Tio FlávioPalestrante, professor e criador do movimento voluntário Tio Flávio Cultural.

Que não nos falte solidariedade

Publicado em 15/11/2024 às 06:00.

“Quem sabe a gente consegue fazer uma campanha de doação de tênis usados, em bom estado, para entregarmos em instituições sociais, como casas de acolhimento, repúblicas para pessoas em situação de rua e lares de idosos?”, foi a pergunta que o atleta Thiago Vinhal me fez. E ainda completou: “Tenho muitos amigos e alunos atletas; acho que vamos conseguir bastante.” Eu aceitei, claro, sem imaginar que a mobilização dos atletas renderia quase duzentos pares, que foram distribuídos pelo próprio Vinhal, um mineiro que viaja o mundo treinando e competindo, já que é triatleta profissional. Entre os tênis arrecadados pelos amigos de Vinhal, alguns foram destinados ao time de futebol de um abrigo na região Norte de Belo Horizonte, onde homens em situação de rua formaram um time de futebol.

Dessa campanha, surgiu uma situação inusitada. Uma emissora de televisão fez a cobertura da entrega de parte dos tênis em um lar de idosos. Dias depois, um familiar de um dos residentes entrou em contato com a instituição, dizendo que havia reconhecido o tio que apareceu na reportagem. A partir dessa ação, o idoso se reaproximou da família.

Foi ao Vinhal também que recorri recentemente, quando uma assistente social me disse que alguns adolescentes vieram do Nordeste do país para treinar em uma agremiação em Minas Gerais, em busca do sonho no esporte, mas não tinham tênis adequados para os treinamentos. No mesmo dia, um dos alunos do Vinhal mandou entregar os tênis para os atletas.

Tudo isso é a solidariedade em movimento, um valor atemporal e um dos maiores motores de mudança social em nosso planeta. Em tempos de crescente individualismo, a capacidade de se conectar com o próximo e agir em favor do bem comum torna-se ainda mais essencial.

Mas, afinal, o que é a solidariedade? É um valor fundamental que nos conecta, nos inspira e nos transforma. Ao praticar a solidariedade, estamos não apenas ajudando os outros, mas também a nós mesmos. A palavra solidariedade tem origem no francês “solidarité”, que também pode remeter a uma responsabilidade recíproca. E quanto mais nos unimos para realizar algo em rede, mais pessoas saem ganhando.

O poder da solidariedade é inegável. Estudos científicos demonstram que praticar atos de bondade aumenta os níveis de felicidade e bem-estar, tanto de quem ajuda quanto de quem recebe. Além disso, a solidariedade fortalece os laços sociais, promove a coesão comunitária e contribui para a construção de um mundo mais justo e igualitário.

Exemplos de solidariedade não faltam. No início da pandemia de covid-19, quando diversas vulnerabilidades sociais foram expostas, muitos grupos se mobilizaram para atender a quem mais precisava. Em Belo Horizonte, o “Comida que Abraça” usou sua cozinha-escola para atender à população de rua, fornecendo alimentação nutritiva em diversas localidades da cidade. Desde então, a ação não parou mais. A OSC Naação cadastrou psicólogos voluntários para atendimento gratuito a pessoas com a saúde emocional fragilizada.

Já a campanha “Unindo Forças BH” nasceu da união de diversos movimentos, coletivos e organizações sociais. Num segundo momento da pandemia, quando empresas e pessoas haviam reduzido suas doações, a iniciativa mostrou seu valor. Pedir ajuda de forma isolada seria um trabalho exaustivo e pouco exitoso. Assim, cerca de 180 instituições trabalharam juntas e, ao final de 40 dias, um milhão de reais era a meta de arrecadação para ser convertido em cestas básicas para comunidades carentes. O que os organizadores não esperavam era que, ao final do prazo, dois milhões de reais fossem arrecadados, numa parceria que envolveu times de futebol, empresas, veículos de comunicação, pessoas físicas, entre outros.

A solidariedade é fundamental para enfrentar as desigualdades sociais e promover a inclusão. Projetos e movimentos sociais, OSCs e até empresas, via voluntariado corporativo, atuam diariamente para garantir direitos básicos, como educação, saúde e moradia, àqueles que mais precisam.

Mas como podemos fortalecer a solidariedade em nossa sociedade? É preciso cultivar a empatia, o respeito ao próximo e o senso de comunidade. É importante incentivar o voluntariado, apoiar causas sociais e promover a educação para a cidadania. 

Cada um de nós pode contribuir para um mundo mais solidário, começando por pequenas ações no dia a dia, inclusive anônimas, que promovem um impacto social imenso: um dono de escola de locução que recebe um homem em situação de rua e ministra aulas gratuitamente, para que ele aprenda uma profissão; um grupo de amigos que arrecada meias para doá-las a instituições que atendem idosos e pessoas em situação de rua. Este mesmo grupo de amigos doa, anonimamente, fraldas geriátricas a pessoas em tratamento de câncer, etc. Assim, as boas ações se proliferam.

Como disse o ativista Mahatma Gandhi: “A melhor maneira de encontrar a si mesmo é se perder a serviço dos outros”. A solidariedade é, portanto, um caminho para encontrar nosso lugar no mundo.

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