Com este mesmo título, Vaclav Havel pronunciou um memorável discurso em maio de 1991. Intelectual dos mais respeitados e político por vocação, Havel foi um estadista de grande prestígio internacional. Foi presidente da antiga Tchecolosvaquia de 1989 a 2002. Em seus escritos e suas ações sempre foi um intransigente defensor da democracia, da liberdade e dos direitos humanos.
Em seu discurso de 1991, Havel aponta três razões para o homem desejar o poder político, e conquistando-o, querer mantê-lo: primeiro o mais nobre de todos, a luta por uma melhor ordem social, pondo em prática valores, visões de mundo e propostas, sempre na busca do interesse público e do bem comum.
O segundo, a característica presente de auto-afirmação, para fortalecimento de si mesmo, com o intuito de moldar o mundo que o rodeia a sua imagem e gosto. Este tem facetas perigosas quando exercido de forma exagerada e irresponsável, podendo gerar governos personalistas, maniqueístas e intolerantes a concepções e ideias diferentes.
O terceiro motivo seria a variada gama de vantagens proporcionadas pela aquisição do poder, o que faz com que haja sobreposição do interesse pessoal ao bem comum, com efeitos nefastos e reflexos imediatos na credibilidade institucional e no sistema democrático, contribuindo sobremaneira para desconexão entre representantes e representados. Sem contar dos gravíssimos efeitos quando as prerrogativas do poder são exercidas contrariando os princípios constitucionais do art.37 da Constituição Federal, em destaque a corrupção, que tanto prejuízo traz no que concerne à eficiência das políticas públicas e à qualidade de vida da população.
Estas três razões que fundamentam o poder, conforme Havel, são constatações que estão acima de concepções doutrinarias ou ideológicas distintas, ou até do conceito ora meio esquecido e que voltou ao debate político sobre esquerda e direita. Neste diapasão, duas reflexões sobre a temática, a saber: conforme o filósofo espanhol Ortega y Gasset, “ser de esquerda ou direita é uma das maneiras mais geniais inventada pelo homem de ser idiota”. E ainda do ex prefeito de Nova Iorque, La Guardia, que “não existe varrição de rua de direita e de esquerda, existem ruas limpas e sujas.”
O pós Covid nos direciona a uma árdua travessia do deserto nos campos econômico e social. A política que indicará o quão duro e intenso será esta travessia. E as sinalizações não são boas. Indicações que não teremos no Brasil águas tranquilas na esfera política no pós Covid são deveras preocupantes. A falta de harmonia entre os poderes, somado a intolerância a opiniões e ideias diferentes de lados distintos, com uma sucessão presidencial de 2022 que se avizinha, são ingredientes nada favoráveis para um país como o nosso, com uma jovem democracia e uma brutal desigualdade social.
O momento é crucial para reflexões dos atuais detentores de mandato e aos pretendentes, das três esferas da federação e dos poderes instituídos.