O ambulatório de um hospital para tratamento quimioterápico não é certamente o melhor lugar para se escrever um livro, mas foi lá que o escritor norte-americano Will Schwalbe concebeu O Clube do Livro do Fim da Vida, best-seller que, no ano passado, liderou por semanas a lista dos mais vendidos do jornal The New York Times. Lançado agora no Brasil pela editora Objetiva, nele Schwalbe relata as conversas que teve com a mãe na sala de espera do Memorial Sloan-Kettering, em Nova York, um edifício preto na esquina da rua 53 com a Terceira Avenida cuja arquitetura já deprime por sua frieza de aço e vidro. Lá dentro, porém, Schwalbe e sua mãe Mary Anne, que ficou conhecida por ajudar refugiados de todo o mundo, esquentavam o ambiente com calorosas conversas sobre literatura.
Na antessala das sessões de quimioterapia, mesmo debilitada, ela não falava sobre sua doença, mas daquilo que mais gostava: literatura. Schwalbe até evitava perguntar o que estava lendo, pois, para sua frustração, Mary Anne já começava contando o fim da história. Para um escritor e também editor de livros, isso era duplamente decepcionante, mas o incontido entusiasmo da mãe tinha uma razão: a doença avançava rapidamente e ela queria transmitir a Schwalbe sua experiência pessoal de ler em estado de emergência. Foram dois anos de luta contra o câncer pancreático, até a morte de Mary Anne, aos 75 anos, em 2009.
Dividir com outra pessoa - mesmo que seja o filho - o sentimento da morte próxima é quase impossível, mas a literatura opera milagres. Mary Anne, que em 2007 havia sido diagnosticada com a doença, fez de tudo para que Schwalbe lesse Crossing to Safety (Para um Lugar Seguro, 1987), do prêmio Pulitzer Wallace Stegner (1909-1993), quando a quimioterapia começou. O escritor fala com entusiasmo do clássico moderno de Stegner na entrevista que concedeu à reportagem, por telefone, de Nova York. "Stegner conta a vida de dois casais muito amigos que enfrentam juntos desde a Depressão americana até a doença de Chariy, consumida pelo câncer", resume Schwalbe, revelando que ele se tornou o livro favorito da mãe, para quem a palavra mais sagrada era solidariedade.
Os afegãos, entre outros povos, sabem que essa mesma palavra conduziu Mary Anne Schwalbe aos lugares mais remotos e perigosos do planeta, sempre buscando ajudar pessoas à beira do desespero. Foi no Afeganistão que ela deixou plantada a semente de um centro cultural na Universidade de Cabul e de várias bibliotecas circulantes. Graças ao empenho do filho, que conseguiu levantar fundos para a sua construção, o centro está funcionando há dois meses. Também as bibliotecas já fazem circular os livros por 200 vilas em 34 províncias do Afeganistão, onde Mary Anne chegou a ser ferida na guerra.
A mãe do escritor criou várias associações de refugiados nos países em que esteve - e ela visitou a Bósnia e o Sudão nos longos períodos de crise. Educadora, ela fez parte do comitê de seleção dos candidatos a Harvard. Presbiteriana, exerceu sua influência materna para tentar converter o filho ateu. "Foi a única coisa que não conseguiu de mim", diz Schwalbe, que, entretanto, foi obrigado pela mãe, na infância, a escolher uma igreja para ter aulas de catecismo.
O CLUBE DO LIVRO DO FIM DA VIDA - Tradução: Rafael Mantovani. Editora: Objetiva (296 págs., R$ 37,90).
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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