Manoel HyginoO autor é membro da Academia Mineira de Letras e escreve para o Hoje em Dia

Políticos têm patrono

06/09/2016 às 19:06.
Atualizado em 15/11/2021 às 20:43

O número 72 do Jornal da Associação Nacional dos Escritores (ANE) traz interessante artigo de José Carlos Brandi Aleixo, da Academia Mineira de Letras, sobre Tomás More. Muito oportuno, aliás, pois corresponde ao quingentésimo (quinhentos anos) do aniversário de publicação de “A Utopia”, em Lovain, cidade belga, em 1516. O autor se refere ao fato de estar exatamente agora se registrando também o cinquentenário do filme “A Man for All Seasons (no Brasil, “O Homem que não Vendeu a Alma” ), de Fred Zinnmann, que ele considera excelente.

Filho de pais abastados, More formou-se advogado, casou com Jane Colt, de cuja união nasceram quatro filhos. Viúvo, esposou Lady Alice. Exemplar chefe de família, seu lar acolhia genros, noras, netos, amigos e jovens que precisavam de orientação. Elegeu-se ao Parlamento, recebeu o título de cavaleiro, tornou-se presidente da Câmara dos Comuns e foi escolhido por Henrique VIII para chanceler, admirado “pela integridade moral, competência, sutileza de pensamento, afabilidade e cultura ímpar”.

Participou em Flandres de negociações, em nome da Inglaterra, sobre tratados comerciais e diplomáticos, mais se aproximando do sábio Erasmo de Roterdam, de quem já era amigo, autor de “A Educação de um Príncipe Cristão”. Na Antuérpia, onde existia uma Feitoria portuguesa, aproximou-se do navegante lusitano Rafael Hitlodeu, que viajara com Américo Vespúcio. Uniram seus interesses aos dos autores helênicos e romanos que estudaram a organização política dos povos.

More somava experiências e convivia com o que havia de mais lúcido na intelectualidade europeia, mas não se curvava a interesses e desígnios do poder. Afastava-se, assim, de seu protetor, Henrique VIII, que pretendia assumir, como assumiu, a chefia da Igreja da Inglaterra, desafiando Roma. Não aprovando o divórcio do soberano, acontecimento decisivo naqueles meados do século XVI, demitiu-se Tomas da chancelaria. Encarcerado por mais de um ano na temível Torre de Londres, registrava suas dores e sacrifícios. Finalmente condenado à forca, não desanimou.

Escreveu: “Os homens fizeram os reis para os homens e não os homens para os reis, colocaram chefes à sua frente e para que pudessem viver comodamente ao abrigo das violências e dos ultrajes; o dever mais sagrado do príncipe é velar pela felicidade do povo antes de velar pela sua própria; como um pastor fiel,deve dedicar-se ao seu rebanho e conduzi-lo às pastagens mais férteis (...). A dignidade real não consiste em reinar sobre mendigos, mas sobre homens ricos e felizes”.

Dirigiu-se ao carrasco, ao ir à forca: “Ajuda-me a subir ao cadafalso porque para descer não darei trabalho”. Ainda: “Morro servidor fiel do rei, mas de Deus em primeiro lugar”.

Para epitáfio, deixou redigido: “Não odioso à nobreza, nem desagradável ao povo, mas temido por ladrões, assassinos e heréticos”.

Reverenciado, inclusive por Lênin, que lhe ergueu monumento próximo ao Kremlin, João Paulo II, em outubro de 2000, proclamou-o “Patrono dos governantes e dos políticos”. Seria bom que estes melhor o conhecessem.

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