Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

Interferência, indiferença e colaboração

Publicado em 20/03/2025 às 06:00.

A inteligência interpessoal nos convida a conseguir nos relacionar bem com as pessoas de forma harmônica, acolhedora, empática e não atrituosa. Porém, nem sempre conseguimos desenvolver essa condição, nos falta inteligência emocional para conduzirmos nossas relações. Para aprimorarmos essa habilidade se faz importante refletirmos sobre três conceitos comportamentais. 

1- Interferência: Muitas vezes não percebemos com nitidez o quanto estamos interferindo na vida dos outros, sobretudo quando a nossa intenção é de ajudar. Entretanto, devemos ter em mente que a boa intenção não retira o teor invasivo da interferência. Temos que tomar cuidado, principalmente em relação às pessoas mais próximas. E um bom exemplo disso é a crítica.

Criticamos o comportamento do outro sem nem mesmo perceber que isso é uma forma de rebaixá-lo. Às vezes, nem temos condição moral para isso, pois fazemos coisa pior - é o sujo falando mal do mal lavado, além de ofensivo é uma hipocrisia. Mas, quando somos bons exemplos, temos que nos policiar para não criticar a conduta do outro. 

Tão inútil quanto a crítica é o conselho não solicitado. Numa relação pautada na empatia, precisamos levar em conta que tudo que eu digo pode impactar diretamente no emocional do outro (positiva ou negativamente). Portanto, deveríamos ter muita cautela sobre falar algo que alguém não nos perguntou ou não está disposto a ouvir. Quando damos um conselho não pedido, imbuídos no salvo-conduto de ter “a voz da experiência”, corremos o risco de interferir numa mudança de plano da vida de alguém. 

Outra questão que faz parte da interferência são os comentários inúteis com viés pessimista, como, por exemplo: uma pessoa conta que comprou um carro; ao invés do interlocutor dar os parabéns pela conquista, ele se ocupa em dizer sobre a péssima escolha que o outro fez. Diz que já teve um carro dessa marca e que só teve aborrecimentos. Qual a contribuição que esse tipo de comentário traz, a não ser tirar a empolgação do outro? O que irá contribuir, uma vez que a compra já foi feita? Para que jogar um “balde de água fria” em quem só quis compartilhar sua conquista? A interferência é muito prejudicial para as relações. 

2- Indiferença: Ser indiferente não significa desprezar, e sim não se importar. Algumas pessoas, quando recebem o feedback de que estão interferindo demais, ao invés de considerarem essa fala se ofendem, emburram e dizem que a partir de agora serão indiferentes à vida do outro, como se houvesse apenas essas duas formas de se relacionar - ou interferindo ou largando o outro para lá.

Uma conduta infantilizada e uma forma de punir o outro. 
Outra forma de indiferença emocional pode ser encontrada na forma de criar os filhos. Explico melhor. Alguns pais, por falta de tempo ou por analfabetismo emocional, acabam não percebendo a necessidade emocional dos filhos e os deixam parcialmente desassistidos. Isso acaba deixando marcas na vida adulta. Isso porque percebemos o amor através de dois componentes fundamentais: um objetivo e o outro subjetivo. O primeiro tem a ver com a parte prática da vida: cuidados básicos, apoio financeiro, assistência, etc.

Já o segundo é percebido de forma subjetiva pelo acolhimento - me sinto acolhido quando o outro me compreende através da minha ótica e consegue me proporcionar sensação de aconchego. Para nos sentirmos amados é preciso a existência dos dois componentes. Apenas um não basta.

Na infância não temos a consciência disso, afinal, enquanto crianças, recebemos o que precisamos. Mas na vida adulta esse déficit se manifesta por meio da  baixa autoestima, fazendo com que o indivíduo tenha grande dificuldade de si priorizar, colocando o outro sempre à frente. Se sentem bem fazendo isso e pensam que são felizes assim. Até são, mas não pelo altruísmo da ajuda, e sim pela fragilidade da falta do amor próprio - dano causado pela indiferença emocional. 

3 - Colaboração: conseguir colaborar sem interferir  nem ser indiferente é uma competência que devemos buscar desenvolver. Ajudar sem criticar e nem impor o próprio ponto de vista é maduro, leve e agradável. Uma relação pautada na colaboração mútua é uma das coisas mais sublimes da vida. 

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