Milhões de brasileiros terão permanecido diante das câmeras por muitas horas para acompanhar, em vivo e em cores, como dizem os irmãos lusos, o extenso, acalorado e, às vezes, até cansativo julgamento no Tribunal Superior Eleitoral sobre a anulação da chapa Dilma-Temer.
Enfim, tratava-se de problema de dimensões nacionais e os motoristas de táxis e carros particulares mantiveram-se ligados no que chegava de Brasília pelo rádio.
O brasileiro, de todas as condições sociais, que sabe ler, ouvir e julgar, sentiu-se no dever de conhecer os detalhes. Investiu-se realmente no papel de cidadão, aquele que assume grave responsabilidade na fiscalização do exercício da função pública.
O ventilador poderoso atirou detritos por todos os lados no país, anos, teve trabalho, mas cumpriu o que dele se esperava. O cidadão perfeitamente percebeu que havia muito mais de podre no Brasil do que no reino da Dinamarca, como se referiu Shakespeare, no “Hamlet”.
O brasileiro queria, e quer, desvendar o que havia, e há, no âmbito dos males causados à nação por organizações criminosas, até mesmo partidos (se o caso), que resultaram na calamidade que chegou às contas e bens públicos e a todos os lares. Se muito já se esclarecera, se muitos fatos se revelaram, – mesmo que não sobrevindo a indispensável sanção – é imprescindível que dúvidas não pairem.
Ao cidadão, que mantém a nação, pouco ou nada interessa distinguir se o problema fora de natureza econômica, jurídica ou política; o importante é punir a gatunagem, condenando seus autores com provas materiais ou testemunhais.
O julgamento do TSE foi válido, não se discute, mas não correspondeu integralmente ao esperado. As lições de ciência jurídica, fartas e profundas, serviram para argumentar. O voto de desempate do ministro Gilmar Mendes encontrou claras motivações, alegada a necessidade de estabilidade política em hora ainda lúgubre da vida nacional.
Melhor seria deixar como estava? O ministro-presidente do TSE admitiu como o Américo Pisca- Pisca “: deixemo-nos de reforma. Fique tudo como está, que está muito bem”, da fábula de Monteiro Lobato, autor que possivelmente não referendasse o voto.
O presidente do Tribunal foi peremptório, em sua declaração final: “Não me venham dar lição de moral. Combate à corrupção eu também quero”.
A decisão do Tribunal pode não ser a que prevalecerá, em última análise. Há dentre outros fatos, contundentes suspeitas sobre a conduta de auxiliares do presidente da República. Esta é uma semana de ansiedade.
Cabe, todavia, continuar a luta, sabedor o país da posição de Gilmar: a corte eleitoral não é espaço para solucionar crise política. Tanto que as quase 30 horas de reunião do TSE apenas cumpriram o rito. Era como dizia o professor Afonso Lamounier, que trabalhou a CEMIG: “tudo combinado, nada resolvido”.
No entanto, as águas, com toda sua sujeira, continuarão rolando. O mau cheiro se sente até pelo rádio, jornais e televisão. O Brasil seguirá acompanhando a sujeira, maior que a do rompimento da barragem do Fundão, em Mariana, tão dolorosamente marcando ainda a vida do país.