Em um dia de atividades intensas, para tentar colocar tudo numa única saída semanal da minha casa, finalmente consegui cumprir a última agenda, que foi uma visita a um abrigo de adolescentes para conversar sobre o momento atual e a importância de ter calma, paciência, já que o mundo todo está sendo impactado, literalmente, por essa realidade inesperada.
Mas a troca de ideias com os meninos tinha como ponto central falar de vitimização e escolhas. Por mais que a gente discuta que para muita gente as escolhas são tão limitadas, o aprendizado e a maturidade vêm do que cada um de nós faz da dor e da alegria que chegam em nossas vidas, muitas vezes de surpresa, sem pedir licença para entrar.
O aniversário de 18 anos de um adolescente num abrigo não significa, simplesmente, a concretização do sonho de maioridade, mas é a necessidade de “cair na real” de que agora ele, que já não tem família, vivia numa casa de acolhimento, terá uma trilha em que será o centro da nova história, algo que já deveria ser evidente, mas que por questões diversas muita gente delega tal papel a outras pessoas ou coisas.
Ao terminar a conversa e sair do abrigo, peço um carro e entro no banco de trás. Os meninos estavam na porta da casa, do lado de dentro. O motorista pergunta se eu era o pai deles, dos três que estavam à vista. Expliquei do que se tratava ali e o que eu tinha ido fazer naquele dia. O meu trajeto era curto, mas o motorista ficou à vontade e me pediu para confidenciar uma história dele.
O filho, de 14 anos, é homossexual. Ele me disse que tinha percebido, mas nunca tiveram, ele e a própria esposa, a iniciativa de conversar sobre o assunto com o menino. Porém, o adolescente começou a não querer ir à aula, a se fechar mais e mudar o comportamento social. Depois de uma aproximação dos pais, ele contou que era gay e sentia-se humilhado pelos colegas, que o nomeavam de apelidos diversos.
Depois da conversa “libertadora”, o adolescente se impôs, mudando sua postura na escola, mas isso muito fortalecido pelos próprios pais, que deixaram bem claro o amor que os une.
Mas nem todo mundo tem família e nem todos que têm, conseguem dela compreensão. Aos jovens dos abrigos esse amor foi furtado, ou violentamente roubado, metaforicamente falando. Mas isso já aconteceu, é fato, triste, mas é. O aprendizado agora é como lidar com isso.
Como lidar com isso