Parece que o governo resolveu adotar o estilo "vamos anunciar primeiro e pensar depois" nesta semana.
O episódio fiscal desta quinta-feira (22) deixou isso escancarado. O anúncio desastrado de mudanças no IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) pegou até o Banco Central de surpresa, um sinal claro de desalinhamento interno e de uma gestão cada vez mais caótica.
A coletiva do governo federal, que apresentou alterações significativas no IOF com impacto direto sobre crédito, câmbio, seguros e operações com títulos e valores mobiliários, foi marcada por improviso e falta de articulação. A reação do mercado não poderia ter sido diferente: perplexidade, pânico e inversão imediata das tendências até então positivas, com uma forte alta do dólar, e a bolsa afundando.
A iniciativa expôs o que muitos já suspeitavam: o governo não sabe como atingir as metas fiscais sem recorrer ao caminho mais fácil (e mais nocivo): o aumento de tributos.
É importante deixar claro o efeito dominó dessa estratégia: elevar impostos para cobrir o déficit aumenta o custo para empresas e consumidores, desestimula investimentos e pressiona a inflação. O resultado? Um ciclo vicioso que exige ainda mais gastos públicos no ano seguinte, sem resolver o real problema, que é o desequilíbrio estrutural da dívida pública, cuja solução passa, inevitavelmente, pelo corte de despesas. O famoso ajuste fiscal.
Mas talvez o ponto mais alarmante tenha sido a revelação de que o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, não foi consultado sobre as medidas, e sabe-se que publicamente é contra a proposta. É difícil exagerar a gravidade disso. O BC é a instituição responsável por zelar pela política monetária do país, ou seja, controlar a inflação, gerir a oferta de moeda e influenciar os juros e o câmbio.
Como uma mudança com impacto direto nesses pilares é feita sem o conhecimento do seu presidente?
Enquanto isso, no Ministério da Fazenda, o clima era de aparente normalidade. Em entrevista à imprensa, assessores de Fernando Haddad, como o secretário-executivo Dario Durigan e o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, tentavam sustentar a narrativa de que tudo estava alinhado. Segundo eles, a medida, inclusive, ajudaria o BC a conter os juros e a inflação. Um decreto "amigo", nas palavras deles.
Duas horas depois, Haddad reapareceu nas redes sociais, mais especificamente no X (ex-Twitter, para quem ainda insiste no nome antigo) e soltou uma mensagem curta, direta e reveladora: “Sobre as medidas fiscais anunciadas, esclareço que nenhuma delas foi negociada com o BC”. Uma frase, dois recados: aos assessores que falaram demais e a Galípolo, que não estava apenas fora do circuito, parece literalmente fora do radar.
O estrago foi grande o suficiente para mobilizar o alto escalão do governo. Uma reunião de emergência foi convocada no Palácio do Planalto com nomes da articulação política, da comunicação e da área econômica. O único ausente foi justamente o ministro Haddad, que já estava em São Paulo.
Resultado: o Ministério da Fazenda decidiu recuar de parte das medidas, na tentativa de conter o estrago e limpar a imagem desgastada por mais uma lambança. Um governo que, a cada novo movimento, confirma a desconfiança do mercado: não há rumo, não há plano, só improviso.