O justo para a Samarco

05/05/2016 às 06:00.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:16

Já dediquei algumas colunas ao acordo de indenização fechado pela Samarco com os governos federal e de Minas Gerais e do Espírito Santo. Volto ao tema em função da não concordância do Ministério Público Federal com os termos do acordo. O MPF deu entrada em ação que exige pagamento de R$ 155 bilhões e a responsabilização, além da mineradora, da União e dos dois governos estaduais. Vamos avaliar se é este um montante justo.

Primeiramente, vamos lembrar o que prevê o acordo em vigência. A Samarco desembolsará neste ano R$ 2 bilhões em programas e ações de recuperação. Em 2017 e 2018, os valores caem para R$ 1,2 bilhão ao ano. Portanto, o desembolso será de R$ 4,4 bilhões nos três primeiros anos. Teremos, então, mais três anos de investimentos em projetos de recuperação, mas com valores reduzidos para entre R$ 800 milhões e R$ 1,6 bilhão anuais entre 2019 e 2021.

A partir de então, encerram-se as ações de recuperação propriamente ditas, sendo mantidas unicamente ações compensatórias, nas quais serão investidos R$ 240 milhões por ano durante nove anos (até 2030). Além dos valores relacionados acima, foi acordado que outros R$ 500 milhões serão disponibilizados para as prefeituras impactadas até o final de 2018, para financiar obras de saneamento básico.

Feitas as contas, pelo acordo fechado a Samarco pagará em indenizações um mínimo de R$ 9,460 bilhões e um máximo de R$ 11,860 bilhões ao longo de 14 anos. A média anual de desembolsos será, portanto, de R$ 676 milhões no mínimo, e de R$ 847 no máximo. Pois bem. Em outras colunas já lembrei que o lucro da Samarco em 2014, quando os preços do minério no mercado internacional batiam no fundo do poço, foi de R$ 2,805 bilhões. Esse lucro é quatro vezes maior que a média mínima de desembolsos anuais previstos, e três vezes maior que a média máxima.

O que isso significa? Que a empresa, se conseguir voltar rapidamente a operar, não só conseguirá pagar a indenização acordada como continuará gerando grandes lucros para seus sócios controladores, as gigantes mundiais Vale e BHP Billiton. O que defendi nas colunas passadas é que um acordo que não penalize financeiramente os sócios controladores, que são corresponsáveis pelo acidente, não é justo.

E os R$ 155 bilhões exigidos pelo Ministério Público? Seriam justos? Se formos olhar para os resultados do ano passado, um ano atípico, no qual os preços do minério de ferro nunca estiveram tão baixos, tenderíamos a concordar que as controladoras da Samarco não suportariam o baque. No ano passado, a Vale acumulou prejuízo de R$ 44,2 bilhões, o maior já registrado por uma companhia aberta brasileira. Já o lucro da BHP Billiton foi de minguados US$ 1,91 bilhão.

Mas não é o lucro o melhor indicador de capacidade de pagamento, já que no ano passado ele ficou contaminado pelo péssimo desempenho dos preços. Vamos, então, à geração de caixa. Essa foi de R$ 23,654 bilhões na Vale em 2015.

Então, se dividirmos os R$ 155 bilhões pedidos pelo MPF por dois (a serem pagos por Vale e BHP Billiton), e dermos um prazo de pagamento de 14 anos (que é o prazo que consta do acordo vigente), teríamos um dispêndio anual de R$ 5,535 bilhões para cada uma delas. Montante corresponde a 23,4% da geração de caixa da Vale em 2015, que foi um ano ruim.

Então! Já não parece que o valor pedido pelo MPF é um pouco mais factível? Pode, ainda assim, ser muito, já que a geração de caixa da Vale está em boa medida comprometida com o pagamento de dívidas antigas. Mas, insisto, é essa capacidade de pagamento da Vale e da BHP Billiton que deve ser discutida para se estabelecer a indenização. O resto é chute.

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