Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

A fragilidade do sexo forte

18/07/2018 às 13:58.
Atualizado em 10/11/2021 às 01:28


A ideia que nos governa ainda hoje é a que associa o homem à uma figura forte, viril, nada delicado, provedor e impassível, uma espécie de Rambo. Espera-se desse homem implacável, que ele não esmoreça frente aos obstáculos, não sinta medo e claro, jamais chore.  

Essa opressão disfarçada de supremacia é um modelo de masculinidade que nem os próprios homens estão aguentando suportar. 

Vejamos o caso de Joao, um rapaz de 37 anos, casado, com 2 filhos, passou por uma decepção amorosa quando descobriu que sua esposa mantinha uma relação extra conjugal com um colega de trabalho, fato até então comum para o universo feminino. Buscou desabafar com um amigo que, prontamente, o encorajou a se separar e buscar. Prontificou-se a integrar-lo numa turma de solteiros e o garantiu que em meio festas e novas mulheres, ele viraria a pagina daquele sofrimento rapidamente. 

De uma maneira geral, não há problema em tentar atenuar a dor através da diversão. Neste caso a  questão vai além: no universo masculino, é amputado ao homem a condição de sofrer, sobretudo se for por mulher. O sofrimento é associado ao fracasso e isso é outro problema para eles. Acontece, que, ao contrário do que muitos pensam, o sofrimento não é opcional. Nesse caso, deriva da sensação de rejeição, substituição, traição do pacto matrimonial e dissolução da família. Uma dor intensa para ser resolvida de forma prática. 

João queria mesmo perdoar sua esposa, mas não se sentia confortável em fazer isso perante os amigos e família. Não queria a alcunha de “corno”. Resolveu então se separar mesmo contrariando sua vontade. Começou a frequentar festas e bares, mas se sentia tão triste que precisava anestesiar sua diversão com álcool e drogas. Pensou em procurar uma terapia, mas foi logo desencorajado pelo amigo que disse: “isso não é coisa de homem”.

De um modo geral, a maneira cultural que o homem metaboliza sua dor, é mais prática, mas também, mais superficial. João seguiu, sem dar ouvidos à espiral descendente a qual se encontrava. Sentia-se permanentemente triste, mas evitava falar no assunto, embora passasse boa parte da madrugada acordado com pensamentos recorrentes. 

Acordava sempre cansado, a produtividade profissional caiu, parou de praticar esporte. E, devido ao seu novo estilo de vida, largou hábitos saudáveis e os substituiu por atitudes autodestrutivas. Algumas vezes, João pensava em visitar um psicólogo, mas logo tirava a ideia da cabeça, associava isso a figura de um homem fracassado. Preferiu então fazer algo comum ao universo masculino: “engolir o choro”. O que ele não contava era que estava entrando num quadro depressivo acompanhado de crise de ansiedade. 

João custou a se acostumar com a ideia de que estava doente e precisava de ajuda. Não pela doença em si, mas por ser “homem”. 

A dificuldade em assumir as fragilidades é comum ao universo masculino. Uma lástima, pois o machismo que muitas vezes é visto como privilégio, sob ponto de vista emocional, mais oprime que dá vantagens.

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