O desembargador Rogério Medeiros Garcia de Lima, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, doutor pela UFMG, professor universitário, até recentemente presidente do Tribunal Regional Eleitoral, comparece com frequência a nossas folhas, para expor suas posições diante dos problemas que inquietam, sem cessar, a vida brasileira. Não teme expor o que pensa e sente, merecendo respeito e elevada consideração.
Há alguns dias, escreveu ele – e faço questão de transcrever na íntegra:
“18 de maio. Há exatos vinte anos, em 2001, eu defendia a tese de doutorado “O Direito Administrativo e o Poder Judiciário”, na Faculdade de Direito da UFMG, orientado pelo saudoso professor Paulo Neves de Carvalho. Quanta saudade!
Duas décadas passaram num piscar de olhos. O mundo de João Paulo II passou, para pior.
Passou a minha tese. Passei eu. Tudo passa...
Posteriormente, a tese foi publicada em livro, com duas edições, pela Editora Del Rey.
Eu concluía o trabalho acadêmico assim:
“Lembra Eugenio Raúl Zaffaroni ser ‘tão política a questão judiciária que, praticamente a Revolução Francesa foi desdobrada contra o poder arbitrário dos juízes, mais do que contra o poder monárquico’. É preciso mudar já, antes que as mudanças se façam pela força, o que não seria salutar para a incipiente democracia brasileira.
“As mudanças passam pela postura dos juízes como homens. É sempre presente a lapidar assertiva de Eduardo Couture: ‘Da dignidade do juiz depende a dignidade do direito. O direito valerá, em um país e em momento histórico determinados, o que valham os juízes como homens”.
Alimentava, então, a esperança de construirmos um Judiciário digno de um Brasil melhor.
Vã ilusão: falhei, a minha geração falhou e o Judiciário falhou. Falhou muito!
O Brasil retrocedeu cem anos.
Em 1789, mais do que contra o rei, os franceses rebelaram-se contra os juízes. Destruíram o presídio da Bastilha e iniciaram a Revolução Francesa.
A revolta contra juízes não decorre somente de detenções arbitrárias, mas também da sua falta de sintonia com valores éticos caros à sociedade.
Perto de completar sessenta anos de idade, considero que já fiz o que tinha de fazer. Posso dormir tranquilo. Posso olhar nos olhos dos familiares, amigas e amigos, cidadãs e cidadãos.
Posso embarcar no avião, comer no restaurante, tomar cerveja no bar e ir ao clube. Posso caminhar na rua, com a máscara anti-Covid, mas sem a esquiva máscara dos desonrados”.