fizemos uma temporada sensacional nesse ano e quase entramos na Europa League. A regularidade durante as temporadas fez com que os times me conhecessem mais. Fui o primeiro goleiro brasileiro a jogar na Liga.
Você foi sondado pelo Milan, antes de transferir-se para o Valência. Como foi aquele período de transição?
Na época do Almería, eu vivi um momento muito bom e a cada semana me colocavam em um time e, às vezes, eu nem sabia. Às vezes chegava no treinamento e os jogadores me davam parabéns, porque o jornal me colocava no Real Madrid. Mas tudo isso era reflexo do trabalho.
Você defendeu 16 dos 35 pênaltis que enfrentou no futebol europeu. Este ótimo rendimento rendeu fama a você no quesito. Qual é o segredo para defender tantas cobranças?
A cada entrevista que dou aqui, três ou quatro perguntas são sobre isso. Não tem estudo; é uma característica minha. Tenho sorte também. Confio na minha intuição e isso é importante na hora do pênalti. São vários fatores que influenciam. Tem um estudo, mas o jogador pode chutar em qualquer lado. O gol é enorme e é muito difícil de o goleiro defender.
Nem Lionel Messi e Cristiano Ronaldo escaparam de você, já que defendeu pênaltis cobrados por eles. Tem um gostinho diferente pará-los?
Na verdade é mais importante para a imprensa e para as pessoas. Quando Messi e Cristiano Ronaldo perdem um pênalti, a repercussão é mundial. Pra mim, o pênalti importante é aquele que garante a vitória do meu time.
Aliás, craques não faltam como adversários. Como é entrar em campo e ter que enfrentar Cristiano Ronaldo, Messi, Neymar e tantas outras feras? Sente alguma pressão?
Eu sempre fui um cara tranquilo. Já estou acostumado. No primeiro ano que sentia mais (nervoso). Há oito anos jogo contra eles e vira uma coisa normal. Sempre foi motivo de orgulho para mim. Desfruto bastante jogando conta esses craques. Em Ribeirão Preto, nos campos de terra, eu não imaginava estar aqui.
Alguns analistas dizem que você tem um estilo parecido ao de Taffarel, atual treinador de goleiros da Seleção. Se vê na briga pela camisa 1? Tem conversado com ele?
Ele sempre foi o meu ídolo e referência. Sempre tenho contato com o pessoal da Seleção. Foi uma pena a lesão chegar antes da Copa América. Sempre me ligam e isso me dá forças para seguir. Brigar pela camisa 1 depende da minha recuperação. Meu objetivo é voltar. Ficou um gostinho de estar naquele ambiente novamente.
Você chegou ao Atlético em 2004, vindo do Botafogo-SP. Em 2005, viveu de perto o rebaixamento do clube e foi criticado após falhar na derrota para o Fortaleza, no Mineirão. Aquela partida foi um divisor de águas na sua carreira?
A primeira partida que atuei depois deste jogo foi o divisor de águas. Passando o que passei no Atlético, me fez ter esta personalidade. Me deu muita bagagem. Todo mundo começa com alegrias e conquistas na carreira, e eu fui o contrário, comecei do fundo do poço. Foi importante e muito bom ter passado por isso, porque comecei a dar valor para o que eu queria. Talvez ,se eu não tivesse passado por tudo aquilo, não estaria aqui.
Em 2006, durante a Série B, uma coruja sobre o travessão virou uma espécie de amuleto para você. Fale sobre ela.
Essa coruja ficou famosa. Sempre fica lá, no meu gol. Na minha casa em Ribeirão Preto tem uma coruja que fica lá. Sempre brinco com a minha família, perguntando se é a mesma. É uma coincidência legal.
O que o Atlético representa na sua vida?
É um time que tenho um carinho muito grande. Aprendi bastante com tudo que vivi lá. A melhor escola que eu tive. Eu vivi no Atlético numa época muito difícil. É o time que mais gosto no Brasil.
Como viu, à distância, todos os acontecimentos envolvendo o goleiro Bruno em 2010? O que sente ao saber que um colega de clube está preso condenado por um crime horrível como aquele?
É triste. A gente conviveu bastante tempo. Como profissional, o Bruno foi um dos melhores goleiros que eu competi para a posição. Tinha qualidades fora do normal, com certeza seria um goleiro de Seleção Brasileiro e poderia jogar aqui na Europa. Cada um tem o controle da sua vida e aconteceu este episódio que todo mundo ficou muito triste. Marcou a vida de todos os brasileiros isso.
Aliás, Bruno e você tiveram algumas rusgas no passado, já que ele não via você como o sucessor natural dele. Como foi isso?
Dividimos muitos aprendizados. Em nenhum momento tivemos discussões. Pode ser que ele teve esta opinião, numa entrevista, mas não levei para o lado de desaforo.
Pensa em voltar a jogar no Brasil? Se sim, quando?
Não tenho este pensamento. Já me adaptei à Europa. Nunca vou falar nunca, mas de momento é o que quero. Demorei para construir a imagem que tenho aqui e com certeza tenho mercado para permanecer por muito tempo. Acabei de renovar com o Valência por mais cinco anos e acho que devo terminar minha vida profissional por aqui (na Europa). Vamos ver o que vai acontecer.