Manoel HyginoO autor é membro da Academia Mineira de Letras e escreve para o Hoje em Dia

A construção de heróis

09/09/2016 às 19:57.
Atualizado em 15/11/2021 às 20:46

Os que se dispõem a heróis correm risco de perder a vida... de se tornarem heróis, perdendo-a a serviço de um nobre causa... ou de uma causa que supunham nobre. Os livros de história e a memória dos povos sabem-no muito bem.

Casos há, muitos inclusive, com nomes femininos: Rosa de Luxemburgo, La Pasionaria, por exemplo, na Alemanha e na Espanha respectivamente, em época de acirradas lutas ideológicas ou pela conquista do poder. Sempre ele. São fatos e personagens que caminham para cem anos, mas revelam a disposição de alguns e algumas por seus princípios, ideias, ambições, ilusões.

O final é, repetidamente, triste, letal, catastrófico. Há alguns anos, por exemplo, Leandro Konder, recordou Rosa de Luxemburgo, que participara da criação da Liga Spartacus, embrião do futuro partido Comunista, na convulsionada Alemanha antes da primeira guerra mundial. Estava ao lado de Karl Liebknecht, que se tornara um dos membros mais populares da facção. Cumpriam penas na prisão, quando caiu o regime monárquico.

Em janeiro de 1919, o clima é tenso em Berlim. Milhares de pessoas correm as ruas em manifestações. Pede-se a execução de Rosa e Karl. No dia 16, um jornal anuncia que ela fora espancada até quase a morte pela multidão ao sair do Hotel Eden, após submetida a interrogatório. Depois, desaparecera, talvez liquidada. O corpo só seria encontrado, em 31 de maio, jogado num canal, o Landwehrkanal.

A carreira política de Rosa, era radical, revolucionária, mas também inabalavelmente democrática. Em 1904, num congresso socialista em Amsterdam, o francês Jean Jaurès lhe fizera críticas, mas não havia quem as vertesse ao alemão, língua falada pela maioria dos delegados. Ela subiu à tribuna e traduziu o discurso, imediatamente.

Estudiosa de Marx, elaborou um livro “A acumulação do capital” e, criticada por Lênin, dele recebeu reprimenda, mas não se dobrou. As divergências persistiram. Lênin afirma que ela nutria uma concepção confusa do partido revolucionário. Defendia uma organização da sociedade que garantisse mais amplas liberdades do que as admitidas pelo líder.

Para demonstrar sua força pessoal, há de se lembrar um episódio. Em reunião realizada em 1907, ao retirar-se com a companheira Clara Zetkin, ouviu uma piada de August Beb, referindo-se a decisões menos combativas aprovadas na ausência de ambas. Ela não se inclinou: “É possível. A direção do partido ficou sem os últimos homens que lhe restavam”. Referia-se a si e a Clara.

A despeito de tudo, defendia o diálogo, recusando os excessos de violência. Segundo ela, para atingir seu objetivo, “a revolução proletária não necessita de terror”, pois a classe operária tem horror a morticínios”.

Em meio a suas atividades revolucionárias, viveu um cálido amor com Leo Jogiches, como se observa por suas cartas, compiladas em livro. Leo, dirigente revolucionário, foi assassinado, em 14 de março de 1920, por grevistas em manifestação de rua em Berlim. Ela já deixara a vida melancolicamente, cerca de um ano antes.

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