Doutor em Direito pela UFMG e Analista Político

Reflexões sobre Gaslighting e a manipulação psicológica no trabalho

Publicado em 06/12/2024 às 06:07.

Conforme matéria do Valor, “a expressão vem do filme Gaslight (Geroge Cukor, 1944), em que o Gregory Anton (Charles Boyer) cria uma série de situações para que sua esposa Paula Alquist (Ingrid Bergman), assim como o entorno, duvide da própria sanidade. Na história, um inspetor da Scotland Yard que desconfia das intenções de Anton é ardilosamente impedido de falar com Paula”.

Inicialmente muito relacionado ao repertório da violência de gênero, o termo “gaslighting” já integra o dicionário Oxford desde 2018. Essa modalidade de abuso consiste em desqualificar a memória, o entendimento e a lógica de quem esboce qualquer questionamento. Na mesma matéria do jornal Valor, o assunto é trazido ao contexto das relações no trabalho, principalmente na comunicação com subordinados.

No gaslighting, “uma pessoa tenta fazer com que a outra duvide de sua própria realidade — em uma manipulação psicológica para chegar aos seus objetivos, sejam eles quais forem. Associado mais comumente a relacionamentos amorosos, o gaslighting pode acontecer dentro do ambiente corporativo e causar danos à saúde da vítima e de seus colegas de trabalho, segundo especialistas”.

Entre as recomendações elencadas pelo Valor, a abertura de canais entre os funcionários e as áreas de compliance ou RH, paralelos à hierarquia, é apontada como forma de evitar que se chegue ao assédio moral.

Ao terem sua capacidade desacreditada, colaboradores preferem neutralizar novas iniciativas, sem buscar evolução. Sua constância pode ter consequências sérias tanto para a empresa quanto para seus profissionais.

O gaslighting não afeta “apenas” o bem-estar das vítimas. Regiane Ribeiro de Aquino Serralheiro, professora de psicologia citada na mesma matéria do Valor, dispõe que as pessoas mais vulneráveis ao argumento de autoridade, mesmo sem subordinação formal, acabam se submetendo sem sequer identificar os contrassensos.

A psicóloga Laís Mascarenhas acrescenta que no caso de pessoas com autoestima e senso crítico íntegros, a empresa tem perdas. “Afinal, diante da falta de confiança sobre a perspectiva de continuar empregada e a instabilidade em relação às demandas e expectativas, muitos profissionais se limitam ao fazer o mínimo, sem “desperdiçar” (ou gastar mais tempo e energia) com novas iniciativas que dependam de seu talento”.

O perigo mora quando a vítima não encontra meios para ser ouvida e validada. Ao ter seu desempenho contestado consecutivamente — mesmo que tenha executado exatamente o que lhe foi solicitado — a “falha de comunicação”; pode se tornar um infortúnio e um grande prejuízo à saúde mental do funcionário.

A citada manipulação psicológica traz danos não só ao funcionário afetado, mas também aos seus colegas e à própria empresa. Ao entregar uma tarefa exatamente como foi pedida, o funcionário ouve do chefe que “parece que ele não o entendeu”; ou “não foi isso que ele disse”, e tem seu desempenho colocado à prova constantemente, mesmo executando tudo o que lhe é pedido. Ao reclamar de ter suas habilidades questionadas, ouve que está exagerando e que as coisas não aconteceram assim!

Por fim, esta é mais uma característica do momento da complexidade nas relações no trabalho, em que pessoas despreparadas no aspecto técnico e emocional são alçadas a postos de comando e chefia. Em um curto prazo o “rei fica nu”, desestruturando a equipe e prejudicando sobremaneira sua efetividade, além de abalar de forma preocupante a saúde mental das pessoas.

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