Manoel HyginoO autor é membro da Academia Mineira de Letras e escreve para o Hoje em Dia

Fidel, depois dos noventa

18/08/2016 às 19:36.
Atualizado em 15/11/2021 às 20:26

Dia 13 de agosto não foi sexta-feira em 2016, mas sábado. Dia de mau agouro, segundo as superstições. Oitavo mês do calendário atual, era antes o sexto, o sextili. Como sempre houve bajulação, a escolha de julho homenageou Júlio César, quando assumiu a autoridade consular pela primeira vez. Para lisonjear Augusto, o imperador, posteriormente à batalha de Accio, passou a “agosto”, no oitavo ano antes de Jesus Cristo. 

Na nova República, agosto deixou marcas sinistras no Brasil. Mas em Cuba, coincidiu o 13 de agosto como nascimento, em 1926, de Fidel Castro, que assim completou 90 anos no sábado. Explicando a longa existência, ele já dizia, em 1979: “Tenho um colete moral, é forte. Tem me protegido sempre”, tanto que teria resistido a 634 tentativas de assassinato.

A Cuba de Fidel é um dos poucos países do mundo a ter assistido à retirada de seu território de três potências coloniais: Espanha, Estados Unidos e União Soviética. Richard Gott assinalou: “Todas deixaram marcas significativas na ilha e no povo, um legado duradouro de prédios, artefatos e filhos”. Ao longo de 40 anos, “a Revolução de Castro pôs Cuba no mapa e registrou a ilha como uma presença permanente no cenário mundial. Engendrou no povo cubano um sentido inatingível, mas real de orgulho pela sua nação”. 

Alina Fernandez, filha de Fidel, criticada até por familiares, médica, recorda a sua Havana, “mudando de ruídos e texturas. As paredes das casas estouravam em fístulas morbosas, desvendando o desleixo de quase quarenta anos. Uma fachada completa de um prédio do Malecón veio abaixo revelando moradias que pareciam ratoeiras: umas condições de vida suburbanas.

Os pórticos – essa glória da cidade, o espaço sombreado e resguardado do sol que era a alegria do dominó dos vizinhos e a paz dos caminhantes, que podiam percorrer quadras inteiras protegidas do sol do trópico – estavam escorados com tábuas e vigas velhas prestes a cair”. Mas se vivia para silenciar a angústia, conta Alina, sobre a velha Havana, da infância e adolescência. Os visitantes veem com certa tristeza o que restou.

A gloriosa capital passou a ser uma Ciudad Vieja, transformada – mesmo assim – em atração visual aos turistas que voltam, depois da reaproximação com os Estados Unidos, conseguida com Raúl Castro. 

No “cumple años”, retraído a seus aposentos, o líder, de barbas embranquecidas escreveu extensa carta ao presidente dos Estados Unidos, para criticá-lo. É que Barack Obama, em sua viagem este ano a Cuba, pediu ao povo da ilha que olhasse para o futuro, o que Fidel considerou um desaforo. Aos cubanos, declarou: “Quero expressar minha mais profunda gratidão pelas demonstrações de respeito, cumprimentos e elogios que recebi nos últimos dias, o que dá forças para retribuir com ideias que transmitirei a militantes do partido e organizações relevantes”. 

Entanto, Fidel permanece desejoso de viver e de manter sua imagem guerrilheira e de oponente as Estados Unidos, em todas as circunstâncias. Embora querido e reverenciado por grande número de cubanos, os tempos são outros.

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