A expressão “condução coercitiva” esquentou a temperatura política do país, em época já assinalada por incessante turbulência. Velhos problemas assumem tonalidades novas, principalmente em decorrência de interesses em jogo.
Em São Bernardo do Campo, onde reside, um ex-presidente da República, diante da Polícia Federal, perguntou por duas presenças: do japonês da PF e das algemas. Enfim, a medida dava a entender que para a “condução coercitiva”, esses dois instrumentos – o agente policial e o grilhão – eram imprescindíveis e óbvias .
O Supremo Tribunal Federal resolveu editar uma súmula vinculante, diante da ausência de norma específica na Constituição de 1988 e da inexistência de legislação própria sobre o uso de algemas. Ocorre que o emprego desse instrumento não foi disciplinado por decreto federal. Até hoje.
Em longo artigo, Paulo Fernando Silveira, juiz federal aposentado, advogado, jurista, escritor e professor universitário, tece considerações judiciosas sobre algema, “só aplicada na prisão de pessoa pobre, considerada a priori como elemento perigoso e violento, e raramente – se é que houve algum caso – em gente rica e poderosa, sempre tida como gente de bem, o que sempre causava repulsa e protesto da elite dominante”.
O magistrado opina: “Entendo, numa interpretação realística, que venha ao encontro das sentidas necessidades atuais de igualdade e segurança da população, perante nossa Constituição Federal. A utilização de algema, quando da prisão em flagrante delito ou por ordem judicial, deve constituir a normalidade, figurando como exceção a sua não utilização. A meu ver, há valores maiores em jogo do que os suscitados pelo Supremo Tribunal Federal”.
Observa ainda: “Mesmo no caso de comparecimento do preso a juízo – e todas as vezes que o detento estiver fora da cela, em ambiente público – também deve ser algemado. Durante a audiência, o magistrado, se achar conveniente, pode mandar liberá-lo, ouvindo-se, antes, o agente policial sobre a periculosidade do réu.”
As circunstâncias são muitas e diversas. Haja vista o caso do marqueteiro Santana e a esposa Mônica Moura, que aparecem em fotos de imprensa e flagrantes de reportagem de televisão com os braços para trás, como se manietados. Todavia, não utilizam algemas. Agem assim, talvez, à guisa de parecerem vítimas de violência policial, de perseguição.
Para Paulo Fernando Silveira, “o uso de algema no ato da prisão se impõe porque vivemos tempos modernos, de ostensiva violência pública...Mesmo os que acatam a ordem devem ser algemados para segurança e proteção sua, do agente e de terceiros.” “Aliás, se o preso não for algemado e acontecer danos a terceiros, o policial responderá civil e criminalmente por negligência e o Estado por danos materiais”.
Conclui o magistrado: “Quanto à exposição do preso pela mídia, a televisão, a meu ver, pode mostrar o ato da prisão e a condução do preso algemado, desde que as tomadas sejam feitas na via pública, sendo proibidas dentro do distrito policial”.