Recuperandos da Apac de Manhuaçu assumiram os cuidados com os animais (Apac de Manhuaçu/ Divulgação)
A Apac, sigla para Associação de Proteção e Assistência aos Condenados, é uma entidade civil sem fins lucrativos que auxilia os poderes Judiciário e Executivo na execução penal. Seu método é um modelo alternativo de gestão prisional que visa humanizar as prisões e reduzir a reincidência criminal. Iniciado em São José dos Campos (SP), o método consolidou-se em Minas Gerais e, desde então, espalhou-se para outros estados e até mesmo outros países. Várias publicações especializadas indicam uma alta porcentagem de custodiados que passaram pela Apac e não voltaram a cometer crimes, aferindo que o método consegue atuar na redução da criminalidade e da reincidência criminal.
A Apac na cidade mineira de Manhuaçu é um exemplo concreto da aplicação dessa metodologia. Além de todo o trabalho de valorização humana que a unidade desenvolve, algumas iniciativas bem interessantes são promovidas, como uma panificadora própria que fornece alimentos para o hospital da cidade.
Denise Rodrigues, presidente da Apac, preocupada com isso, buscou a solução para o problema. Ela percebeu que a interação com os cães estava gerando um impacto positivo na convivência entre os custodiados, promovendo socialização, disciplina e uma maior sensação de responsabilidade. Foi então que teve a ideia de construir um canil dentro da unidade. Um monitor de segurança, apaixonado por animais, passou a apoiar e orientar os recuperandos nos cuidados iniciais.
Mobilizando funcionários, voluntários e os próprios recuperandos, o projeto do canil ganhou forma. Atualmente, o espaço abriga em média 14 cães, que recebem cuidados de quatro recuperandos dedicados à tarefa. Os custodiados são os responsáveis pela alimentação, banho, verificação do cartão de vacina, indicação de encaminhamento para veterinários ou para a aquisição de medicamentos e compra de ração.
“A criação do canil da Apac ajuda muito no desenvolvimento da afetividade. A gente vê a preocupação dos recuperandos, o carinho, o amor, o desenvolvimento de vínculos de afeto”, destaca Denise Rodrigues. Os cães chegam à unidade geralmente em condições precárias, com sinais de desnutrição, fraqueza ou vítimas de maus-tratos. Graças ao acolhimento inicial dos recuperandos, os animais recebem a atenção necessária para o seu restabelecimento. Nos casos que demandam cuidados veterinários especializados, os recuperandos identificam a necessidade e comunicam à unidade, que busca o auxílio externo.
Rumi, um dos poetas mais lidos do mundo, dizia: “Sua tarefa não é buscar o amor, mas apenas encontrar as barreiras que construiu contra ele e derrubá-las”. Essa reflexão parece traduzir a experiência dos recuperandos da Apac de Manhuaçu: ao cuidarem dos cães, aprendem a derrubar as barreiras emocionais que os afastavam de uma convivência mais solidária, gregária e humana.
Outro aspecto relevante é o destino dos cães abrigados. Muitos são adotados por familiares dos recuperandos, outros são levados pelos próprios custodiados ao progredirem para outros regimes ou prisão domiciliar. Além disso, a Apac divulga vídeos dos cães nas redes sociais, sensibilizando a comunidade para a adoção responsável.
Apesar dos esforços, muitos cães adultos e idosos acabam não sendo adotados e permanecem sob os cuidados da unidade. Desde a criação do canil, mais de 40 animais já foram acolhidos, e a dinâmica de batizar os cães de acordo com suas características é, também, um gesto de personalização e afeto.
A experiência da Apac de Manhuaçu demonstra como um ato de solidariedade pode transformar vidas — tanto as dos animais quanto as das pessoas que cuidam deles. Em um ambiente onde o cuidado é uma via de mão dupla, recuperandos e cães encontram a esperança de um recomeço das suas vidas.