Doutor em Direito pela UFMG e Analista Político

Nossos 4 Ps: Pobreza, Populismo, Polarização e Pós Verdade

Publicado em 01/07/2022 às 06:00.

Apesar da heterogeneidade entre os países, analisando os aspectos político, econômico e social a América Latina apresenta características comuns em relação aos 4 Ps.

A pobreza sempre foi uma mancha no continente. Alguns com maiores índices que outros, mas via de regra com políticas públicas ineficientes em reduzi-la de forma satisfatória e digna, dando protagonismos às pessoas em suas vidas. A desigualdade é uma característica vergonhosa da região. E como já dito em outra coluna, a pandemia da Covid e a guerra na Ucrânia agravaram a crise econômica com nefastos efeitos sociais. Apenas no Brasil, 33 milhões de pessoas passam fome.

Segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), 22 milhões de pessoas teriam caído na pobreza na região em 2020, elevando o total para 209 milhões, dos quais 78 milhões viveriam em extrema pobreza.

Com a pobreza evidenciada, cria-se um ambiente favorável para o populismo, em que lideranças carismáticas incorporam discursos de salvadores da pátria, separando a sociedade entre elites e pobres. Aqueles dominadores e opressores responsáveis por todos os males e que massacram os menos favorecidos. E a estes, surge o discurso de radicais mudanças com destaque para o papel do Estado como garantidor de todas as benesses, auxílios e soluções, sem o menor pudor e ignorando as brutais limitações fiscais e legais. Explicitam verdadeiros estelionatos eleitorais no pós eleição, quando vencedores.

O terceiro P refere a algo comum e cada vez mais marcante e perigoso em nossas sociedades latino-americanas: a polarização. Em sentido geral, é resumir de forma simplória e limitada a realidade política, econômica e social em dois pensamentos únicos, extremistas, intolerantes e maniqueístas. Nestes termos dificulta e até anula qualquer possibilidade de diálogos, acordos e compromissos políticos com vistas ao interesse público e ao bem comum.

E assim, não se aprimora a democracia, pelo contrário, a definha. Em destaque o best seller “Como as democracias morrem”, dos autores Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, em que “a democracia requer respeito a regras comuns, reconhecimento da legitimidade dos adversários, tolerância e diálogo”. Algo que a polarização vai em direção absolutamente contrária.

E uma sociedade cada vez mais polarizada ocasiona um país com viés autoritarista, massacrando diversidade de opiniões e do contraditório. Quem defende e atua em prol da polarização caminha em direção contrária ao Estado Democrático de Direito moderno que encontramos em países mais desenvolvidos mundo afora.

E quanto ao último P, temos a Pós Verdade. Eleita “palavra do ano” de 2016 pelos Dicionários Oxford, a pós-verdade é o “qualificativo das circunstâncias em que fatos objetivos são menos influentes na opinião pública que os apelos emocionais e as crenças pessoais”. Segundo o filósofo e professor Mario Sérgio Cortella, pós verdade se dá pela “noção de uma relativização do conceito do que é verdadeiro não a partir daquilo que é a comprovação com a realidade, mas a partir das convicções que as pessoas têm”.

As pós verdades estão intimamente ligadas às multicitadas fake news. E numa era de preponderância das redes sociais, seus disseminadores encontram campo fértil, contaminando sobremaneira qualquer debate de tema relevante, especificamente o debate político e eleitoral. E em países com baixos níveis educacionais e frágil ou ausente formação cidadã, as pós verdades têm efeitos mais devastadores, sobretudo na camada mais jovem da população, pelo fato de utilizarem mais as redes sociais e na maioria das vezes por serem a principal senão a única fonte de informação.

Os 4 Ps somados compõem um péssimo cenário para esta e para as próximas gerações de qualquer país. Imperioso é romper com ciclos viciosos ocasionados pelos mesmos.

Grandes desafios pela frente para a região que devem ser enfrentados de forma obstinada e ousada por todos. E com a devida urgência que a realidade requer!

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