Sempre que faço a pergunta aos meus alunos fico incomodado com o silêncio que se segue.
Insisto: quem é o dono da rua? Recebo as primeiras respostas protocolares: o Município! Outro diz: o Poder Público. Raramente alguém se arrisca com um: todo mundo! Apesar de esta ser a resposta mais próxima do adequado.
É que no Brasil é praxe tratar a coisa pública como coisa de ninguém, ao invés de reconhecer que os bens públicos pertencem a todos nós, especialmente os de uso comum do povo, como parques, praças e ruas.
Pode parecer que não há grande diferença, mas isso apenas confirma como estamos acostumados e até um pouco anestesiados com o fato de termos os nossos direitos violados sem protesto, sem reclamação, sem revide.
Se a praça é de todo mundo, como alguém pode morar nela? Se a calçada é de todos, como um camelô pode vender seus produtos ali? Se a rua é pública, que direito tem o flanelinha de cobrar pelo uso da vaga?
Bem público tem dono, sim: cada um de nós! Não quero e não pretendo continuar aceitando a afirmação falsa de que o espaço público não é de ninguém. E como qualquer bem coletivo, há de se regrar o uso de cada um, a fim de que uns não prejudiquem os outros. Por isso não posso tolerar que as ruas de BH sejam alugadas por flanelinhas. Nem consigo admitir como normal que famílias inteiras se instalem em praças, vivendo ali, criando seus filhos, mantendo seus cachorros e atrapalhando o uso de equipamentos públicos pelo restante da população. Nem posso acatar a ideia de um cidadão instalar uma banca em frente a um comércio regular e concorrer deslealmente com quem paga impostos e gera empregos, ao vender bens contrabandeados por uma fração do preço do produto similar vendido do lado de dentro.
Não sou insensível aos problemas sociais que se colocam por detrás de cada história de quem se encontra em situação de rua, mas nem por isso posso admitir que ignorar a questão e manter os olhos fechados seja o mais adequado. Falar em dignidade humana, nesse ambiente, é ignorar o próprio sentido constitucional de dignidade e os direitos mínimos que a própria Constituição vincula a essa ideia, como moradia, saúde e educação. O poder público, aí, falha duas vezes: com a população em situação de rua, que vive sem dignidade; e com o restante da população, que não pode usar adequadamente o espaço público.
Na quarta-feira desta semana, dia 19, às 19h30min, uma audiência pública vai ser realizada na Câmara Municipal para discutir o tema: como Belo Horizonte pretende resolver a questão do uso irregular do espaço público? Se você acredita que a rua é de todo mundo e não de quem chegou primeiro, venha participar da discussão!