Manoel HyginoO autor é membro da Academia Mineira de Letras e escreve para o Hoje em Dia

O sentimento de Justiça

04/08/2016 às 19:11.
Atualizado em 15/11/2021 às 20:10

Sintetizo uma história que vai ficando velha. Em abril de 1995, a Federação Brasileira de Hospitais iniciou uma Ação Ordinária de Cobrança para receber valores resultantes de convênios firmados com o SUS, por ter o Ministério da Saúde, quando da conversão da URV (Plano Real), aplicada irregularmente às tabelas dos serviços prestados pelos hospitais, a menor, desde julho de 1994.

Mais de 4.200 hospitais sentiram-se prejudicados, como de fato o foram, e ingressaram em juízo. Juristas altamente conceituados emitiram pareceres indicando a legitimidade do pleito da Federação, como Raul Machado Horta (já falecido), Humberto Teodoro Junior, Cássio Scapinella Bueno, Aroldo Plínio Gonçalves, Yussef Cahali e Thereza Thibau. 

Comprovada a dívida da União (são mais de R$ 400 milhões), as determinações judiciais do respectivo precatório começaram a ser cumpridas, para pagamento em dez prestações, conforme aprovado pelo Congresso Nacional, reunidos Senado Federal e Câmara dos Deputados, nos termos do prazo facultado pelo artigo 100 da Constituição Federal. 

Quando já quitadas algumas parcelas, em maio de 2008, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, integrada por cinco membros, decidiu anular a execução, por 3 votos a 2. Com isso, bloquearam-se os pagamentos restantes, segundo orientação do ministro Teori Zavaski (agora do STF), mesmo desafiando a decisão transitada em julgamento do próprio STJ. Curiosamente, é a primeira e única anulação, de decisão transitada em julgamento, e mais – sem sustentação na lei, ou na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. 

Assim se passaram sete anos, permanecendo como desconhecida ou esquecida a longa tramitação do processo. As contas ficaram bloqueadas no Banco do Brasil, em agência de Brasília, enquanto a população que se serve dos serviços do SUS continuaram e seguem em padecimento, como relatam diariamente os veículos de comunicação.

Os fatos demonstram, à suficiência, que um tribunal do prestígio e da mais alta grandeza faz vistas grossas sobre o problema, que não é apenas de uma entidade representativa de hospitais, pois também o é da dignidade da pessoa humana, de sua saúde e da própria vida, fundamentos consagrados pela Carta Magna.

O ministro Teori, com marcante atuação presentemente na mais alta corte de Justiça do país, em decisões graves sobre a operação “Lava Jato”, está com sua posição em julgamento pela nação, pelo caso a que hoje me refiro. Anular uma sentença transitada em julgado e determinaram o bloqueio dos pagamentos, aprece um acinte à ordem jurídica. 

Ouvi um dos advogados da FBH. Disse-me ele: “O julgamento constitui verdadeiro absurdo jurídico, inconcebível em um Estado Democrático de Direito”. Adiante: “Eis uma decisão que há sete anos perdura como sentença jurídica teratológica, arranhando a alta reputação e a imagem do Superior Tribunal de Justiça, chamado o Tribunal da Cidadania”.

Milhões de pessoas passaram pelos hospitais neste extenso período de sete anos. Sentiram, com suas famílias, as deficiências do sistema, com filas intermináveis e mortes possivelmente evitáveis. A propósito, evoco, – mais uma vez – Ruy: “De que valem leis, onde falta nos homens p sentimento da Justiça?

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