Não surpreende mais, mas causa espanto. Refiro-me ao discurso pronunciado pelo chefe da nação, semana passada, na formatura de 485 novos soldados da Polícia Militar do Rio de Janeiro. O presidente da República, em atitude que jamais vi de qualquer outro de igual nível em uma nação e em qualquer ocasião, simplesmente fez as mais graves acusações a uma atividade e instrumento tida como instituição e até como quarto poder.
Não consigo entender em que ganha o Brasil com pronunciamento nesse nível. Não se restringiu o primeiro mandatário a ofender a imprensa, pois ainda estimulou os novos cadetes a não acreditarem no que aparece na mídia. Disse: “Não esperemos da imprensa a verdade. As mídias sociais, essas sim, trazem a verdade, e não a fábrica de fake news que é a imprensa brasileira”. E recebeu aplausos de pessoas presentes, que certamente era o que esperava.
Dando sequência, declarou: “Pensem nisso na hora de agir.” Como se a imprensa fosse useira e vezeira na pratica de absurdos, anula méritos e culpa os bons e justos. “Se preparem cada vez mais, simulem as operações que podem aparecer, porque em uma fração de segundo está em risco sua vida, do cidadão de bem ou de um canalha defendido pela imprensa brasileira”. Completou à frente: “Não se esqueça disso, essa imprensa jamais estará do lado da verdade, da honra e da lei. Sempre estará contra vocês, pensem dessa forma para poderem agir”.
Na hora dificílima que a nação atravessa, e não somente a pandemia a torna dramática, imprescindível que todos os homens de bem, soldados ou não, do poder civil ou militar, analisem cuidadosamente as afirmações do presidente, no uso pleno de seu direito de falar.
Sem se referir ao episódio mencionado, o veterano homem de imprensa de Minas, competente e isento, Fábio P. Doyle, em suas manifestações, afirmou: “Fala demais, fala o que deve e o que não deve, briga com repórteres, que, cumprindo ordens dos seus diretores, lhe fazem perguntas inconvenientes e agressivas”. Ele mesmo diz: “Não levo desaforo para casa”.
"Falastrão, boquirroto, todos os dias aparece nas telas das TVs”. Dias após comentar que a Covid “está no seu finalzinho”, afirmou em discurso que “eu não tomarei a vacina”, provocando mais insegurança entre os que pretendiam vacinar-se. A decisão de não tomar era dele, pessoal, íntima. “Deveria ser guardada a sete ou 10 chaves, afinal, trata-se do chefe da nação, para não influenciar ou até atemorizar os que precisam e devem ser imunizados”.
Doyle conclui: Repito: “uma pena o boquirrotismo impulsivo e desastroso de um político com tantas qualidades. Um defeito lamentável e, em alguns casos, imperdoável”.