Manoel HyginoO autor é membro da Academia Mineira de Letras e escreve para o Hoje em Dia

Lá no Javari

Publicado em 26/07/2022 às 06:00.

Na Sé de São Paulo, solenidades - religiosas ou não - prestaram homenagem à memória do sertanista Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, assassinados no Oeste da Amazônia, limite do Brasil com o Peru e Colômbia. O jornalista Aylê-Salassié F. Quintão, mineiro de nascimento, conhece a região, por ter acompanhado como repórter os trabalhos do Projeto Radam, que produziu relatórios e mapas da Amazônia desconhecida, e hoje vive em Brasília.

Ele conta que Che Guevara chegou a pensar em iniciar sua incursão revolucionária pela América do Sul a partir daquela tríplice fronteira. A região abriga não apenas uma longa faixa de limite seco, como é atravessada por alguns dos principais rios da bacia amazônica: Negro, Japurá, Içá, Purus, o próprio Amazonas e seus afluentes. O governo federal mantém instalados ali várias delegacias da Polícia e da Receita Federal, da Funai, do Ibama, da Funasa e outros, inclusive bases do Comando Militar da Amazônia. Mas, de verdade, as forças que atuam na região são outras.

O jornalista e professor Aylê, que já andou meio mundo em suas missões, revela mais sobre aquele pedaço do Brasil: “O governo brasileiro está em peso representado na Amazônia, mas, aparentemente, no Oeste ninguém respeita as leis. Servidores do Estado tem, inclusive, receio de trabalhar na região. Vez por outra é assassinado um fiscal, um indigenista (19 só este ano), um missionário. Entre as transgressões mais comuns por ali estão o contrabando, lavagem de dinheiro, mineração ilegal, narcotráfico, tráfico de madeira, de armas, de pessoas e de recursos naturais, tudo controlado por chefões, localizados nas cidades próximas, por políticos e até por cartéis do lado colombiano e peruano. 

Vilas e cidades rarefeitas estão isoladas. As nações indígenas vivem no interior das matas.  São os “Povos da Floresta”. Há municípios em que se fala quatro a cinco línguas diferentes. Além disso, no próprio Vale do Javari, os índios vivem em confronto entre si até por território, o que torna a demarcação das terras um tema prioritário e complexo. Em novembro de 2014, dois índios matis morreram durante contato com corubos isolados. Em resposta, 15 indígenas corubos teriam sido assassinados em outro encontro, em setembro de 2015. O mesmo aconteceu com alguns madeireiros. A Funai  teve a sede ocupada pelos índios em Atalaia do Norte.  
 
Na região, o que está em jogo não é bem o território indígena físico, mas, primeiro, os recursos pesqueiros, madeireiros e de garimpo, conduzidos pelo homem branco. Segundo, a rota Javari é usada para o tráfico de drogas e o contrabando”.

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