O cenário não poderia ser mais apropriado. Entre os casarões da cidade de Diamantina e as montanhas de Minas encontraram-se os governadores do Acre, Mato Grosso, Piauí, Rio Grande do Norte, Rondônia e Sergipe. Foram convidados e recebidos pelo anfitrião Fernando Pimentel. A pauta em debate foi a campanha que Minas tem realizado em defesa de um encontro de contas entre os créditos relativos às perdas da Lei 87/1996, conhecida como Lei Kandir, e os débitos referente à dívida com a União. Como resultado da histórica reunião foi lançada a Carta de Diamantina, que será encaminhada para a Presidência da República. Nela os chefes dos Executivos demonstram a urgência pelo atendimento do pleito.
A data também foi bastante oportuna: aniversário de 115 anos de nascimento do mais ilustre diamantinense, o ex-presidente Juscelino Kubitschek. A luta que Minas tem liderado pelo Acerto de Contas tem relação com uma das causas que JK mais se dedicou: a implementação no Brasil do verdadeiro federalismo, fator fundamental para a integração, o desenvolvimento e a democracia brasileira. A construção de Brasília, maior obra que o presidente deixou como legado, foi a materialização do seu sonho federativo, que encontrou nas curvas de Oscar Niemeyer a forma de levar a capital para o interior do Brasil, marcando em definitivo a sua integração.
O federalismo é uma das marcas da Constituição de 1988, que garantiu maior autonomia aos entes federados, rompendo com a centralização do poder nas mãos da União praticada pelo regime militar. Portanto, esse princípio encontra direta relação com a consolidação da nossa democracia. É o princípio federativo que deve garantir o intento democrático-descentralizador daquela que ficou conhecida como Constituição Cidadã.
E foi justamente a aprovação da Lei Kandir que empenhou um dos primeiros golpes contra o pacto constitucional. Nele, os estados deveriam contar com o imposto incidente sobre os produtos primários e semielaborados que fossem exportados. A referida lei determinou a desoneração das exportações de forma ampla, promovendo um incentivo às custas da arrecadação estadual.
Por reconhecer a existência de uma situação de inconstitucionalidade por omissão, em novembro de 2016 o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou prazo de 12 meses para que o Congresso Nacional edite lei complementar regulamentando os repasses de recursos da União para os estados que foram prejudicados. De acordo com a decisão, se ainda não houver lei regulando a matéria quando esgotado o prazo, caberá ao Tribunal de Contas da União (TCU) fixar regras de repasse e calcular as cotas de cada um dos interessados. Minas percebeu que, se depender apenas das instituições, a justiça jamais será efetivada, e por isso tem realizado várias atividades de mobilização que contam com uma unidade de todas as forças políticas e sociais.
Os estados que se reuniram em Diamantina tiveram suas arrecadações duramente afetadas durante os anos de aplicação da Lei Kandir. Acumularam-se valores exorbitantes e os prejuízos vêm prejudicando a capacidade de cumprimento das atividades estaduais. Nossa Minas, por exemplo, tem a receber R$ 135 bilhões relativo a essas perdas. Em contrapartida, a dívida atual do Estado com a União é de cerca de R$ 88 bilhões, o que consome parcelas de R$ 400 milhões por mês. Esse dinheiro faz muita falta aos cofres estaduais e poderia ser utilizado para regularizar o pagamento de salários sem parcelamento, investir em educação, segurança, saúde e obras.
Faço minhas, as vozes expressas na Carta de Diamantina, que demonstram que o encontro de contas pretendido contribuirá autonomia dos Estados frente às competências constitucionais. “Resultará no fortalecimento, agora fragilizado, do federalismo brasileiro, e irá validá-lo como opção pelo reconhecimento da pluralidade do país, pelo equilíbrio de poder e pelo salutar compartilhamento de responsabilidades, direitos e deveres entre os entes federativos”.