Aqui é Galo!Paulo Henrique Silva é jornalista do caderno Almanaque e escreve sobre o Atlético

Regendo a vitória

06/09/2018 às 18:52.
Atualizado em 10/11/2021 às 02:19
 (BRUNO CANTINI/ATLÉTICO/DIVULGAÇÃO)

(BRUNO CANTINI/ATLÉTICO/DIVULGAÇÃO)

BRUNO CANTINI/ATLÉTICO/DIVULGAÇÃO / N/A

 Não podemos falar em maestria, já que o jogo contra o São Paulo foi daqueles de testar o coração, um sofrimento que só acabou com o apito do juiz – e também com alguns tranquilizantes quando cheguei em casa. O time atleticano, porém, foi incansável em sua função de “maestro”, com vários jogadores regendo a torcida sempre que o momento exigia.

Victor parecia o Wilson Simonal, só faltando pedir à Massa para cantar junto “Meu Limão, Meu Limoeiro”, com um passinho para lá e outro para cá. E não é por acaso que a batuta estava com os mais experientes da equipe. Afinal de contas, diz o meu dicionário, o regente deve representar e promover a unidade da expressão “artística” de um grupo.

O recado dado por Ricardo Oliveira, no dia anterior, foi claro sobre o que ele e seus companheiros esperam nos jogos: um repeteco de 2013 e 2014, quando os torcedores pediam a virada no placar, cantando em uníssono o mantra “Eu Acredito!” até o milagre acontecer. Logo virou um hit, com o canto se popularizando em todos os estádios, em versões remixadas.

Para quem já não se lembra, era uma espécie de êxtase coletivo em que, além do jogo propriamente dito, fazia parte do ritual estabelecer essa comunicação entre arquibancada e campo. O quarteto Ronaldinho Gaúcho, Bernard, Tardelli e Jô viveu o seu momento Beatles. Era só pisarem no gramado, realizando jogadas sensacionais, que a torcida já ia à loucura.

A banda se desfez e, por mais que tentássemos reavivar aquela mágica, o time passou a responder em campo como se jogasse com algodão no ouvido, indiferente ao que vinha das grandes caixas acústicas naturais. A gota d’água foi o showzinho de quinta categoria mostrado no Mineirão, contra o Jorge Wilstermann, que nos deixou o melhor do tobas, típica música boliviana.

Com os sentidos visuais pouco estimulados, a torcida, no máximo, passou a exibir um repertório de canções de caça dos Mbuti, da tribo pigmeu da Papua Nova Guiné. Quem ouve pela primeira vez, vai achar que é um grito qualquer, mas depois de um tempo pode-se notar um padrão dentro do caos. Eu, por exemplo, só conseguia discernir “Luan! Luan!”.

É compreensível que o camisa 9 venha a público pedir mais cânticos. Não por ser pastor, claro, mas porque a música pode, a Ciência já comprovou, salvar vidas. No caso do Atlético, salvar um ano mais cheio de baixos do que altos, que caminha para ser lembrado como o primeiro sem títulos após uma sequência vencedora iniciada em 2012.

No Galo, só o título do Campeonato Brasileiro poderá nos resgatar. E a melhor maneira de voltarmos a entoar a música da vitória é pegar o metrô cheio de atleticanos, uma hora antes de a partida começar. Uma música silenciosa tem início nos olhares, na comunhão de sentimentos, até todos se encontrarem na estação do Horto, aos gritos de “Galo! Galo!”.

Juntos, caminhando a passos firmes em direção ao Independência, desafiamos qualquer um, com se estivéssemos começando uma Haka, a dança maori usada por jogadores de rúgbi da Nova Zelândia para intimidar seus adversários. “Batam os pés o mais forte que puderem!”, pede o líder da Haka. É assim que deve ser: nosso barulho deve fazer estremecer quem vem à nossa casa.

© Copyright 2024Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por
Distribuido por