Tio FlávioPalestrante, professor e criador do movimento voluntário Tio Flávio Cultural.

Bem-sucedidos!

03/02/2023 às 09:46.
Atualizado em 03/02/2023 às 09:47

Nos últimos dias circulou a foto do capítulo de um livro do consultor de negócios americano Bob Fifer, que traz na capa, em letras bem chamativas, que esta seria a obra de cabeceira do Marcel Telles, Fundador da Ambev.
Num capítulo específico, chamado de etapa 37, cujo título é “Contas a Pagar”, o autor aconselha que as pessoas que devem financeiramente, atrasem seus pagamentos, ignorem suas dívidas e os seus fornecedores.

No mesmo período em que as Lojas Americanas foram destaque em todo o mundo, uma vez que um rombo financeiro foi revelado, provocando um alvoroço no mercado. Por traz da empresa, assim como de tantas outras, nomes famosos da gestão, admirados por estudantes, que lotam auditórios para ouvir o que eles têm a ensinar sobre o seu sucesso nos negócios.

Você deve lembrar, já que não faz muito tempo, de uma jovem, nascida em 1988 que acabou tornando-se referência empreendedora de uma geração, sendo que milhares de pessoas compravam seus livros, assistiam às suas palestras, faziam seus cursos.

Ela, Bel Pesce, empreendedora e autora de livros, era conhecida como “A menina do Vale”, que estudou fora do país e trabalhou no Vale do Silício e que supostamente teria feito cursos invejáveis mundo afora, inclusive no MIT.
Só que, supostamente, ela teria mentido os cursos e as experiências profissionais e se vendia como “a tal”. Foi descoberta e deixou seus seguidores “a ver navios”. 
Pessoas assim são as que são apresentadas por um show midiático como as “bem-sucedidas”, que muita gente inveja e gostaria de ser um décimo do que elas são. Mas, vale uma pausa para uma pesquisa, superficial que seja.

Quando procurado nos dicionários de Língua Portuguesa, o termo “bem- sucedido” refere-se àquele que “tem ou teve bom sucesso” e, também, mais detidamente ligado às questões financeiras: “cuja situação financeira é próspera; rico; endinheirado”.

Numa época em que proliferam coachs e influencers, lotando as redes sociais de receitas de sucesso, criando “as dez chaves para conquistar”, “regras de ouro para prosperar”, “faça isso e você será feliz”, há quem além de seguir, acredite nisso. Como dizia o sociólogo Bauman, o problema de felicidade líquida é que ela precisa ser atestada pelo outro. Assim, o outro cria um cenário, em que a encenação entra em jogo e que quem está de fora, acompanhando, sedento por reconhecimento, sucesso, riqueza, fama, compra a ideia e se tortura, continuadamente, para ser aquilo que nunca será. 
São personagens criados para parecerem o modelo daquilo que a maioria nunca será. E o termo<EM>personagem sugere alguém, por trás de uma máscara, emitindo um som. 

Eu adoro o estilo do Walt Disney criar, mas eu nunca serei ele. Por mais que eu me esforce, ele eu não serei. Assim como muitos jovens nunca serão aquele indivíduo “X”, que se destaca no futebol, na música, nas redes sociais.
Este vazio e esta busca constantes por ser quem não somos é algo adoecedor, pois não seremos de fato aquilo que não somos. Daí vêm as ansiedades, as frustrações e uma nulidade de sentido na vida.

No mesmo período em que as Americanas anunciam o rombo bilionário, uma notícia invade a grande mídia: influenciadores financeiros, que têm milhões de seguidores, enfrentam crise de gestão e demitem vários funcionários. Empresas que dão aula de gestão, passando por redefinições internas que, segundo eles, são necessárias para a reorganização da equipe, que agora precisa de novas competências.

Ainda na seara dos influencers, Gustavo Tubarão acabou de anunciar que sofre de uma doença que provoca sua variação de humor, o transtorno de Borderline. O influencer falou em um vídeo que muita gente pode criticá-lo num futuro por ele estar se expondo de tal maneira. Pessoa pública que é, que depende dos seus seguidores, ele “precisa” parecer bem e esta sua fala explicita o que tantos outros influencers passam: a dependência do “like” alheio, que às vezes não permite que a pessoa adoeça, para que não padeça o personagem.

Figuras públicas de grande influência nos meios digitais, como Felipe Neto, Whindersson Nunes e “Esse menino” em alguma época anunciaram um afastamento das redes para se tratarem física, emocional e mentalmente. São humanos antes de serem famosos.

A atriz Kéfera foi outra que, chorando, anunciou uma pausa: “Sucesso, fama e inscritos é tudo muito legal, mas a vida é mais que isso. E uma vez que a vida é mais do que isso, eu preciso focar nela. Não se sintam abandonados e tentem entender a minha ausência. Ela tem um motivo e está precisando acontecer”.

Em meio a tudo isso, ainda há um discurso de que quem não busca aquilo que a maioria se espelha, como dinheiro e sucesso, é acomodado, não é ambicioso e nunca será bem-sucedido. A pergunta que eu quero deixar aqui é justamente esta: o que é ser bem-sucedido? Sei que vários fatores interferem nesta resposta, mas algo legal que consegui entender está descrito numa fala do Mark Twain: os dois dias mais importantes da sua vida são o dia em que você nasce e o dia em que você descobre o porquê.

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