Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

A banalização do pedido de desculpas

Publicado em 21/08/2025 às 06:05.

Sempre que erramos ou percebemos que magoamos alguém temos a opção de nos desculpar. Um pedido de desculpas é uma forma educada e bem intencionada de reparar o dano ocorrido. Entretanto, existe uma questão importante a ser ponderada: nem sempre esse pedido é real, muitas vezes, ele está mais voltado aos interesses de quem prejudicou do que a preocupação com os sentimentos de quem foi prejudicado.

O pedido de desculpas verdadeiro deriva de um processo profundo de conscientização e arrependimento, por isso requer um censo apurado de autocrítica. Após esse despertar a pessoa consegue perceber seus erros e inicia uma nova conduta cheia de aprendizados, em que é preciso estar aberto a receber críticas e sugestões que corroborem o novo jeito de agir. O real pedido de desculpas ocorre num processo de dentro para fora e traz consigo pouco discurso e muita ação.

Já aquele que pede desculpas de forma estratégica não está comprometido com a mudança, apenas quer ser perdoado, por isso capricha no pedido enviando cartas, flores e presentes muitas vezes embalado de manifestações emocionadas. Ocorre, muitas vezes, em situações de medo ou flagrantes onde a pessoa se promete mundos e fundos e afirma que não irá mais fazer isso pois a “ficha caiu”.

De fato, há um arrependimento real, mas este tem a ver com o fato de ter sido enquadrado numa situação onde a culpa do erro foi deflagrada. Nessa hora, o desconforto, a vergonha, e o medo de perder a condição na qual se está inserido costumam ser tão grandes que acabam prometendo aquilo que, no fundo, sabem que não irão cumprir. Mas essas promessas já vem com prazo de validade –apenas o tempo do susto.

O indivíduo que se desculpa de forma estratégica e não visceral acostuma-se a pedir desculpas incontáveis vezes sem o compromisso da mudança, daí a banalização. É preciso ponderar: Vale a pena se desculpar se não há interesse real em mudar de conduta? Vale a pena se desculpar e continuar cometendo os mesmos erros? E aí se levanta outra questão: quantas vezes devemos perdoar quem errou conosco?

Há um ditado que diz: “se a pessoa errou uma vez é culpa dela, se errou duas é culpa minha”. Não é isso que prega o cristianismo que diz que devemos perdoar infinitamente quem erra. Esta não deixa de ser uma questão importante para ser refletida nas relações interpessoais onde nós também cometemos falhas. Frente a tanta vulnerabilidade, não deveríamos tratar os erros alheios nem com tanto rigor nem com tanta condescendência. Há um ponto de equilíbrio onde a maturidade e a saúde mental deve encontrar seu lugar.

Uma boa forma de agir pode ser perdoar e observar. Se aquele que se diz arrependido mantiver uma mudança comportamental satisfatória talvez esteja de fato disposto a mudar. Porém, se num curto espaço de tempo houver a reincidência de erros, é um indício de que não haverá mudança. Se o pedido de desculpas que recebemos é visceral ou estratégico, nos resta esperar pois somente o tempo dirá.

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