Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

Reflexões sobre situações rotineiras

Publicado em 29/06/2023 às 06:00.

É interessante observar como agimos frente a determinadas situações de forma automática e sem análise profunda, assim como repetimos palavras com peso emocional ou carregadas de preconceito, como, por exemplo, “solteirão ou solteirona”. A palavra no aumentativo exprime um sentido depreciativo interpretando que estar casado é o bom e tudo diferente disso tem um tom de fracasso. O que não é verdade. Disse Tom Jobim : “é impossível ser feliz sozinho”. Talvez na década de 60, quando a música foi composta, ficar solteiro não pegasse muito bem. Os tempos mudaram! O mundo evoluiu e atualmente existem inúmeras opções, inclusive luxuosas, de apartamento para uma pessoa morar sozinha. Nos supermercados há muitas opções de comidas para o consumo individual, assim como pacotes de viagem para quem vai só. Não há dúvidas de que a vida para os solteiros melhorou, ao mesmo tempo  que o casamento está em crise e durando cada vez menos, além disso, vale a pena lembrar que estar casado não é sinônimo de não se sentir sozinho. Portanto convém mudar “solteirão” para solteiro, apenas. 

Outra situação que vale reflexão é a dificuldade que temos de escutar alguém falar sobre si sem falarmos sobre nós. Quando uma pessoa nos conta algo sobre si, ao invés de nos atermos à escuta e nos interessarmos pela história dela, iniciamos um anseio para falarmos de nós. Nosso egocentrismo nos deixa egoístas autorreferenciais, fazendo com que percamos o ato de respeito e amor que é ouvir. Um bom exercício é estar atento a isso para, quando alguém vier desabafar sobre algo, você não levar para essa pessoa as suas histórias e as suas soluções, afinal, quem buscou acolhimento foi ela e é preciso considerar as condições dela e não as nossas. Isso é o verdadeiro significado de empatia. 

Falar sobre sentimento é difícil, declará-lo costuma ser mais difícil ainda e em função desse grande entrave muitos de nós usam o artifício da “brincadeira” para dar conta de falar algo que requer seriedade. Fazer piada, ironizar e rir de algo sério é uma forma infantilizada de conseguir se colocar frente a uma situação. Percebo muitos fazendo graça em discursos de aniversario, por exemplo, para conseguir declarar seu amor ao outro. Ou então fazendo piada sobre morte devido ao enorme medo de morrer. Se você usa esse mecanismo para tentar suavizar assuntos importantes, tente evitar esse artifício e encarar a verdade que o momento merece. Caminhamos rumo à maturidade quando enfrentamos nossas fragilidades.

Aprender a receber elogio também é outra importante questão. Aceitar um comentário enaltecedor a nosso respeito sem desmerecê-lo é grande conquista. Falando sobre elogio, se você tiver algum para fazer em relação a alguém, o faça com a própria pessoa e não com os outros. Há uma sutileza importante nessa questão: se eu elogio um filho para os outros, por exemplo, estou elogiando a mim mesmo. É como se eu dissesse “olha como eu o eduquei bem”. Da mesma forma um amigo ou cônjuge. Teça os elogios para a própria pessoa e diga a ela tudo de bom que você pensa sobre ela. Dessa forma, se faz desnecessário falar com os outros, pois sempre há um subtexto sutil de autoelogio. 

E, por fim, se quiser ajudar alguém, tente evitar verbalizar a palavra “calma” ou “relaxa”; o estado emocional de quem está sofrendo não aceita comando de voz. Diga apenas: “você não está sozinho, vou te ajudar de agora em diante”. 

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